Nº 533 • 15 de Fevereiro de 2012
Editorial:
Finalmente o Governo resolveu falar no
Sistema de Informações da República. Em Nota de Imprensa, o Gabinete do
Primeiro Ministro procurou justificar-se por factos trazidos a público duas
semanas atrás por este jornal: a falta de fiscalização parlamentar da
actividade dos serviços secretos e falta de controlo dos dados desses serviços
por magistrados do Ministério Público como manda a lei. Na mesma nota, o
governo também quis negar que fontes do SIR tinham passado informações ao
jornal Asemana mesmo em face das declarações de deputados da comissão
parlamentar de fiscalização confirmando a fuga de informações. Desde de
Fevereiro de 2010 a Assembleia Nacional votou uma Comissão de Fiscalização
constituída por três deputados para acompanhar os trabalhos do SIR. Não se
compreende que, nestes dois anos, só tenham realizado dois encontros e que o
primeiro dos relatórios trimestrais obrigatórios fosse entregue apenas há
poucos dias. Também foge à compreensão saber que, apesar de o Director do SIR
ter sido nomeado a 27 de Janeiro de 2010, que só “neste preciso momento é que a
estrutura física da base de dados está a ser montada”. E que, por isso, os
magistrados do ministério público nomeados para controlar a legalidade dos
dados colhidos nada fiscalizaram até hoje. A clara falta de sinceridade nas
informações trazidas a público é realmente preocupante. Os serviços de
Informação servem ao Estado e não qualquer elite governante. A actividade de
recolha e tratamento de informações é matéria necessária, mas é delicada porque
pode pôr em perigo os direitos e liberdades dos cidadãos. Por outro lado a
“inteligência” produzida pelos serviços só é útil se não se subordina aos
ditames da política e, pelo contrário, ilumina, informa e complexifica a
feitura de políticas públicas em particular nos domínios da segurança, da
defesa e das relações externas. Para que o SIR cumpra com a sua missão é
indispensável que a sua fiscalização pelos órgãos de soberania, Assembleia
Nacional e Presidente da República, e também pelo Ministério Público, o órgão
de defesa da legalidade, seja efectiva e permanente. Mesmo nas democracias mais
consolidadas, constatam-se desvios politicamente motivados dos serviços de
informações. A guerra no Iraque por, exemplo, foi justificada com informações
fabricadas pela CIA sobre a existência de armas de destruição massiva. Em
Portugal, recentemente, o parlamento esteve a averiguar denúncias de
funcionamento impróprio dos serviços secretos. Também na Alemanha, em fins de
Janeiro último, os serviços de informação chamados de “Protecção da
Constituição” foram acusados de espionar membros de partidos da oposição. Estes
e muitos outros exemplos demonstram que não se pode ser complacente com estes
serviços. A possibilidade de abuso existe e só a fiscalização estrita por entidades
independentes pode dar alguma garantia. A instituição do SIR em Cabo Verde já
demonstrou padecer de problemas sérios. O SIR foi criado por lei em 2005, mas a
regulamentação da lei só veio a se verificar em Dezembro de 2009. Em Janeiro de
2010, o governo nomeou o Director Geral mas dados vindos a público demonstram
que dois anos antes já era interlocutor de serviços similares estrangeiros e
dirigia a instalação dos serviços. Todo este trabalho na sombra não traz
tranquilidade aos caboverdianos. Há uma experiência de décadas com a polícia
política: primeiro a PIDE/DGS do regime salazarista e depois a Segurança do
regime de partido único que ninguém quer ver repetida. É fundamental que o SIR
seja instituído com todas as salvaguardas necessárias, em particular sob o
controlo do Parlamento e que Governo dê provas que irá dirigir todo o processo
com a necessária honestidade, competência e respeito pelos direitos dos
cidadãos.
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