Hoje, dia 20 de Abril, inicia-se uma nova legislatura. O MpD regressa ao poder depois de o ter perdido quinze anos atrás. O PAICV depois ter sido oposição e posteriormente governo agora volta à oposição. Pela primeira vez temos os dois grandes partidos com experiência alternada de governo e de oposição democrática. Uma nova era na actividade parlamentar poderá abrir-se se a experiência de ter estado nos dois lados do muro for devidamente aproveitada.
A realidade vivida da inevitabilidade, a prazo, da alternância no exercício do poder ajudará certamente a conter manifestações de arrogância e de intransigência. Espera-se que também incentive a criação de um ambiente mais propício a negociações, a compromissos e ao desenvolvimento de uma atitude de defesa da instituição parlamento. Quem já foi governo e oposição tem todo o interesse que se institucionalize o mais possível os direitos das minorias para se evitar impasses e conflitos que degradem a imagem da instituição e retiram-lhe a eficácia desejada dentro do sistema político. Práticas que configuram uma espécie de tirania da maioria, se num determinado momento se mostram proveitosas para quem governa, pouco mais tarde acabam por revelar-se negativas, inibidoras de iniciativas e sustentadoras de uma imagem pública perniciosa à instituição, à democracia e ao pluralismo.
A democracia representativa tem estado estado sob pressão em vários países independentemente de serem velhas ou novas democracias. Sondagens realizadas revelam como vêm baixando os níveis de confiança nas instituições democráticas em particular no parlamento. Vários factores contribuem para isso. Os cidadãos, com o poder recentemente adquirido de se informarem sobre o que passa à sua volta e no mundo a todo o momento através da internet e de se comunicarem através das redes sociais, olham para o parlamento como uma espécie de relíquia do passado num mundo do qual se esperam respostas rápidas e eficazes para os problemas que todos os dias surgem. Para eles fica cada vez mais evidente a dificuldade do parlamento em lidar com situações complexas como, por exemplo, os problemas do euro e as políticas de austeridade aplicadas na Europa, ou então a crise de refugiados e a islamização da Europa ou ainda, por exemplo, no caso do Brasil de uma quebra no crescimento acompanhado de desemprego, inflação e acusações graves de corrupção na classe política.
As soluções que vêm sendo apresentadas de mais partidos políticos, de flexibilização de mandatos ou mesmo de mais experimentação em formas de democracia directa trazem outros inconvenientes. Acabam por introduzir mais dificuldades que depois vão contribuir para o desprestígio ainda mais da instituição parlamentar, para instabilidade governativa e em certos casos para ascensão de partidos extremistas mergulhados em nacionalismo e políticas de identidade. O activismo nas redes socias já demonstrou ser mais eficaz em mobilizar para derrubar ditaduras como se viu na Primavera Árabe do que a construir comunidades capazes de suportar instituições estáveis. O aparecimento de novos partidos como aconteceu em Espanha até agora não trouxe estabilidade governativa. As consequências da flexibilização de mandatos de deputados que os liberta das amarras partidárias até ao ponto de mudarem de partido vêem-se, por exemplo, no caos da câmara de deputados no Brasil e na corrupção generalizada dos seus membros, aliciados que são a vender o seu voto a interesses particulares.
A história tem demonstrado a importância fulcral da democracia representativa na defesa das liberdades, do pluralismo e do Estado de Direito. É fundamental que no início de uma nova legislatura se renove a vontade de a fazer plenamente funcional de forma a que se prestigie aos olhos dos cidadãos e sirva de contenção à cultura anti-política, anti-partido e anti-pluralismo que anda por aí sempre à procura de uma oportunidade para se manifestar. Já tivemos a segunda alternância e todas as forças políticas do arco da governação já foram governo e já se viram na oposição. As condições estão criadas para um novo comprometimento com o aprofundamento e a consolidação da democracia representativa. Naturalmente sem descurar as formas de democracia participativa e referendária previstas na Constituição e nas leis.
Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 20 de Abril de 2016
Sem comentários:
Enviar um comentário