quinta-feira, setembro 16, 2010

Década perdida para a competitividade


A competitividade de Cabo Verde foi pela primeira vez avaliada pelo World Eco­nomic Fórum. Ficou em 117º lugar num total de 139 países. No continente africano ficou atrás de 16 países: Tunísia, África do Sul , Maurícias, Namíbia, Botswana, Ru­anda, Argélia, Gâmbia, Líbia, Benim, Senegal, Quénia, Camarões, Tanzânia, Gana e Zâmbia. Claramente está-se perante um fiasco de todo o tamanho. Fiasco tornado maior pelo facto do Governo do PAICV, há sete anos atrás, ter criado um minis­tério para o crescimento e a competitividade. No domínio económico não atingiu as metas prometidas porque o crescimento situou-se sempre abaixo do potencial do país, tirando o ano de excepção que foi 2006 com os exercícios da NATO e os anos, 2007 e parte de 2008, de grande entrada de capitais estrangeiros, no pico do “boom” mundial. Confirma-se agora que a outra promessa de maior competitividade externa também não foi cumprida. O estudo governamental “Análise dos Constran­gimentos” já tinha revelado os escolhos, designadamente nos domínios financeiro, de educação e formação e de transportes e comunicações, onde a agenda de transformação do governo deixara-se encalhar. O relatório do Fórum Económico Mundial vem reforçar as conclusões desse estudo com a má avaliação de Cabo Verde nos factores que mais contribuem para a competitividade no seu grupo de países. Mesmo no que respeita à estabilidade macroeconómica Cabo Verde não está bem classificada. Inflação é o único factor que dá alguma vantagem comparativa, mas aí sabe-se que as razões não são primariamente da governação mas decorrem essencialmente da disciplina imposta pelo Acordo Cambial com Portugal e a União Europeia. O relatório define a competitividade como o conjunto de instituições, políticas e factores que determinam o nível de produtividade de um país. Como se pode ver pelo gráfico só em meados de 1994 é que Cabo Verde conseguiu crescer acima da média dos países africanos. São os anos em que com a Constituição de 1992 e a passagem da economia estatizada para uma economia de base privada, novas instituições elevaram o potencial de crescimento do país para um patamar mais elevado. Depois de 2000, para se manter o nível de crescimento era necessário o uso de factores indutores de eficiência na economia: uma maior aposta na qualidade do ensino particularmente no secundário; o aumento da eficiência dos mercados com a diminuição do informal e aumento da concorrência; suficiente vontade política para firmar um pacto que viabilizasse a flexibilidade do mercado de trabalho; supressão de constrangimentos ao desenvolvimento do mercado financeiro e uma atitude proactiva de procura de mercados passando pela unificação do mercado interno e pelo promoção de exportações. Mas aí é o fracasso que o relatório põe a nu. Conclusão: uma década perdida. As consequências vêem-se no nível fraco de investimentos privados internos e externos e na incapacidade de criar um número de postos de trabalho que diminua significativamente o desemprego.

quarta-feira, setembro 15, 2010

Carpir o Tribunal Constitucional

O presidente da Assembleia Na­cional numa conferência do PTS, em S.Vicente, lamentou que, dez anos após a criação do Tribunal Constitucional em 1999, esse tribunal ainda não esteja instalado. E, por essa razão, os direitos de oposição estejam ainda limitados no que concerne a formulação de pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade. Esqueceu-se o presidente da A N de se referir que os direitos das minorias são, de facto, mais prejudicados quando o parlamento se deixa levar indevidamente pelos interesses da maioria. Em Novembro de 2008, já com o processo de revisão constitucional aberto e com o manda­to dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça a poucos meses do seu térmi­no, o Governo iniciou uma manobra para manter o sistema de nomeação de juízes por órgãos de poder político e impedir mais uma vez a instalação do Tribunal Constitucional. A ini­ciativa do Governo passou apesar do aparente absurdo de se alterar a orga­nização e a composição de um órgão de soberania, o Supremo Tribunal de Justiça, por uma resolução aprovada por maioria simples. O Governo pos­teriormente conseguiu convencer os partidos da oposição que o Tribunal Constitucional seria instalado ainda no ano de 2009 e que o mandato dos novos juízes seria de meses. Como era facilmente previsível, e alguns o disseram, todas as promessas não passavam de um embuste. O Tribunal Constitucional não foi instalado e disposições transitórias, aprovadas na revisão da constituição, asseguram o cumprimento completo do mandato dos juízes nomeados para o supremo tribunal de justiça. A manobra feita em 2008/2009 foi uma repetição mais trabalhada do que já acontecera em 2003. Nesse ano, o MpD, em antecipação do fim de mandato dos juízes do STJ e em cumprimento da Constituição, apresentou um projecto de lei de instalação do tribunal constitucional. A lei foi simplesmente rejeitada pelo PAICV. Com a aproximação do fim do mandato dos juízes, o Presidente da República, num gesto inédito, avança em primeiro lugar e nomeia um juiz e o presidente do STJ sem esperar que o novo colégio de juízes tivesse sido nomeado. Um nível similar de colaboração do PR também serviu em 2009 para se ter o actual figurino de adiamento da instalação do Tri­bunal Constitucional. Por isso tudo, só podem ser lágrimas de crocodilo as que são derramadas pelo Tribunal Constitucional.

terça-feira, setembro 14, 2010

Abusos minam autoridade e eficácia

A prisão do oficial superior da Forças Armadas no Aeroporto da Praia, em 27 de Agosto, pôs uma outra luz sobre denúncias de brutalidade policial provenientes de vários pontos do País. A perspectiva de conflito agravado obrigou o Director da Polícia Nacional a prometer “inquérito e decisões”.
Espera-se que assim seja. Outras denúncias não têm recebido resposta das autoridades. A Polícia normalmente defende-se com contra acusações de desacato à autoridade ou resistência à prisão e remete para os tribunais. A instituição recolhe-se sobre si própria e não dá sinais ao público de que está a inquirir internamente, a rever os procedimentos, ou a agir disciplinarmente para prevenir eventuais situações de abuso. Mesmo em situações críticas, como a do cerco ao Palácio de Justiça, na Praia, ou a tentativa de rebelião contra o Juiz de Santa Catarina, em 2009, não há notícia de resultados de inquérito e de punição disciplinar ou criminal de presumíveis autores.
Já dizia o Lord Acton que “o Poder corrompe, e o Poder absoluto corrompe absolutamente”. Uma verdade que ninguém ignora. Na democracia, Poder é atribuído à Polícia para assegurar a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, mas não a qualquer custo. Deve estar na primeira linha na defesa dos direitos dos cidadãos. Não pode punir porque, quem julga e pune, são os tribunais. O uso da força deve ser feito quando necessário e com sentido de proporcionalidade. Espancar e torturar pessoas para extrair confissões e como retribuição por reacções dos cidadãos, ao serem interpelados, são práticas explicitamente proibidas.
O Governo dirige a Polícia. Responsabiliza-se por ela. Tem obrigação de a dotar de uma inspecção interna efectiva. Mas não pode ficar por aí. Há que criar instâncias de controlo externo capazes de proceder a inquéritos, exigir responsabilidades e agir de forma decidida para erradicar más práticas e seus agentes.
O Governo tem beneficiado de amplo consenso parlamentar na alocação de meios à Polícia. O orçamento mais do que duplicou nos últimos dez anos. Hoje exige-se o 12º ano aos candidatos a agentes. Com tais recursos, os cidadãos esperam ter a patrulhar as ruas um polícia educado, bem formado, efectivo na sua actuação e ciente de que é um servidor público e não um “justiceiro” solto nas ruas para punir transviados e criminosos.
Confiança é fundamental para eficácia da acção policial na comunidade. A Polícia só pode construir essa confiança se der garantias de que é capaz de investigar e punir os abusos de autoridade de que é acusada. É dever do Governo certificar-se que a Polícia vai actuar sempre dentro do quadro legal e constitucional, para o conforto, Segurança e Liberdade de todos.

Editorial "Expresso das Ilhas" 8/Setembro/2010

Pequenas coisas

No programa da TCV “Conversa em Dia” com Rosana Almeida, de duas semanas atrás o Sr Patone chamou a atenção para a urgência de se atender aos pequenos problemas que os operadores turísticos e o s turistas dizem existir com o destino Cabo Verde: iluminação pública, estrada de acesso aos hotéis, barulho nas ruas, assédios nas praias etc. Problemas que o governo foi exímio em adiar com as consequências que todos conhecem. Sinais de crise na ilha do Sal surgiram em 2007mas o Governo continuou a desconversar, escudando-se em grandes projectos, planos estratégicos, revisão de legislação etc. Resultado, os problemas pequenos e vitais ainda estão por resolver. A persistência de muitos eles bloqueia a possibilidade da economia nacional beneficiar, em vendas e emprego, do fluxo turístico no país. Na entrevista do Director Geral do Turismo ao Jornal Asemana de 3 de Setembro faz-se referência a vários pequenos problemas que diminuem o impacto do turismo na economia das ilhas. Na Boavista, por exemplo, como não se regulamenta e se disciplina o transporte de turistas nas excursões, operadores nacionais perdem para os estrangeiros. A mesma coisa acontece com a actividade de observação das tartarugas. A oferta de bens e serviços nacionais tem que ser regulada e certificada. Nalgumas actividades há que definir condições de entrada de operadores. Só assim se poderá garantir qualidade, fiabilidade e a sustentabilidade da oferta dos produtos. Deixar o informal dominar é condenar a oferta nacional a ter ganhos marginais com o tráfico de turistas e mesmo a prejudica-lo com a falta de qualidade. È aqui que fazer as pequenas coisas do Sr. Patone, que melhoram a qualidade do ambiente económico e social circundante, mostra-se fundamental. Não são talvez as coisas “glamourosas” que os governantes gostariam de fazer. Mas são necessárias para o que, afinal, se prestaram realizar, quando aceitaram os cargos: criar condições para o aumento da riqueza nacional, do emprego e da qualidade de vida de todos os caboverdianos.

domingo, setembro 12, 2010

Revista COMUNICAR. Onde está a ética?

“A ética republicana exige que o funcionário sirva a República e proíbe-o de se servir da República para promover os seus fins pessoais ou os de um determinado grupo”. A frase enuncia muito bem o qual deve ser a conduta dos funcionários cumpridores de vários comandos da Constituição caboverdeana, nomeadamente dos artigos 240º, 242º, 242º que regem a relação Governo/Administração pública/ interesse público. A revista Comunicar, publicada pelo Gabinete de Comunicação e Imagem, é um exemplo claríssimo de como o Governo não se sente obrigada pela ética subjacente a esses preceitos constitucionais. A revista já vai no sei 17º número e é essencialmente um instrumento de propaganda junto de quem, talvez, o partido, que suporta o governo, considera eleitorado cativo: os funcionários públicos. Imagine-se como o ambiente criado afecta a relação com os utentes. Funcionários mais zelosos de agradar superiores hierárquicos, que tão abertamente procuram indoutriná-los, não deixarão de olhar para a cor partidária de quem os está a requerer serviço. No último número da revista Comunicar, o Sr. Primeiro-Ministro diz que o Governo rege-se por uma ética que teria vindo de Amílcar Cabral e que se distingue pela decência, honestidade e patriotismo. Uma ética que, pelos vistos, a entrevista não sufraga. Os meios que usa para se divulgar, os princípios constitucionais que se recusa a reconhecer e os interesses que defende em detrimento das instituições do Estado de Direito democrático não a colocam nesse patamar ético. O que de facto a caracteriza, é normalmente conhecido por amoralismo revolucionário. Um conceito bem definido na cerimónia de fundação do PAICV, no dia 20 de Janeiro de 1981: “. Só existe uma só, uma única moral, a revolucionária. A moral dos que deram tudo para que este país fosse independente e para que este seja o que é neste momento. Aquele que pretender através da demagogia, através da vã tentativa de dividir o nosso povo, através das suas pretensões, perturbar a nossa marcha, será, tarde ou cedo, esmagado. ( revista “Unidade e Luta” nº 4, II série).

sábado, setembro 11, 2010

O Cabo Verde a "branco e preto" do PAICV

O presidente do PAICV, José Maria Neves, no lançamento, em S.Vicente, da plataforma eucontribuo.cv para doações, mais uma vez caracterizou o seu partido como positivo e classificou de negativo a minoria. Não é um discurso inocente. Deliberadamente, recorria à dicotomia que historicamente o seu partido sempre se serviu para excluir os outros, não aceitar opiniões e interesses diversos e estigmatizar os que não se revêem nele. Positivos versus negativos é a nova versão da célebre diferença entre “povo” e “população”. Dizia-se que “povo é todo aquele que está com o partido. A população é o resto”. E na população encontram-se os “assimilados, os colaboracionistas e os agentes do colonialismo e do imperialismo”. Conforme os tempos essa perspectiva dicotómica, antagonística e de exclusão tomou outras roupagens: de “povo versus população”, passou para “patriotas versus anti-patriotas” e, depois, de “amantes da terra versus vendedores da terra”. Renova-se agora em fim de mandato para instilar nos militantes o zelo, a determinação e o “não olhar a meios” no combate eleitoral que se avizinha. Também para avisar aos que queiram ficar em cima do muro que, no mundo a branco e preto, “ou se está connosco ou se é contra nós”. Serve, ainda, para dar um novo ímpeto à cultura política que combina o atiçar da crispação com apelos cínicos ao consenso. Uma cultura que se suporta no não reconhecimento que os caboverdianos podem ser uno e, ao mesmo tempo, terem opiniões diferentes e perseguirem interesses de acordo com a sua individualidade, motivação, saber e criatividade, sem questionarem o direito dos outros fazerem o mesmo.

sexta-feira, setembro 10, 2010

À Cata do emprego













O ministro do Ambiente, do Desenvolvimento Rural e dos Recursos Marinhos, José Maria Veiga na cerimónia de entrega de um bote a um pescador do bairro do Brasil, cidade da Praia apresentou mais uma vez a visão de desenvolvimento, acarinhada pelo Governo: Se a sociedade se organizar assim, em associações, é muito mais fácil reivindicar as suas necessidades e conseguir, desta forma, desenvolver projectos de criação de emprego e de desenvolvimento, como é este o caso”. Ao governante parece não interessar muito que essa solução não deu certo na parte que diz respeito à criação de empregos, como se vê pelas taxas de desemprego em Cabo Verde. De facto, só houve sucesso em aumentar a dependência das pessoas em relação ao Estado e em criar condições para infiltração das associações comunitárias por interesses partidários. O Governo prefere não ver que não há experiência conhecida de países que resolveram o problema de desemprego pela via do auto-emprego. Investimento e exportações têm sido, historicamente, os grandes geradores de emprego. São eles que propiciam avanços em tecnologia e processos, indispensáveis ao aumento da produtividade nacional, e novos mercados para bens e serviços.

quinta-feira, setembro 09, 2010

Nem para evitar desgraça?

O presidente da Câmara da Praia exigiu do Governo uma Declaração de Emergência para a capital do País. Segundo o autarca “4 mil famílias, nos diversos bairros da Praia, estão na eminência de assistirem ao desabamento das suas casas. A resposta do Governo veio rápida e confrontacional. Relembrou desavenças anteriores, culpou a câmara por insuficiências várias e deu conselhos despropositados. A bancada municipal do PAICV, mais uma vez ,esqueceu-se das razões para que foi eleita e saiu em defesa do Governo, como se alguém o estivesse a atacar. Os munícipes ficaram sem saber se o Governo concorda, ou não, que há uma situação de emergência. E no caso de concordar como tenciona agir para evitar perdas e conter potenciais estragos. As chuvas estão aí e não são precisos estudos para ver o risco que correm milhares de pessoas, em caso de inundações. O assunto é demasiado grave para ser transformado em mais um “round” do boxe institucional entre o Estado e o Poder Local, em mais uma disputa partidária na antevéspera de eleições ou em mais uma corrida de se saber “quem fez ou disse primeiro”. O Governo tem responsabilidade primeira para com o País e os caboverdianos. Qualquer comunidade no território nacional pode sofrer calamidades. Á partida, os municípios não têm nem os recursos nem os meios para tais situações de excepção. A solidariedade do País tem que ser mobilizada e o Governo é o instrumento para isso. Não pode furtar-se a isso, desculpando-se com contendas politico-eleitorais até porque a Câmara da Praia só vai a eleições em 2012. E solidariedade precisa-se. Estão em jogo vidas humanas, propriedade e meios de vidas das pessoas. Todos conhecem a realidade da Praia. Cresceu muito depressa, sofre de grandes problemas designadamente no plano urbanístico, de saneamento, de segurança, de água e de energia. Ninguém espera que problemas, acumulados durante as décadas de má gestão do espaço urbano desde da independência 1975, sejam atirados por cima das costas de qualquer equipa camarária. Particularmente quando se insiste com uma política de ultra-centralização do país que agrava os problemas da capital, a todos níveis. Só por aí se vê como o governo não pode esquivar-se à responsabilidade do que se passa na Praia, seja quando a cidade confronta o problema das chuvas, seja quando lida com o problema dos apagões, da dengue e da segurança. Nos investimentos que fez nem sempre acertou no que era prioritário e foi incapaz de aliviar a pressão migratória em direcção à cidade.

terça-feira, setembro 07, 2010

Ofensiva nas comunidades

O portal do Governo noticiou que os dois primeiros dias da visita do Primeiro-Ministro à Itália foram dedicados à comunidade caboverdiana aí radicada. Ninguém estranha. Em 2010, fazer política junto das comunidades emigradas parece ser o móbil principal das visitas de Estado, que o Primeiro-Ministro e outros membros do Governo têm feitos ao estrangeiro. Isso para além de claramente estarem à procura de “fotos de oportunidade” com destacadas figuras estrangeiras para ilustrar o material de propaganda do partido. Como já se viu na publicação luxuosa de 100 páginas que o Governo pôs na rua na sequência do Debate sobre o Estado da Nação. Entre Abril e Agosto, José Maria Neves já esteve no Luxemburgo, Bélgica, Holanda, França, Portugal, Espanha, Brasil, Estados Unidos, S.Tomé e Senegal. Na semana passada foi a Angola e agora está de visita à Itália. Ainda em Setembro, vai aos Estados Unidos e depois a Timor Leste e à Guiné-bissau. È de se perguntar que políticas urgentes do Estado têm o PM a discutir com as comunidades. O portal do Governo não diz quais. Do que transparece dos noticiários, não ficam dúvidas quanto ao assédio claramente eleitoralista a que são submetidas. Uma pressão que é, também, profundamente injusta, porque os emigrantes, com a pouca informação que a distância e os afazeres no país de acolhimento lhes permite, têm naturalmente mais dificuldade em lidar com a enxurrada de propaganda. Muitos acabam por ressentir-se pelo facto de verem a sua comunidade transformada em arena, onde se decidem eleições no país, e enfraquecida, no seu desejo de vencer no país de acolhimento, pela crispação política excessiva induzida nos seus membros. Até parece, às vezes, um preço demasiado caro pelo direito e o privilégio de representação no parlamento do País.

domingo, setembro 05, 2010

Estatuto dos candidato “em espera”?

Aristides Lima, presidente da Assembleia Nacional, em entrevista à jornalista à jornalista Adelina Brito no dia 23 de Agosto afirmou que "só se é candidato à presidência da república quando o presidente da república marcar as eleições". Certamente que essa não é a percepção que o público tem de quem é candidato. Aliás, ele aceitou o convite para ser entrevistado porque a olhos de todos, e há quase dois anos, é visto como um candidato, age como tal e intervém na vida política também nessa condição. Mas ao dizer isso o Dr Aristides Lima faz reviver a polémica, prenhe de consequências, que foi a suspensão do cargo de Primeiro-Ministro pelo Dr. Carlos Veiga, em fins de Julho de 2000. Carlos Veiga anunciou publicamente a sua candidatura ao cargo de Presidente da República. E, em cumprimento do n. 2 do art. 372º, hoje 383º do Código Eleitoral, que diz “nenhum candidato pode exercer cargo de titular de órgão de soberania a partir do anúncio público da sua candidatura”, ficou automaticamente suspenso das suas funções de Primeiro Ministro. Após muitas opiniões e tomadas de posições sobre a matéria, o então presidente da Assembleia Nacional, Eng. António Espírito Santo, pediu a fiscalização abstracta e sucessiva da constitucionalidade da norma. A resposta do Tribunal Constitucional veio a 4 de Dezembro. O acórdão confirmou a constitucionalidade da norma. Estabeleceu que não houve auto suspensão do Primeiro Ministro Carlos Veiga mas sim “uma imposição legal de suspensão do titular” .E acrescentou que a preocupação do legislador “foi separar a condição de titular de cargo público da de candidato, impedindo que certas funções públicas com visibilidade, protagonismo e capacidade de influenciação pudessem ser usadas em benefício do seu titular, colocando-o em situação de vantagem em relação aos demais candidatos”. O acórdão ainda reconheceu uma diferença entre o ns. 2 e 3 do referido artigo do Código Eleitoral. O n.2 dita a suspensão a partir do anúncio público para os titulares de órgão de soberania enquanto o n. 3, só obriga à suspensão após a apresentação formal da candidatura de titulares de certos cargos públicos. Ser-se candidato meses a fio e usar das vantagens que o exercício do cargo de soberania oferece e, a dois meses das eleições, suspender as funções para dar aparência de transparência, imparcialidade e isenção, não parece que seja o que legislador tinha em mente com essas normas. O que é aparentemente estranho é o facto do PAICV, ainda hoje, insistir em fustigar o Dr Carlos Veiga por causa da posição tomada em 2000. Passa por cima da decisão do Tribunal Constitucional sobre a matéria e acaba por acusar o ex-candidato de ter cumprido a Lei e não ter abusado do cargo de Primeiro- Ministro para fazer campanha para a presidência da república.

O acórdão do Tribunal Constitucional n. 11/2000 de 4 de Dezembro: http://nosiomt.gov.cv/stj/stj_web_pesquisa.detalhes?p_id=6263

Desemprego a 0%


Em S.Antão, foi-se além da recuperação da paranóia para justificar a dificuldade em encontrar soluções para o país. Aboliram-se os problemas. Aboliu-se o desemprego. O Secretário-Geral do PAICV, em declarações à imprensa, disse que se não há pressão pedindo emprego é porque não há desemprego. Pelo menos numa ilha, a promessa da legislatura de baixar o desemprego a um dígito fez jackpot. O desemprego foi levado a zero. Com este novo dado a alterar os cálculos nacionais de desemprego talvez se chegue á conclusão que o desemprego no País está agora abaixo dos 10%. De 21% passou para 13% com a mudança de metodologia e agora a com o milagre económico de S.Antão finalmente deve ter lá chegado.

sexta-feira, setembro 03, 2010

“Flirts” complicados


A repentina relação de proximidade de Cabo Verde com a Guiné Equatorial tem deixado muita gente perplexa. Desse país, a par com relatos de bonança derivada das vendas petróleo chegam notícias de violação de direitos humanos que causam repúdio internacional. Na semana passada foi a execução de quatro pessoas a poucas horas de terem sido condenadas á morte geral. Por essas e outras razões a decisão sobre o seu pedido de integração na Comunidade dos Países da Língua portuguesa (CPLP) foi adiada. Nessa matéria, Cabo Verde, pela voz do Presidente da República, tinha deixado transparecer posição favorável ao pedido, durante a visita oficial do presidente Nguema Mbasogo. O interesse especial por países como Guiné Equatorial, donos de fundos multimilionários acumulados durante a alta de preços de petróleo, cresceu com a crise financeira internacional e o “credit crunch” que se lhe seguiu. A maioria desses países tem regimes autoritários e uns quantos são quase párias no campo internacional, o que torna o relacionamento com eles algo complicado. Países desenvolvidos ou emergentes como a China e o Brasil concentram as relações na exploração de recursos minerais e do petróleo. Outros países cortejam-nos na expectativa de receber ajudas especiais a troco de furar o isolamento imposto pela comunidade internacional. A pergunta que se coloca é qual é a motivação de Cabo Verde em procurar aprofundar relações com regimes com o da Guiné Equatorial, a Líbia de Kadaffi e a Venezuela de Chavez? Simplesmente alargar laços comerciais e atrair novos capitais? Mas, sabendo que a movimentação dos capitais a partir desses países tem, quase sempre, motivações políticas subjacentes, a questão que fica é como isso pode afectar a vida política nacional? Será mais um impulso ao controlo do Estado sobre a economia e a sociedade? E mais margem a atitudes autoritárias e a derivas iliberais, que já se fazem sentir no sistema político caboverdiano? A condução da política externa não é neutra. Deve merecer o escrutínio de todos, principalmente quando se insiste em manter o país dependente da generosidade dos outros. Depender de democracias responsáveis resulta normalmente numa pressão positiva em direcção á liberdade e á manutenção do regime constitucional presente. Depender de regimes autoritários pode tentar os governantes a enveredarem-se por práticas em sentido contrário. Que o digam os cidadãos de países como o Zimbabwe e o Sudão. Esses regimes aproveitam-se da ajuda chinesa para contornar a pressão da comunidade internacional no tocante aos direitos humanos, ao tratamento dado às minorias, á democracia e a uma gestão responsável da economia.

quinta-feira, setembro 02, 2010

Paranóia está de volta

Finalmente “sabe-se” o que está acontecer à ELECTRA. Sabotagem. Claro que noutros momentos “soube-se” o que era. Primeiro, a privatização. Depois, os portugueses da EDP. Mais tarde a má gestão. Os roubos de energia. E finalmente descobre-se que podem ser trabalhadores ou desconhecidos infiltrados que há muito vêm sabotando os geradores. È o regresso da paranóia na política nacional. Durante todo o regime de partido único reinou a paranóia. Desde os submarinos, que eram avistados ao largo de Cabo Verde nos primórdios da independência, até às acusações de que grupos de caboverdianos estariam a ser preparados para, com a ajuda de países estrangeiros, invadir o País. Paranóia não é matéria de somenos importância. Deu prisão, tortura e humilhação de muitos caboverdianos. Nos fins de Maio de 1977, várias personalidades de S.Vicente e de S.Antão foram encarceradas durante quase seis meses nos quartéis militares de S.Vicente. Tinham sido acusadas de lançar panfletos e de estarem a preparar sabotagem da central eléctrica, do dessalinizador, dos tanques de combustível da Shell, de estradas e pontes em S.Antão. Ressuscita-se agora a paranóia como a arma de último recurso para salvar a face do Governo. Porque na Electra vêem-se, de forma condensada, os efeitos de políticas inconsequentes, de interferências politiqueiras e das constantes fugas de responsabilidade que caracterizam a acção do Governo em muitos outros domínios. As pessoas já não fazem as manifestações de anos atrás quando a culpa era atirada para cima da EDP e da privatização. Mas continuam descontentes e, mesmo com algum cuidado, vão acusando o Governo de incompetência na gestão do sector crucial para o desenvolvimento do país. Perante este quadro cada mais duro, e quase nas vésperas das eleições, já se encontrou o bode expiatório ideal: sabotagem. Até traz o bónus de se poder já acusar os adversários políticos de, pelo menos, ficar satisfeita com os seus resultados. E isso para não ser mais explícito e acusá-los de a ter organizado.

quarta-feira, setembro 01, 2010

31 de Agosto. "The day after"

Para os que ainda teimam, contra todas as evidências, não compreender o que se passou no 31 de Agosto, leiam o que o único jornal da época disse sobre o que foram os dias e meses seguintes:

O jornal oficial “Voz di Povo”, de 28 de Dezembro de 1981, dá conta da “contra ofensiva política-ideológica” levada a cabo em todos os pontos de S.Antão. Diz que num curto espaço de tempo foram realizadas cento e cinquenta reuniões com mais de 6 mil participantes e que os “desordeiros” foram julgados em tribunais populares com assistência massiva das populações afectadas pelas desordens. Mais adiante no artigo chama a atenção para o facto o “julgamento em tribunal popular dos cúmplices... teve um papel impulsionador na popularização das teses da reforma agrária e, sobretudo, na desintoxicação das massas”. De acordo om o mesmo artigo, confirmou-se que os espectros demagógicos do anti-comunismo, de tão estafados, já não.. infundem qualquer espécie de receio... ao povo trabalhador de Cabo Verde...”.