Ontem, a meio da campanha eleitoral para as autárquicas, o MpD, o eleitorado e a sociedade caboverdina foram apanhados de surpresa pelas declarações do presidente do MpD, Jorge Santos e do ex-líder do PCD, Eurico Monteiro. Segundo o Expresso das Ilhas online de 7 de Maio, Jorge Santos regozijou-se pelo regresso ao MpD dos que ele chama de ex-dirigentes do PCD. O ex-líder, por sua vez, justificou-se e justificou os outros 28 subscritores, explicitando os pontos de conveniência política do momento que determinaram a aceitação do convite do presidente do MPD. Os militantes do MpD viram-se, de repente, forçados a olhar para dentro do partido quando, no momento, todos se sentem ligados numa unidade funcional voltada para fora, dirigida para a sociedade. E todos se revêem numa união de esforços que visa influenciar, motivar e consolidar o eleitorado necessário para vencer as autárquicas. Por sua vez, o eleitorado e a sociedade caboverdiana quedaram-se face a um desenvolvimento partidário súbito, com um potencial de consequências a curto e a médio prazo. O frenesim e a ansiedade nos comentários online que se seguiram aos anúncios e às conferências de imprensa são indicadores do desassossego que o acto político do presidente do MpD e dos ex-dirigentes do PCD desencadeou. A informação dada pelo mesmo jornal online que a declaração foi assinada a 21 de Abril e que só a meio de campanha, a 7 de Maio, foi trazido a público deixou a forte impressão de se tratar de uma manobra política à procura de uma oportunidade para se revelar. Uma impressão ainda vincada por outros aspectos associados a esse facto político. Um deles é o facto do presidente do MpD, num acto que ultrapassa as suas competências estatutárias, ter dirigido pessoalmente um convite de entrada no partido a um grupo que ele mesmo identifica como ex-dirigentes de um outro partido, conhecido por ter uma história pública de mais dez anos de hostilidade ao MpD. Um outro aspecto é todo esse acto público de entrada colectiva constituir uma fuga às normas, aos processos e procedimentos estatutários de ingresso no partido, designadamente as do artigo 13º dos estatutos, e ser, em particular, uma violação da alínea m do artigo 10º, que proíbe facções ou grupos organizados. Ainda um outro é a questão da Declaração de entrada, assinada pelos 29 subscritores, poder sugerir, a meio de campanha, a criação de uma frente unida, talvez uma coligação informal do MpD com ALGO que tem líder (porta-voz) e membros/subcritores, sem porém se se assumir como entidade distinta, mas que, entretanto, já negociou os seus elementos nas listas autárquicas. Para qualquer observador isso parece mais um processo de take-over do partido. Uma tomada hostil porque em nenhum ponto na declaração os ex-PCD renegam a ideologia hostil e contrária ao MpD que professaram no passado e justificaram as coligações feitas com forças políticas adversárias ao governo do MpD. Pelo contrário, numa analogia sugestiva em que dizem que o PAICV de hoje não é o mesmo do de Aristides Pereira fica subentendido que também o MpD de hoje não é o de Carlos Veiga, o MpD com quem entraram em dissidência violenta. Ou seja, quem mudou foi o MpD. Não foram eles. Por isso, entram hoje. A reunião ontem da Comissão Política do MpD para essencialmente se congratular com a vontade expressa do grupo dos 29 mostra o conluio ao mais alto nível e a despreocupação irresponsável com os óbvios problemas políticos e estatutários que tal operação coloca. A surpresa e a desinquietação de militantes, eleitorado e sociedade foram exacerbados pelo momento escolhido para a declaração. Todos estão em plena campanha eleitoral. Para os ex-dirigentes do PCD o timing é perfeito. Justifica-se pelo facto do grupo querer legitimar a sua entrada, associando-se à uma eventual vitória nas eleições autárquicas, vitória que nos seus cálculos já antecipam. Para o MpD e para a sua campanha eleitoral, porém, a declaração do grupo dos 29 só traz riscos: risco de distracção, risco de perda de uma imagem de coerência e solidez ideológica e risco de quebra de confiança na sua integridade futura. Eventuais benefícios só existiriam se o grupo dos 29 tivesse eleitorado próprio e pudesse adiciona-lo ao eleitorado do MpD, algo que na política ninguém pode garantir. Mais, a verificar-se, só teria efeito nos municípios onde o grupo tivesse presença significativa, ou seja, na cidade da Praia. Em tudo isto o que salta à vista é que o objectivo de vencer as eleições autárquicas poderá ser prejudicado simplesmente porque alguns movem-se, em antecipação, para se posicionar no pós eleições, sem ter em consideração que as suas manobras afectam negativamente os resultados eleitorais. E isso, porque ambição cega. E cega porque se insiste em não ver e em não aceitar que ambições pessoais são bem vindas no partido, mas elas só são legítimas e ou se legitimam se se movem dentro do partido, se se realizam com o partido e se nunca vão contra o partido.