terça-feira, dezembro 05, 2006

Para quê quadro especial?

Ontem no Parlamento foi apresentada uma proposta de Lei que normaliza salários do quadro especial do PR, da A N e do Governo. O quadro especial diferencia-se do resto da Função Pública pela natureza eminentemente de confiança política dos cargos. O processo de contratação devia ter em conta as exigências específicas dos mesmos. A remuneração devia espelhar a precariedade intrínseca da actividade política conexa que automaticamente cessa com o fim do mandato do titular ou com a sua demissão. Por outro lado, a existência de um quadro de pessoal de livre escolha pelos políticos pressupõe que se queira o resto da Administração Pública livre de interferência política. A Constituição no art. 236º e seguintes obriga o pessoal da Administração Pública ao cumprimento de deveres, designadamente de justiça, isenção, imparcialidade e de não discriminação em virtude de opções partidárias. Diz, ainda, que os funcionários estão subordinados à Constituição e às Leis, que devem colocar-se ao serviço do interesse geral e que não podem ser instrumentos de actividade partidária do Governo. A realidade que se vive no País foge ao quadro de lisura, transparência, isenção e imparcialidade intentado pela Constituição. O quadro especial é, em geral, de competência duvidosa porque as nomeações regem-se por critérios de conveniência pessoal e política. É pouco efectivo porque não há um sistema compreensivo de desenvolvimento, execução e monitorização de políticas a trabalhar em articulação com estruturas do Estado. A Administração Pública, entretanto, é penetrada, a todos os níveis, por nomeações políticas. Com isso, desestruturam-se carreiras, perde-se a memória nas mudanças sucessivas, dificilmente se consegue manter um sistema de aprendizagem cumulativa, não se impõe o mérito como critério central de avaliação e não se desenvolve uma cultura de servidores públicos voltados para consecução do interesse geral. Há ainda um outro lado: interesses corporativos cristalizam-se e a capacidade de execução do governo diminui com a criação de pequenos feudos. O Governo do PAICV agravou a partidarização de uma Função Pública que, desde de 1975, sempre se viu como instrumento de quem está no Poder. Isso tem consequências: Investidores e outros operadores vêm notando a relutância em dar seguimento a decisões de ministros e em cumprir acordos com o Estado. O País perde em toda a linha: O Governo não tem pessoal e estrutura para implementar com competência as suas políticas, não obstante os elevados custos de funcionamento; os cidadãos perdem por não terem uma administração que sirva indistintamente os utentes e que seja um factor importante do desenvolvimento; os jovens quadros nadam num mar de frustrações, sem perspectivas de carreira e de uma participação gratificante ao nível pessoal e profissional.

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