quarta-feira, novembro 05, 2014

Custos de ineficiência



JORNAL 675 DE 05 DE NOVEMBRO DE 2014


O Primeiro-ministro José Maria Neves, em declarações à imprensa na semana passada alertou as pessoas para não andarem por lugares perigosos para se fazerem sempre acompanhadas de outras pessoas e evitar dar oportunidades e chances aos criminosos. O ministro de Justiça reconfirmou os avisos do PM aconselhando as pessoas para aprimorarem a sua vigilância própria e não serem surpreendidas por criminosos. Imagine-se o desconforto dos cidadãos perante tais declarações. Vindo do primeiro-ministro e do ministro da justiça tem o efeito aproximado de uma de confissão de impotência perante a criminalidade que vem assolando particularmente a capital do país.
Lei e ordem é o bem fundamental que todos os cidadãos esperam que o Estado garanta a todo o momento. É fundamental para assegurar o direito à vida; o exercício da liberdade depende dele e a expectativa de prosperidade individual e colectiva só pode verificar-se num quadro por ele criado. Recursos públicos são disponibilizados ao Estado para que cumpra esse dever básico de garantir a segurança de todos. O governo, com essa responsabilidade, depois de ter gasto milhões de contos todos os anos com a polícia e de ter até lançado as forças armadas na manutenção da tranquilidade e ordem públicas, não pode ficar pela simples constatação dos resultados medíocres em matéria de segurança e de combate à criminalidade e por apelos para que não se deixe que uma cultura de medo se instale entre nós.   
Os cabo-verdianos esperam ver liderança em matéria de segurança que traga resultados palpáveis e duradouros. A centralidade da liderança do Estado nesta matéria não deve ser escamoteada com declarações desculpatórias de que o Estado está a fazer a sua parte. Também para o Estado não é dignificante que, perante os avanços da criminalidade, se sinta na obrigação de dizer aos cidadãos para condicionarem a sua vida e a sua liberdade de movimentos. Para não andarem sozinhos por certos lugares em certas horas do dia ou da noite. Lugares esses não identificados mas que se conjectura serem os mesmos que segundo testemunhos dados na comunicação social não se vêem polícias e que também a polícia reconhece que não entra. Recentemente abortaram uma operação num bairro da capital estribando-se em falhas na iluminação pública.
A evidente ineficiência e ineficácia das políticas e das medidas de política no sector da segurança deixa qualquer pessoa apreensiva. Se esse grau de ineficiência e ineficácia se aplica a outros sectores da administração do Estado pode-se imaginar os problemas que poderão estar a acumular-se, alguns convenientemente debaixo do proverbial tapete, mas que tarde ou cedo poderão confrontar a todos. A esse respeito não são reconfortantes os sinais que vêem de sectores como transportes aéreos, transportes marítimos, energia e gestão portuária. Nem tão pouco de sectores como a educação, a saúde e mesmo a administração tributária que não obstante promessas múltiplas de membros do governo e do PM não se devolvem o IUR e o IVA devidos desde de 2008.
Muita de posição não invejável de Cabo Verde no relatório Doing Business do Banco Mundial (caiu quatro posições para 122º em 2015) deve-se à ineficiência e ineficácia da máquina estatal. Os custos que resultam desse estado de coisas são enormes. A economia ressente-se e não cresce. O Estado, confrontado com receitas decrescentes numa economia estagnada, procura com novos impostos tirar uma parcela maior da riqueza nacional, subtraída às famílias e às empresas. Um círculo vicioso destrutivo pode ser criado e pode bem ser capaz de arrastar a todos. Como em matéria de segurança, de nada vale o governo proclamar que o Estado já fez a sua parte se os resultados para os trabalhadores, para o sector privados e para toda a comunidade nacional se mostram desastrosos.  
Um pequeno Estado como Cabo Verde devia apostar em ter uma administração pública com elevado grau de profissionalismo, altamente comprometida com o interesse geral e portador de uma invejável cultura de serviço público. Essa é grande aposta que Singapura fez e em boa medida também a Maurícias. Sectores como Segurança e Educação brilham e o ambiente de negócios situa-se entre os melhores do mundo. Fundamental para que se chegue a esse patamar é não permitir que a administração pública seja veículo de uma orientação governativa virada para a propaganda e relações públicas. Sacrifica-se a isenção e a imparcialidade exigida aos agentes públicos, a verdade não é tida nem achada e a meritocracia torna-se uma miragem. Daí não podem vir bons resultados em nenhum sector.

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