As dificuldades com o ambiente de negócios em Cabo Verde ficaram patentes nos encontros com empresários estrangeiros realizados no quadro da semana da Parceria de Cabo Verde com a União Europeia. O relato “do saltitar de departamento em departamento”, da “burocracia que afasta investidores”, dos “anos e das oportunidades perdidas” e da “mentalidade das instituições em obstaculizar em vez de facilitar” marcou muitas das intervenções dos presentes. Ao levantar essas questões estavam a juntar a sua voz à dos empresários nacionais que há anos vêm-se queixando em vão do ambiente hostil existente, não obstante as reiteradas promessas do governo de mudar a atitude da administração pública em relação à actividade privada.
O próprio embaixador da União Europeia nos seus encontros com a comunicação social sentiu necessidade de transmitir para o país essas preocupações dos empresários e investidores. Segundo ele, a ajuda da União Europeia nesta fase visa em grande medida apoiar Cabo Verde na atracção do investimento e em melhorar o ambiente para a actividade empresarial. O mínimo que naturalmente quer ver é um esforço nacional da parte cabo-verdiana em reduzir a burocracia, em melhorar a coordenação dos processos de decisão e em agilizar as decisões. O pior que pode acontecer depois de um esforço em atrair investidores é constatar a sua desilusão com aquilo que se encontra.
Paul Krugman num recente artigo no New York Times escreveu que estamos a viver uma era em que ninguém assume que errou. Como não se assume, também não se faz um esforço efectivo para alterar a situação. Ainda hoje, no décimo quinto ano do seu mandato, ouve-se o Primeiro-ministro dizer que a administração pública precisa adequar-se para melhor servir o ambiente de negócios do país. Num balanço recente das cem medidas “urgentes” anunciadas em Novembro de 2011, o PM confirmou que só cinco (5%) foram executadas, estando umas iniciadas (9), outras em desenvolvimento (24) e em franco desenvolvimento (56) e ainda outras que simplesmente não foram aplicadas (6). A inércia parece ser difícil de vencer.
Em S.Vicente, no “Meeting Point” da semana passada ostensivamente voltado para atrair investidores e seduzir operadores económicos, falou-se outra vez num ponto de viragem. Mas a um ano das eleições legislativas é legítimo perguntar se com esse discurso está-se a anunciar uma inflexão na postura das instituições ou nas políticas seguidas até agora ou se se trata realmente de mais um artifício para ganhar tempo e gerir expectativas. Facto é que periodicamente S. Vicente têm sido palco de exercícios similares, designadamente de Conselhos de Ministros especializados, lançamentos de clusters e promessas de infra-estruturas “criadoras” de oportunidades. Depois nada de significativo acontece: o desemprego continua excessivo e os sinais de estagnação económica teimam em manter-se. Não se assume que provavelmente a falha maior está na orientação política da economia nacional.
O alerta vigoroso de investidores e empresários oriundos de países da União Europeia deve ser tomado com a devida seriedade. Como disse o embaixador da União Europeia na entrevista a este jornal aeconomia é o sector empresarial, não é o Estado e a mentalidade de arranjar um emprego no Estado e ficar lá o resto da vida está a acabar pelo mundo. Vindo de quem mais ajuda, de quem mais investe, de quem mais envia turistas, e de quem é o principal parceiro comercial, é conselho para se ter em devida conta.
Há que tirar ilações certas do espectáculo a que assistimos todos os dias em vários países europeus. Vêem-se os enormes sacrifícios para se adaptarem às novas exigências do mundo pós crise e o esforço despendido para viverem dos seus próprios meios depois de anos de bonança de fundos europeus a custo perdido e juros baixos nos empréstimos. Enfrentar os desafios de hoje não se compadece com postura que procura em décadas passadas e governos anteriores os culpados para os problemas de hoje. Pelo contrário, para que a adaptação ao mundo de hoje seja proveitosa, deve-se primar por uma liderança efectiva que, como também diz o economista Paul Krugman na sua coluna do New York Times, se distingue pela integridade intelectual: a vontade de enfrentar os factos mesmo se estão em desacordo com o que sempre se tomou como certo e a vontade de admitir o erro e de mudar de rumo.
Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 13 de Maio de 2015
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