Uma das bandeiras da liderança de Ulisses Correia e Silva são as incompatibilidades que inclui na proposta de revisão dos estatutos do MpD que vai levar à Convenção de 3 e 4 de Fevereiro. Propõe no artigo 66º que sejam incompatíveis o exercício designadamente de cargos públicos nas empresas públicas e na pública com cargos partidários executivos a todos os níveis. A mesma incompatibilidade deverá existir para quem é dirigente de organizações não-governamentais ou das que recebem fundos públicos. Quanto aos que exercem um cargo na pública, de direcção nos serviços desconcentrados, fundos sociais e serviços autónomos impede-se que integrem listas de candidatos às eleições autárquicas e legislativas. Há ainda outras incompatibilidades aplicadas aos militantes bloqueando-os a possibilidade de serem dirigentes locais e nacionais e também aos presidentes de câmaras e vereadores de serem dirigentes do partido no município. Uma primeira impressão que se tem da proposta é que é claramente excessiva. Limitam-se os direitos de participação política dos militantes do partido com uma facilidade espantosa. Ao proibir participação nas listas, criam-se inelegibilidades que não existem na Constituição senão para os juízes e para os militares. Noutros casos há restrições de direitos para agentes da pública que não aqueles que o artigo 242º da Constituição permite que a lei possa estabelecer deveres especiais. Quanto às incompatibilidades entre o exercício de cargos públicos e outras actividades que a proposta de estatutos prevê, de acordo com o artigo 241º nº7 da CRCV, só podem existir as que forem determinadas por lei.
Os partidos políticos por força do seu papel constitucional são obrigados a respeitar os direitos, liberdades e garantias e a regerem-se por princípios de organização democráticos. Compreende-se que, devido aos abusos que todos assistiram nos últimos anos derivados da excessiva partidarização da pública e de outros sectores do Estado, se procure pôr um travão efectivo a isso. Mas isso faz-se é pela lei aprovada na Assembleia Nacional e aplicável a todos e não pela via dos estatutos dos partidos. Os partidos têm vocação de poder e como tal têm entre uma das suas funções preparar pessoas para ocuparem posições-chave no Estado sempre que receberem o mandato do eleitorado para governar. Não significa que o partido não possa contratar ou cooptar quadros de profissões liberais, da academia, do mundo empresarial e da própria pública para servir em cargos seniores. Mas é evidente que tendo o partido uma filosofia política, um legado histórico e um programa sufragado, o núcleo da sua acção no governo deve ser conduzido por quem institucionalmente se preparou para isso. Não contribui em nada para se ter uma pública a funcionar de forma isenta e imparcial coarctar os direitos dos militantes do partido. Deve-se é encontrar um modelo adequado de relação entre o poder político e a aplicável a todos que salvaguarde esses valores e permita que a AP seja eficiente e eficaz na sua actuação. Limitar os direitos dos militantes além de ferir a constituição abre o caminho para manobras perversas em sentido contrário ao pretendido. A oferta de cargos no Estado, por exemplo, pode tornar-se um instrumento de luta política dentro do partido. Para se ver livre de alguém numa comissão política ou outro órgão do partido nomeia-se-lhe para um cargo numa empresa, num instituto ou na . São estas distorções, muitas vezes com consequências gravosas para a democracia e o Estado de direito, que se criam quando os partidos, em vez de se diferenciarem com base nas políticas e na acção política, procuram pôr-se acima dos outros, proclamando uma ética superior. É um caminho que historicamente já demonstrou que não favorece o pluralismo nem o pluripartidarismo e é inimiga do parlamentarismo.
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