O atropelamento de turistas na pedonal das Ramblas, em Barcelona, sexta-feira passada, dá continuidade a uma série de ataques brutais na Europa mas também em África em que o alvo são os turistas. Seja em Paris, Manchester, Londres, Berlim, Nice ou Bruxelas, Egipto, Costa do Marfim ou Mali o objectivo dos terroristas é matar o máximo número de pessoas, de preferência nacionais de vários países. No caso de Barcelona, as vítimas, entre mortos e feridos, eram de 34 países. Tais tácticas, para além dos terríveis custos humanos que provocam, do medo que instilam e da falta confiança entre as pessoas que geram, tendem a afectar severamente a actividade turística que, cada vez mais em vários países, vem-se afirmando como um dos principais motores do crescimento económico e de criação de emprego.
O Conselho Internacional do Turismo (ITB) no seu último relatório sobre as tendências de viagens, citado pelo jornal Financial Times, diz que a segurança tornou-se o principal critério na escolha dos locais de férias: quase metade dos turistas têm sérias preocupações com a segurança e que dois terços dizem que só viajam para destinos internacionais que consideram seguros, sem registo de conflitos ou instabilidade. Segundo o mesmo jornal, só a cidade de Paris perdeu mais 1,5 milhões de turistas na sequência dos vários ataques terroristas. Antes, destinos como a Tunísia, o Egipto e a Turquia tinham pelas mesmas razões perdido turistas a favor de destinos como Espanha, Canárias e Cabo Verde. Não espanta pois que o ataque em Barcelona tenha deixado apreensivo operadores como a TUI e a Thomas Cook com a possibilidade de perdas no fluxo turístico para vários pontos de Espanha e das Canárias. Mesmo nos destinos que ainda não foram afectados aumenta a preocupação que, com os terroristas a tomarem qualquer concentração de turistas como alvo, sejam também vítimas de um ataque. Uma situação que a se verificar teria um efeito demolidor em países como Cabo Verde em que é visível a preponderância crescente do sector do turismo sobre a economia nacional.
A segurança é vital para o presente e futuro do Turismo em Cabo Verde. Era de esperar uma maior atenção do Estado em matéria de segurança nas ilhas do Sal e da Boa Vista, as ilhas mais viradas para o Turismo e com maior concentração de turistas europeus. Os dados da criminalidade nas duas ilhas tanto em termos de ocorrências como de complexidade dos crimes cometidos apontam que a acção do Estado não está a ter a eficácia desejada. É claro que injecções de meios materiais e humanos não estão a dar os resultados pretendidos, como, aliás, não deram frutos em momentos anteriores com o anterior governo.
As duas ilhas, em particular a Boa Vista, que à partida tinham poucos milhares de habitantes, viram a sua população triplicar e quintuplicar com migrantes nacionais vindos das outras ilhas e estrangeiros maioritariamente vindos de países africanos atraídos pela dinâmica rápida do turismo financiado pelo investimento directo estrangeiro. À complexidade humana, económico-social e cultural com seus reflexos na natureza e níveis da criminalidade e impacto na ordem e tranquilidade, contrapôs-se uma abordagem policial que não se diferencia grandemente do que se fazia noutros pontos do território nacional. Ficou-se pelo mesmo sistema de forças, a mesma cultura organizacional e os mesmos métodos de actuação. É evidente que não podia funcionar e não funcionou em particular nas ilhas que mais mudaram sob o impulso do exterior e que continuaram a ver largas extensões do seu território sem controlo efectivo das autoridades. Nem tão pouco podia funcionar nas ilhas em que, assim como o crescimento do turismo não foi acompanhado de avanços correspondentes nos domínios designadamente da habitação, saneamento básico, saúde, energia e água, também no campo policial ficou-se aquém do exigível pela complexidade das situações enfrentadas no dia-a-dia.
No Boletim Oficial de ontem, 23 de Agosto, vem publicado que a verba de 219 mil contos do Fundo de Sustentabilidade Social para Turismo financiada pela taxa turística vai para equipar a polícia nacional com veículos, comunicações e outras aquisições. Para a polícia judiciária foi alocado o valor de 27 mil e 500 contos basicamente para os mesmos efeitos. É evidente que com a criminalidade que tende a crescer na ilha do Sal e na Boa Vista essas forças são insuficientes particularmente quando se tem presente as ameaças que pairam sobre o turismo e os turistas e ainda a realidade da grande extensão territorial, povoamento escasso e exposição das ilhas a desembarques e outras operações sem autorização. Urge de facto, a exemplo do que outros países com situações similares fizeram, criar uma outra força de segurança incluindo a guarda costeira e os fuzileiros navais que imponha a autoridade do Estado nos mares, nas costas e nas extensas zonas do país de parca população e tenha capacidade militar para responder a situações de terrorismo ou de crime organizado.
O Turismo é ao mesmo tempo frágil e crucial para dinâmica do país nos próximos tempos. E sabe-se que o factor segurança é o que fundamentalmente está a contar na escolha do destino pelo turista. Há que ser criativo, seguro e eficaz para evitar que Cabo Verde perca mais esta oportunidade. Importa, de facto, continuar a fazer convergir sobre si uma procura externa valiosa, absolutamente necessária para dinamizar a sua economia e colocá-lo na via do desenvolvimento.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 821 de 23 de Agosto de 2016.
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