Um dos aspectos que mais chamou a atenção nos ataques terroristas na Bélgica foi que provavelmente eram evitáveis se houvesse maior partilha de informações entre as polícias e maior coordenação das forças de segurança. A natureza das ameaças com que as democracias se deparam hoje exige uma actuação superior, mais inteligente, mais compreensiva e mais eficaz dos vários componentes do sistema de segurança. Deve-se, porém, ter sempre em atenção que se é verdade que não há exercício de liberdade sem segurança, também não é com derivas securitárias que alienam as comunidades e alimentam uma cultura de ressentimento e de vitimização que se devolve às pessoas a possibilidade de se sentirem livres e seguras no seu dia-a-dia. Em Cabo Verde também o sentimento de insegurança traduzido nos tristemente célebres “caçubodies”, que já vêm de muitos anos, trouxe à tona a inevitável tensão entre a liberdade e a segurança. A reacção das autoridades, seguindo a abordagem chamada de tolerância zero adoptada em vários países, não teve os resultados esperados ou prometidos. A insegurança persiste. Tem-se, entretanto, uma polícia mais militarizada, mas não necessariamente mais eficaz. O policiamento de proximidade que supostamente devia acompanhar a implementação da política de tolerância zero e ser instrumental na ligação com as comunidades não aconteceu. São falhas bastante debatidas no parlamento e na imprensa e reconhecidas mesmo em documentos oficiais, designadamente no Plano Estratégico de Segurança de 2014. Dentro da instituição policial e em vários sectores de segurança reconhece-se o problema, mas até agora não houve acção consequente capaz de restaurar ao cidadão comum a tranquilidade que almeja ter quando faz o seu footing, sai para a noite ou chega à porta da sua casa. Num “post” no Facebook o comandante da Polícia Nacional em S. Vicente, Alcides da Luz, deixa claro as suas apreensões: “A prevenção e o combate à criminalidade não se fazem priorizando em absoluto acções repressivas/reactivas, vigilância física através de patrulhamento auto e apeado (passear do auto e de farda)”. E faz sugestões: “A implementação plena do Policiamento de Proximidade vem, entre outras coisas, aproximar cada vez mais o polícia e o cidadão através do contacto, diálogo e interacção permanentes. Vem permitir que os cidadãos participem na Ordem e Segurança dos seus Bairros, nas zonas distantes dos centros urbanos.” Tal como já se conhece de outras críticas ao funcionamento do sistema e segurança, ainda chama a atenção para “a insistência em não trabalhar, partilhar e articular informações entre os serviços policiais”. Esta última preocupação tem implicações que vão para além da resposta à pequena criminalidade ou à necessidade de se garantir ordem e tranquilidade em todas as cidades e vilas de Cabo Verde. As ameaças que podem vir dos diferentes tráficos, do crime organizado e do terrorismo só podem ser confrontadas tendo as forças nacionais e os serviços de inteligências articulados entre si e com organizações congéneres estrangeiras. Se para países como a Bélgica é urgente ultrapassar empecilhos ao funcionamento eficaz das forças de segurança, com mais razão aqui, com os parcos recursos, há que ser efectivo em tudo o que respeita à segurança, seja na guarda dos nossos mares e recursos marinhos, no combate ao crime ou em assegurar tranquilidade às pessoas. Para isso o novo governo terá que agir decididamente para ultrapassar dificuldades e resistências institucionais diversas entre as quais as há muito identificadas e relembradas agora. É preciso nunca esquecer que Segurança é de importância estratégica fundamental para o desenvolvimento do país.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 749 de 06 de Abril de 2016.
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