quarta-feira, setembro 18, 2013

É difícil cumprir regras?



A explosão de alegria que se seguiu à vitória de Cabo Verde no jogo contra Tunísia de apuramento para o Mundial infelizmente não durou muito. Cedeu lugar ao choque da desqualificação devido à participação de um jogador cabo-verdiano suspenso nos últimos minutos do jogo.Tunísia ganhou na “secretaria” os pontos que a equipa dos Tubarões Azuis vitoriosamente tinham conseguido no relvado. A nação inteira, que já se via no Mundial em 2014 no Brasil pela primeira na sua história, não quis acreditar que falhas no cumprimento estrito das regras da FIFA lhe fazia perder o sonho de gerações de aficionados do futebol.


Aconteceu com Cabo Verde o mesmo que com demasiada frequência se vem verificando com vários países no processo de qualificação para o Mundial de futebol. Guiné Equatorial, Etiópia, Togo, Gabão, Sudão e Burkina Faso são países que ou perderam pontos ou ficaram desclassificados por falhas na aplicação das regras. Curiosamente são praticamente países africanos os únicos que se deixam entrar pelos caminhos do incumprimento no processo anulando esforços de jogadores e técnicos e frustrando expectativas de nações inteiras. Há quem encontre similaridade entre essa atitude de negligência no mundo do futebol com o que se passa na relação com outras instituições. Não há rigor na gestão e não há assunção de responsabilidades. Os dirigentes faltosos em geral mantêm-se nos cargos imperturbáveis quanto às consequências gravosas dos seus actos.


Cabo Verde fez neste ano de 2013 duas incursões históricas no mundo altamente competitivo do futebol continental e internacional. Em modalidades como o basquetebol também os avanços têm sido notados. Prosseguir a partir do ponto já atingido exige uma outra atitude e um outro nível de institucionalização. A energia e criatividade dos nossos jogadores assim como a crescente capacidade dos nossos técnicos têm que ter as vias organizacionais e institucionais adequadas para produzir sucessos em confronto com os esforços sofisticados dos outros competidores. E aí como também em outras áreas que Cabo Verde precisa para ser competitivo, desenvolver-se e vencer não deve haver espaço para complacência. Responsabilidades por falhas, incompetência e perdas de oportunidades devem ser assacadas a quem de direito.


Ensino bilingue


Um factor essencial para Cabo Verde ser mais eficiente e mais inovador e ganhar em produtividade é a qualidade do ensino. Mas há anos que avaliando pelos índices do relatório de competitividade do Fórum Económico Mundial se nota que pouco se fez para adequar a mão-de-obra nacional às exigências do mercado quanto à apropriação e uso de tecnologias e desenvolvimento de competências necessárias para prestação de serviços internacionais. No domínio da qualidade o Governo praticamente tem ficado pelos discursos.


Na questão do crioulo nas escolas, pelo contrário, a acção do governo distingue-se pela obstinação mesmo face à oposição de parte significativa da sociedade civil. Já anunciou que a grande novidade deste ano lectivo é experiência de ensino bilingue em duas escolas da ilha de Santiago. Pergunta-se qual a motivação. Será de melhorar a qualidade de ensino nas escolas? Será de dar aos futuros cidadãos domínio maior da língua oficial e por essa via possibilitar-lhes conhecimento mais aprofundado dos seus direitos, elevar-lhes o nível de participação cívica e política e melhorar a relação com as instituições públicas? Ou será simplesmente uma questão ideológica?


O crioulo ainda não é a língua oficial, um passo que parece essencial para ser adoptado como língua de instrução e de educação para a cidadania. A criação de experiências piloto de ensino bilingue coloca o problema da obrigatoriedade ou não dos pais submeterem os filhos a esse tipo de experimentação. Se for opcional poderá verificar-se o que aconteceu noutras paragens designadamente Madagáscar em que as elites urbanas simplesmente moveram os filhos para escolas onde a língua de ensino era o francês. Não se ganhou nada em qualidade de ensino, mas agravaram-se as desigualdades sociais. Quem tinha melhor domínio do francês acedia aos níveis superiores de educação e formação.


Em Cabo Verde há que focalizar no que é prioritário. Pagam-se caro inadequações na formação das novas gerações. Prioridades trocadas são dificilmente corrigíveis e têm consequências que afectam toda uma vida.

Editorial do jornal Expresso das Ilhas de 18 de Setembro de 2013

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