Na
semana passada, o Presidente de Portugal, professor Cavaco Silva,
alertou para a necessidade de não se confundir custos com benefícios. “Uma
estrada é toda ela custos. O benefício é o trânsito que passará nela.
Se não houver trânsito, não há benefício, é zero. O investimento de um
empresário é custo, o benefício é a sua produção. Se não produzir nada,
não ganha”.Cavaco Silva acrescentou, ainda, que “isto não quer dizer que alguns não ganhem”. Por exemplo, “se uma estrada não tiver trânsito, há um que ganha, o empreiteiro, e há um que perde, o [contribuinte] que paga impostos”.
De facto, investimentos públicos justificam-se pelo seu impacto sobre o rendimento e qualidade de vida das pessoas e pelo efeito de arrastamento que demonstrarem ter sobre a economia nacional. Espera-se dos investimentos, realizados pelo Estado, que promovam o surgimento de empregos permanentes, directos e indirectos. Que aumentem a competitividade geral das empresas e do país, via diminuição dos custos de factores e a valorização do capital humano. E que, conjuntamente com outras despesas públicas, contribuam para o desenvolvimento e sofisticação de mercados no plano interno, traduzido em novas oportunidades de negócio e no fomento das exportações.
De facto, investimentos públicos justificam-se pelo seu impacto sobre o rendimento e qualidade de vida das pessoas e pelo efeito de arrastamento que demonstrarem ter sobre a economia nacional. Espera-se dos investimentos, realizados pelo Estado, que promovam o surgimento de empregos permanentes, directos e indirectos. Que aumentem a competitividade geral das empresas e do país, via diminuição dos custos de factores e a valorização do capital humano. E que, conjuntamente com outras despesas públicas, contribuam para o desenvolvimento e sofisticação de mercados no plano interno, traduzido em novas oportunidades de negócio e no fomento das exportações.
Por
isso investimentos públicos devem ser concebidos e realizados de modo a
que os seus efeitos sejam profundos, complexos e duradoiros. Não podem
ficar por objectivos de curto prazo. Muito menos, serem feitos,
simplesmente, para satisfazer interesses pontuais e partidários do
Governo.
Mesmo
hoje, em tempo de crise, em que um papel central é atribuído ao
investimento público para sacudir muitos países do torpor da recessão
económica, não se perde de vista o alcance e a consequência estrutural,
que deverá ter no médio e longo prazo. E compreende-se. Recursos para os
investimentos públicos ou resultam da captação da poupança interna,
reduzindo a disponibilidade para o investimento privado e para o
consumo, ou, então, da mobilização de fluxos externos. Em qualquer dos
casos, muito provavelmente, o País endivida-se ainda mais.
Face
à perspectiva da dívida, interna ou externa, importa, seguramente, que
as decisões tomadas sejam ponderadas quanto aos custos e benefícios. E
cuidem para que os efeitos multiplicadores esperados na economia
resultem em crescimento e aumento de rendimentos. Com isso se expande a
base futura de receitas do Estado e evita-se que o serviço da dívida
provoque desequilíbrios orçamentais, perturbadores da estabilidade
macroeconómica, a médio prazo, e em sobrecargas para as gerações
futuras.
Para
a realização dos seus objectivos amplos, é fundamental que o processo
decisório relativamente aos investimentos públicos seja seguido,
devidamente. À partida respeitando os princípios constitucionais que
devem reger as operações do Estado designadamente justiça,
transparência, boa fé e imparcialidade. Mas também, tendo em consideração, os efeitos no ambiente económico a curto, a médio e a longo prazo.
Isso
quer dizer que o Estado, por opção do Governo, não deve se colocar na
posição de escolher ganhadores no processo económico. Por via de
favores, de acessos especiais e de condicionamento de outros não deve
eliminar a concorrência e possibilitar, a alguns, lucros fabulosos. Nem
deve permitir extracção de rendas á custa do erário público, da criação
de monopólios privados ou da extorsão dos consumidores.
Nessa
perspectiva o Governo falhou ao permitir a especulação nos terrenos de
Cabo Verde. Fez a ganância de alguns subir a níveis elevados, encareceu o
investimento no país com a proliferação de intermediários e acabou por
inviabilizar muitos projectos nos braços de força que se envolveu por
razões partidárias. Não serviu aí o interesse público.
Também
não serviu o interesse público quando não soube pôr de pé uma politica
energética coerente. Foi incapaz de encontrar um novo parceiro
estratégico para substituir a EDP na Electra e optou por recorrer a
privados, seleccionados a dedo, para lhes entregar áreas de produção com
consumo certo, pago e crescente. Está a acontecer nas ilhas do Sal, S.
Antão e Boavista. Já se tinha verificado na ilha de Santiago com os
chamados produtores independentes na venda de electricidade, em momento
de carestia grave de energia na Capital.
Irá
acontecer em breve na produção de água para os municípios do interior
de Santiago entregue por 35 anos a uma empresa que, pelas informações
por ela disponibilizadas na Net, parece mais um start-up à volta
de uma universidade italiana. Um acordo feito e anunciado em 2007, um
ano antes de se aprovar e publicar o decreto-lei (Novembro de de 2008)
que o poderia enquadrar.
Em
todos esses casos não se vislumbra ganhos para os consumidores, nem a
melhoria da competividade da ilha e, muito menos, estímulos a
empresários nacionais, seja para expandir os negócios, seja para
aproveitar as oportunidades emergentes. Mesmo assim, o governo
justifica-se dizendo que a situação, no momento, assim o exige. Mas não
explicita a que custo, presente e futuro, e as razões porque aí se
chegou.
No
processo de decisão não se pode perder de vista o impacto que os
investimentos irão ter na economia local. Isso quer dizer, por exemplo,
que não pode ser indiferente ao Estado se o investimento público
emprega, ou não, caboverdianos. Se os trabalhos são, ou não, feitos por
empresas caboverdianas. Se no fim do programa de investimentos as
empresas nacionais estão mais, ou menos, preparadas para competir no
mercado internacional ou se tornaram capazes de desenvolver um sector de
exportação. E se a carteira de trabalhos do Estado criou oportunidades
para o surgimento de novas empresas.
Por isso é de se perguntar ao Governo: Após os 46 milhões de contos, mais de 400 milhões de euros, de
investimento em obras públicas, como estão as empresas caboverdianas de
construção civil? Sólidas, mais produtivas? Passaram a ter maior
capacidade de realizar obras nacionais em competição com empresas
estrangeiras? Quais são as perspectivas de internacionalização?
É de
perguntar também, depois dos milhões investidos no governçaõ
electrónica, quantos empregos foram gerados no sector das tecnologias de
informação e comunicação, quantas empresas foram criadas e quais as
perspectivas de Cabo Verde vir a exportar serviços nesse sector.
É
ainda de perguntar: Face á emergência energética que se vive no mundo em
geral, com particular acuidade em Cabo Verde, como é que os
investimentos do Estado nesse sector tem servido para dar maior
autonomia energética ao país, criar oportunidades para o aparecimento de
empresas, num sector que é claramente de futuro garantido, e
desenvolver uma cultura e uma expertise nacional em eficiência no uso da energia e água.
Definitivamente é de perguntar se é necessário que o executivo da FAO em Cabo Verde fale da “ falta de informação sobre os volumes de produção, os preços, as necessidades de cada ilha” e do facto de “como não foi feito esse diagnóstico parece mais fácil importar frutas e verduras de outros países” para se ver o óbvio. Para se ver que investimentos em barragens, prospecção de água, sistemas de regas e outras obras no mundo
rural só têm sentido se se conseguir extrair benefícios. E benefício
significa produção, significa acesso a mercados, significa vendas.
Investir
em S. Antão e manter o embargo dos produtos agrícolas é arcar com
custos sem praticamente quaisquer benefícios. Os persistentes índices de
pobreza da ilha são elucidativos a esse respeito. Também, investir e
não desenvolver circuitos de comercialização, que faça do País todo, e
particularmente as cidades e os centros turísticos, um mercado potencial
para a produção de cada localidade de Cabo Verde, só tem o efeito de
aprofundar o desânimo das populações. É mais uma esperança gorada
acompanhada dos custos inerentes: custos pessoais, materiais e de fibra
de uma sociedade.
Um
outro custo que sistematicamente vem se confundindo com benefício é a
formação profissional. Para o Governo formação profissional é a bengala
de que se socorre para dizer que está a fazer algo para diminuir
drasticamente o desemprego. Só que raramente se
disponibiliza para dizer quantos formandos realmente conseguiram
emprego. Ou como é que a produtividade do trabalho se alterou com
entrada de pessoas formadas no mercado. E como é que, com a regulação da
entrada nas profissões, se diminuiu o informal, se melhorou a qualidade
e se fez os salários evoluírem de acordo com a produtividade.
Ouve-se
que está a montar mais cursos. Fica-se com a impressão de que algo não
vai bem quando se publicita outros projectos para microfinanciar os
formandos. Aparentemente, não conseguiram emprego e o Estado procura transforma-los
em empresários. Ou seja, os custos de formação não resultaram em
benefícios significativos para as pessoas nem para a economia. Face a
isso a resposta do Estado é mais custos, mas agora em forma de crédito. É
a vitória do surrealismo, mas há quem ganhe no processo, na sua
montagem.
Por
tudo isso é evidente que, para manter em perspectiva a complexidade de
objectivos pretendidos nos investimentos públicos e evitar desperdícios e
desvios do interesse público, deve-se garantir a transparência do processo. O parlamento e os partidos de Oposição têm um papel central em assegurar-se de que o governo é, a todo instante, accountable pelos actos que pratica.
A tão propalada credibilidade
do País depende essencialmente da percepção no exterior e nas
organizações internacionais de como o Poder é controlado. De como o
processo decisório está constrangido a seguir a legalidade e está
sujeito à sindicância permanente da oposição e da sociedade.
Por isso, trabalha contra a credibilidade externa de Cabo Verde não é
quem questiona e fiscaliza os actos do Governo. E não interessa muito
como nos específicos apresenta o seu caso. Interessa essencialmente que o
pode fazer, e sem restrições. A forma e a efectividade das acções são
internamente avaliadas pelo eleitorado.
Observadores
no exterior não entram na política local. Avaliam o grau de fiabilidade
do País a partir da forma como o Poder lida com os limites instituídos.
È como se fizessem uso de um velho adágio, glosado: diz-me como tratas as minorias e a oposição e dir-te-ei quem és.
De
todo esse exercício o fundamental é que o País ganhe. Que não fique
sobrecarregado com dividas internas e externas. Nem se coloque
eternamente na dependência da generosidade, duvidosa às vezes, dos
outros. Pelo contrário, que crie condições para a prosperidade de todos.