sexta-feira, outubro 09, 2015

Nós e a “estagnação secular”

O FMI na sua reunião anual em Lima, Peru, na semana passada fez a revisão em baixa da previsão do crescimento da economia mundial para 2015 e 2016. Vários factores contribuem para isso, entre os quais a quebra no crescimento dos países emergentes em particular a China e o Brasil mas também a Rússia. Lawrence Summers um respeitado economista americano escrevendo no jornal Financial Times alertou mais uma vez pelo que ele chama de estagnação secular que poderá caracterizar a economia global nos próximos anos. Uma situação que, como ele diz, não é muito diferente do que há cerca de 25 anos acontece no Japão e que é caracterizada por crescimento baixo num ambiente de baixa inflação e taxa de juros próximo do 0%. A fraca dinâmica dos BRICS nos últimos tempos piorou a situação e aumentou as probabilidades do toda a economia mundial ser forçada a uma travagem brusca com impacto directo na luta pelo emprego e contra a pobreza.
Essa possível evolução da economia não é uma boa notícia para Cabo Verde. Não torna os parceiros mais generosos na dispensa da ajuda internacional, seja por que vias for. Afecta negativamente a procura para bens e serviços cabo-verdianos e tende a diminuir o fluxo de capitais que eventualmente o país poderia atrair. Se juntarmos a isso o nível de competitividade do país que teima em não progredir (passou no último ano do 114º lugar em 144 países para 112º em 140 em 2015 mantendo o mesmo GCI de 3.7) é evidente que há motivo para preocupação.
Cabo Verde precisa crescer mais para diminuir o desemprego e a pobreza. As reformas feitas e os custosos investimentos já realizados não conseguiram fazer a economia crescer em média nos últimos três anos acima de 0,9%. O Governo responsabiliza a crise internacional. Já o BCV considera que faltam condições endógenas mesmo para aproveitar completamente uma dinâmica económica mais vigorosa da União Europeia, o maior parceiro de Cabo Verde. Mantendo-se a situação de crescimento sistematicamente abaixo das previsões que têm sido feitas pelo governo mais difícil se torna sustentar a já pesada divida pública.
Um sinal de que algo não poderá estar a correr bem é o facto de ainda o conselho de administração do FMI não ter aprovado o relatório da consulta feita em Março no âmbito do artigo quadro. Previsto para o mês de Maio, até hoje não se realizou. Cabo Verde é dos pouco países que exige que o FMI peça explicitamente autorização para publicar dados sobre o país. Segundo dados do FMI houve uma situação em que só passados 120 dias é que as autoridades cabo-verdianas autorizaram. Essa falta de transparência não inspira confiança.
Actualmente nota-se que mesmo aqui no país a publicação de dados já não segue um calendário certo. O BCV publicou o relatório de política monetária só em Junho, muito mais tarde do que era habitual. O mesmo já tinha acontecido em Novembro. Outros relatórios designadamente os dos indicadores económicos que regularmente apareciam, tardam em ser publicados. Fica-se com a impressão de que há alguma relutância na publicação de informações sobre o país e isso só traz desconforto para quem investe ou desenvolve actividade económica em Cabo Verde porque tem dificuldades em avaliar os riscos existentes.
É pena que o esforço que o governo despende para manter o ilusionismo congratulando-se com a diferença de dois lugares no relatório da competitividade, quando o Global Competitiveness Index (GCI) é o mesmo, 3.7 para 2014 e para 2015, não é o mesmo que põe em medidas com impacto marcante em tornar realmente competitiva a economia cabo-verdiana. Por exemplo, os quatro primeiros factores problemáticos para o ambiente de negócios são, de acordo com o último relatório, o acesso ao financiamento, a carga fiscal, a ineficiência da burocracia do Estado e a complexidade da legislação fiscal. Em 2014 o factor complexidade das leis fiscais estava no sétimo lugar. Passou agora para o quarto lugar das dificuldades. Quer dizer que três dos principais obstáculos em melhorar o ambiente de negócios resultam da acção directa do governo e da sua administração. É claro também que quem desta forma age não mostra vontade suficiente para resolver a situação. Não se compreende é que mesmo assim se regozije com ganhos ilusórios.

A realidade da situação económica mundial não é a melhor. Cumulativamente até 2020, segundo Larry Summmers, está-se a prever em baixa o crescimento dos Estados Unidos  de 6%, de 3% para Europa, 14% para a China e 10% para os países emergentes. Ou seja, bons tempos não vêm ai. Seria bom que o governo despertasse para os reais problemas do país e se disponibilizasse para tomar as medidas adequadas em vez de ficar só pela retórica de campanha pré-eleitoral. 

Editorial do jornal Expresso das Ilhas de Outubro de 2015

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