Nº 542 • 18 de Abril de 2012
Editorial:
As relações entre países no plano
internacional guiam-se fundamentalmente pelo princípio de que, em matéria de
política externa, interesses sobrepõem-se a sentimentos ou ideologias. Cabo
Verde enquanto país arquipélago posicionado no Atlântico Médio, a 500 milhas da
África, devia ter bem presente essa regra. O desenvolvimento que almeja depende
da capacidade em construir relações e em adoptar estratégias aos níveis
regional e internacional de inserção na economia mundial voltadas para a
criação de emprego e crescimento económico. A política externa caboverdiana,
desde dos primórdios da independência, deu sinais de forte preconceito
ideológico. Fez uma aproximação inconsequente com a África, alojou-se no grupo
dos não alinhados para esconder simpatias ideológicas problemáticas e
desenvolveu uma relação com os doadores que fez de Cabo Verde o segundo país do
mundo que mais ajuda externa per capita recebeu. Apesar dos sucessos, de pouca
eficácia tem-se mostrado a diplomacia caboverdiana em abrir caminhos que pudessem
concretizar os objectivos da criação de hubs aeroportuários , de centros de
transbordo, da praça financeira na região e de outros eixos da agenda do
Governo. Desafios complexos colocam-se actualmente que exigem uma abordagem
fria, centrada em objectivos bem definidos. O Mundo vive uma crise de grandes
proporções, Cabo Verde com a graduação a país de rendimento médio deixa de ter
ajuda concessional em 2013 e a região ocidental africana sofre as grandes
tentações advindas do tráfico de droga. É precisamente neste momento de grandes
exigências que sinais diversos vindos recentemente a público dão conta que
sérias falhas ainda exigem na definição e execução da política externa. As
negociações com a União Europeia, seja no recente acordo pela mobilidade, seja,
meses atrás, no acordo de pesca e também no acordo da parceria especial,
atraíram críticas de vários sectores da sociedade. Também são vistas com
cepticismo matérias como o acordo de readmissão, a abertura total do mercado
caboverdiano a empresas estrangeiras e políticas de imigração que sobrecarregam
o país com mão-de-obra sem qualificação. Os últimos acontecimentos na
Guiné-Bissau vieram relembrar a instabilidade quase crónica da região e o
desafio que isso representa. Dias atrás, era o Mali a ameaçar desintegrar-se na
sequência de um golpe militar. O próprio Senegal esteve à beira do caos por
causa do pleito eleitoral presidencial. A continuidade de pertença de Cabo
Verde à CEDEAO requer uma acção externa inteligente na região que antecipe
tendências, que aproveite oportunidades emergentes e que potencie relações
(networks). Isso porque, dada a livre circulação de pessoas, a instabilidade
social de qualquer um deles pode constituir em ameaça para os outros. As crises
repetidas na Guiné demonstram que ainda se está mal preparado até para ajudar.
A simples aplicação da panaceia “eleições” não resolve completamente situações
graves de denegação de direitos, de compra de consciências e de instituições
que se reclamam de legitimidade superior à legitimidade popular. Ao ignorar a
complexidade da situação arrisca-se a que uma intervenção, mesmo imbuída dos
melhores propósitos, possa ser vista como favoritismo para com uma das partes.
Qualquer intervenção de Cabo Verde deve referenciar-se sempre pelos seus interesses
nacionais. O país, pela sua história, dimensão e cultura do seu povo só ganha
se for visto como o “parceiro honesto”. Não pode confundir-se, nem deixar-se
confundir com interesses de outras potências envolvidas e nem ter jogadores
locais em quem aposta. O Governo deve ter em mente que, em certas matérias da
política externa, especiais deveres de consulta com o Presidente da República e
partidos da oposição asseguram o comprometimento de todos na definição e
consecução do interesse nacional. A