quarta-feira, julho 24, 2013

País viável? Quando?



Muitos estudiosos pensam que as ilhas normalmente são economicamente inviáveis. Apontam o facto de serem remotas, com excesso de população e dependentes da monocultura. Também estão mais sujeitas a choques externos, a deterioração dos termos de troca e dificuldades de acesso aos mercados. Isso sem falar da falta dos problemas de escala devido ao mercado exíguo e fragmentado e dos custos da insularidade quando se trata de arquipélagos.


Para James Meade, prémio Nobel da Economia, a inviabilidade das Maurícias era a conclusão obvia a tirar dos estudos feitos antes da independência das ilhas. Mesmo para Lee Kuan Yew, uma ilha como Singapura separada da Malásia era causa para muita apreensão em relação ao futuro. De facto, a generalidade das ilhas e arquipélagos normalmente integram grandes espaços e são generosamente subsidiados pelas metrópoles. Sucessos como os obtidos por estados independentes como Singapura e as Maurícias conseguem-se porque se opta por diversificar a economia, por apostar no capital humano e por fazer da exportação de bens e serviços o motor do crescimento.


Sempre que se comemora a independência de Cabo Verde relembram-se nos discursos oficiais o pessimismo de muitos quanto à viabilidade destas ilhas para na frase seguinte todos se congratularem com os ganhos alcançados. Considerando que há duas semanas atrás o partido que suporta o governo ainda debatia como “fazer a transição do modelo de reciclagem da ajuda para o de criação de riqueza”, é de se perguntar que ganhos são esses e se são realmente sólidos e sustentáveis. E é de se questionar também se políticas pouco sábias na perspectiva do desenvolvimento e mais motivadas para conservação do poder não contribuíram para que a ameaça de inviabilidade persistisse até hoje.


A crise que se vive no país deixa a nu a sua vulnerabilidade. Enquanto resultado da quebra nos donativos e empréstimos concessionais, a crise mostra a extrema dependência da ajuda externa. Como manifestação da incapacidade de compensar a menor procura interna com acréscimos significativos de procura externa de bens e serviços revela como as políticas de infraestruturação, de criação de ambiente de negócios e de promoção do sector privado foram inadequadas. Constata-se, entretanto, que, apesar dos enormes investimentos públicos, o país não cresceu, não reduziu o desemprego e não aumentou significativamente as exportações. A economia nacional afunila-se cada vez mais num único sector, o turismo, e são progressivamente mais evidentes as enormes deficiências no capital humano seja em qualidade, seja na sua adequação às necessidades do mercado.


O longo caminho de 38 anos de reciclagem de ajudas seguido por Cabo Verde destoa completamente do escolhido pelos casos de sucesso citados de Singapura e das Maurícias. Enquanto neles se cultivava a meritocracia, a abertura ao mundo e a excelência, em Cabo Verde hostilizava-se o investimento directo estrangeiro, alimentavam-se preconceitos contra a iniciativa privada e reforçava-se a dependência das populações em relação ao Estado. A diferença num e noutro caso nota-se claramente em tempos de crise. As economias abertas distinguiram-se na atitude proactiva e inovadora como os seus agentes se ajustaram às novas exigências da globalização. Pelo contrário, nas sociedades viradas para dentro, o conformismo tende a dominar, ilusões geradas pelo governo são alimentadas e os entraves a uma mudança de rumo persistem. Duvida-se realmente da viabilidade do país e a atitude adoptada não é criativa e mobilizadora de energia, mas sim de expectativa na retoma da generosidade dos outros, eufemísticamente chamada de cooperação.


Na quarta-feira da próxima semana estará em debate no Parlamento o estado da Nação. Pelo aumento da presença do Governo e do Estado na televisão nacional nas últimas semanas e pelo número de inaugurações previstas e realizadas nota-se que os velhos métodos de “ter a população na mão” não mudaram. Nem a ameaça da crise trouxe mudanças na relação governo, cidadãos e sociedade. E isso tem consequências. Assim como em 1988 o então presidente da república, Aristides Pereira, reconheceu que “a consciência laboriosa do povo se tinha destruído nas frentes de alta intensidade de mão-de-obra (FAIMO)” também a persistência de políticas de dependência e controlo eleitoral nunca irão libertar os cidadãos e a energia social para fazer o país dar um salto para um outro patamar onde o limiar da viabilidade e da sustentabilidade será ultrapassado definitivamente.

Editorial do jornal Expresso das Ilhas de 24 de Julho de 2013

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