Aproxima-se o fim 2010. Normalmente, no Natal e nas festas de S. Silvestre renovam-se as esperanças de um ano novo mais promissor. Neste ano, o segundo da crise internacional, a euforia própria da época festiva não consegue diminuir a preocupação geral com o futuro próximo. Desemprego, perda de rendimentos e insegurança em relação ao futuro afligem milhões de pessoas em todo o mundo. Para uma parte significativa delas, em vários países cujos governos insistem em fazer “mais do mesmo”, não se vislumbra uma saída a curto prazo.
A respeitada revista Economist no seu último editorial, datado de 16 de Dezembro, antecipou já que o ano 2011 vai ser o ano da crise da dívida soberana. É uma opinião também compartilhada por muitos comentaristas e experts que observam com cada vez mais apreensão a evolução da situação na Irlanda, em Portugal e na Espanha. Os juros crescentes pedidos na compra dos títulos de dívida desses países são reveladores da falta de confiança de que gozam junto dos mercados financeiros.
A União Europeia e particularmente a Alemanha quer submetê-los a uma espécie de terapia de choque para os reconduzir à estabilidade macroeconómica e eventualmente ao caminho do crescimento sustentável. Consolidação fiscal, aumento dos impostos, cortes nas despesas e reformas estruturais profundas designadamente no domínio laboral, para ganhar competitividade externa, são alguns dos remédios preconizados. O problema é que com tais receitas os “doentes” arriscam-se a ficar mais debilitados particularmente porque não será nada fácil gerir politicamente anos de crescimento económico baixo e de privações múltiplas nos sectores mais vulneráveis da população. Daí a preocupação com a dívida soberana, as hipóteses levantadas de declaração de falência acompanhadas de reestruturação da dívida e mesmo de cenários de abandono do euro por um ou mais países.
Em qualquer cenário parece hoje claro que os países europeus vão ter anos de crescimento anémico. São tempos difíceis a que Cabo Verde não conseguirá ficar alheio nem muito menos blindar-se. Vem da Europa grande parte das remessas dos emigrantes que contam bastante para o rendimento de muitas famílias. A ajuda externa predominantemente tem aí a sua origem. É o maior mercado para os produtos de exportação caboverdianos e é também o principal mercado emissor para o turismo nas ilhas.
Com o défice orçamental a aproximar-se dos 15% e a dívida pública a quase atingir os 100%, Cabo Verde não está em melhor situação de amortecer os efeitos negativos na sua economia provocados pela crise nos seus principais parceiros europeus. Uma outra atitude do Governo e uma outra consciência das dificuldades a enfrentar na actual conjuntura internacional teriam evitado certas opções que já estão se revelando caras, sem garantia de retorno adequado.
O alerta do Banco Central finalmente chegou, as eleições legislativas foram apressadas para o dia 6 de Fevereiro e o FMI já adianta que, para o ano 2011, espera contenção orçamental e travagem no processo de endividamento. Para os caboverdianos que já não viram muitos empregos criados com as linhas de crédito utilizadas na infraestruturação o próximo ano de menos investimento público será certamente mais difícil.
Há que encontrar outras vias que conduzam à retoma do investimento privado nacional e estrangeiro, que abram outras possibilidades para a exportação de bens e serviços e que potenciem os recursos humanos do país. Crescimento com criação de empregos e combate efectivo da pobreza dependem do sucesso que se obtiver nesse empreendimento.
Editorial do jornal "Expresso das Ilhas" de 22 de Dezembro de 2010
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