quinta-feira, abril 28, 2011

Democracia não rima com cheque em branco



A aprovação da moção de confiança na sequência da apresen­tação do programa do Governo inaugura formalmente o terceiro mandato do Paicv na condução dos destinos de Cabo Verde. O governo, há um mês empossado, deixa a sua condição de governo de gestão e inicia com plenos poderes a implementação das suas políticas com vista à realização dos objectivos e metas que propôs ao país.

A Constituição exige que no Programa do Governo fiquem claras as principais orientações políticas a seguir, as medidas a adoptar e as tarefas a realizar. Através do seu Programa, o governo explicita os termos do contrato de legislatura que, com a legitimida­de adquirida nas urnas, tem o direito de propor à Nação. No debate que se segue à apresentação do documento deve ter a oportunidade de, sem pressão de carácter eleitoralista, mostrar qual é a situação real do país, de estabelecer os parâmetros da sua governação e de explicar como irá atingir os objectivos.

Os partidos da Oposição representados no parlamento têm um papel fundamental neste momento inicial do mandato do Gover­no. A eles fica reservado o papel de esmiuçarem o Programa com questionamentos que iluminem para toda a Nação: as vias, os meios e os fins propostos. Com isso fixam-se os elementos que ao longo da legislatura permitirá a todos os cidadãos e à Oposição fazer o seguimento da governação e exigir responsabilidades pela forma e ritmo da execução das políticas e pelos resultados obtidos.

O debate do Programa do Governo que hoje terminou na Assembleia Nacional ficou aquém do que se desejava para total esclarecimento da Nação quanto às pretensões do Governo. Con­tribuiu fortemente para isso o facto de o documento ter ficado por fórmulas genéricas em vez de mostrar as medidas e tarefas para cada área governamental. A possibilidade de um debate profícuo que preenchesse as lacunas do programa ficou comprometida com a postura do governo em negar respostas directas aos pedidos de esclarecimento da Oposição e em socorrer-se de tácticas como “relembrar os anos 90”.

Também os desafios dirigidos à Oposição para apresentar pro­postas alternativas só serviram para desvirtuar o debate e desviá-lo dos seus propósitos. De facto, o Programa só pode ser apresentado pelo Governo e como não é sujeito à votação não pode ser alterado. A moção de confiança apresentada é que é votada e o seu propósito é firmar a solidariedade do Governo com a maioria parlamentar.

Do que todo o país pôde presenciar na Assembleia Nacional nos últimos três dias, pode-se chegar à conclusão que os anos da crispação política na democracia caboverdiana ainda não chegaram ao fim. Uma terceira vitória do Paicv nas eleições parece não lhe ter trazido tranquilidade suficiente para encarar a Oposição, enquanto entidade distinta, alternativa e adversária, como algo indispensável ao funcionamento da democracia. Quanto ao MpD, não é claro que já conseguiu retirar todas as lições das derrotas sofridas. O resultado é o enlace fatal em que ficam os dois grandes partidos caboverdianos com prejuízos óbvios para consolidação da demo­cracia e para a construção do futuro do país.

Mobilizar uma forte pressão cívica e institucional para que se cumpram as regras do jogo democrático poderá ser um factor de diminuição da tensão política. Para isso será fundamental a contribuição dos cidadãos individualmente, da sociedade civil e da comunicação social. Também essencial será o papel do Presidente da República e de instituições como o Provedor de Justiça, o Procurador-geral da República e os tribunais a começar pelo Tribunal Constitucional. No início desta terceira década de democracia é fundamental que todos os elementos do sistema desempenhem em pleno o seu papel para que as virtualidades do sistema democrático se manifestem e contribuam para a liberdade e a prosperidade de todos.

Editorial do jornal “Expresso das Ilhas” de 27 de Abril de 2011

terça-feira, abril 19, 2011

Chegou a hora de pagar

Por todo o mundo a ilusão que se podia viver indefinidamente acima dos recursos caiu por terra com o início da Grande Recessão em Setembro de 2008. Os tempos das vacas gordas anteriores à crise tinham convencido muitos de que riscos associados a transacções financeiras podiam ser diluídos de tal forma que para todos os efeitos deixavam de existir. E que reformas necessárias para adaptar aos novos tempos e manter competitividade no mundo cada vez mais global de hoje podiam ser sistematicamente adiadas.

Cabo Verde deixou-se também embalar na ilusão particularmente quando nos últimos três anos antes da crise beneficiou do influxo de capitais estrangeiros. Acreditou que as coisas só iriam melhorar a partir daí e adiou o aproveitamento cabal das oportunidades oferecidas. Com o início da crise levou um tempo desmedido para reconhecer a realidade da nova situação global marcada pela contracção do comércio internacional, a redução brusca do investimento directo estrangeiro e a diminuição das remessas dos emigrantes.

Assim foi porque tudo se fez para manter a ilusão de que tudo estava bem pelo menos até às eleições legislativas e a renovação do mandato do partido no governo. Repetiu-se vezes sem conta que o país estava blindado contra a crise, endividou-se externamente o país para manter uma aparência de dinâmica e acusou-se a oposição de ser profeta da desgraça. Entretanto reformas ficavam por fazer, não se incentiva a nação a adoptar uma outra atitude perante os novos tempos, os défices orçamental e de contas correntes agravavam-se e a dívida pública aproximava-se perigosamente dos limites da insustentabilidade.

Antes da crise já havia sinais claros de que os preços dos cereais, do petróleo e de matérias-primas em geral estavam num processo de subida em consequência da forte procura de economias dinâmicas de países como Brasil, Rússia, Índia e China, os BRICs. A crise provocou a queda dos preços mas sabia-se que a retoma da subida verificar-se-ia assim que a economia mundial iniciasse a recuperação. Para um país como Cabo Verde era fundamental que particularmente na área de energia e água o país se preparasse para a alta dos preços de combustíveis que com certeza viria.

Mas a gestão da Electra continuou altamente politizada. Também não se fez uma ofensiva séria para envolver a sociedade na luta pela eficiência energética. E os investimentos nas energias renováveis, na ausência de uma estratégia própria, ficaram ao sabor das imposições de quem estendia as linhas de crédito. O resultado é que quando chegou o aumento dos preços dos combustíveis não havia como segurar as tarifas de água e energia. O Estado a braços com um défice orçamental de dois dígitos não tem condições de continuar a subsidiar.

As novas tarifas de água e energia certamente vão afectar a generalidade dos preços. O impacto no custo de vida das populações particularmente dos mais pobres e vulneráveis será significativo. E isso numa conjuntura actual de desemprego e pouca dinâmica económica que o Governo não está em condições de vir em socorro e a ajuda externa é cada vez menor. Tempos difíceis vêem ai, consequência de não se enfrentar os desafios no tempo próprio.

Editorial do Jornal Expresso das ilhas de 13 de Abril de 2011

segunda-feira, abril 18, 2011

Queda mágica do desemprego



O Primeiro Ministro em declarações aos jornalistas sobre o desemprego no dia 5 de Abril disse: “Vejam que os dados do Censo 2010 apontam para uma taxa de desemprego de 10,7 por cento. Quando, em todo o mundo, o desemprego está a aumentar (20 por cento em Espanha, 12 por cento em Portugal) Cabo Verde tem hoje uma taxa de desemprego de 10,7 por cento. É um ganho extraordinário”. Mais do que extraordinário parece ser um acto de magia extrair da cartola desemprego a cair para um dígito em cima de uma conjuntura internacional de crise e conjuntura nacional de mais de dois anos de crescimento anémico. Não validam também tal cenário de diminuição de desemprego os dados do INE publicados ontem, dia 11 de Abril. Os indicadores de conjuntura de sectores potencialmente criadores de postos de trabalho designadamente da indústria transformadora, turismo e construção civil, apontam para estagnação ou que­da, como se pode ver dos gráficos. Uma constatação em sintonia perfeita com o sentimento da população que as coisas não estão bem e que a vida está difícil. O estranho em todo isto é o Sr. Primeiro Ministro, mesmo depois de ter ganho as eleições, persistir em manter o país na ilusão de que se pode baixar o desempre­go sem crescimento acima do potencial e sem aumento expressivo da exportação de bens e serviços. Portugal devia servir-nos de exemplo do que acontece quando o ilusionismo dos governos impede que se tomem as medidas necessárias em tempo próprio. Aliás, o aumento do custo de vida em resultado da subida geral dos preços é já uma primeira mostra do que vai acontecer. Como nos outros países, serão os mais pobres e vulneráveis que irão pagar pelos défices orçamentais exa­gerados, pelo desequilíbrio persistente das contas correntes e pela incapacidade dos governos em fazer as reformas ne­cessárias no momento certo.

domingo, abril 17, 2011

Partidocracia?

Está a causar efeitos perversos nos partidos políticos o facto novo dos candi­datos ao cargo de presidente da república não condicionarem a continuidade da candidatura ao apoio explícito do parti­do. Nas declarações de vários dirigentes e nos comentários histriónicos online vê-se qual foi o impacto da decisão do Dr. Aristides Lima em manter-se na cor­rida presidencial no PAICV. A máquina partidária, seguindo as instruções da li­derança, está a mover-se agressivamente para disciplinar o voto dos militantes, condicionando fortemente as escolhas dos cidadãos numa matéria que ultrapassa os partidos. Eleições presidenciais são suprapartidárias e os candidatos não têm programas de governação. Por isso, para um militante, simpatizante ou eleitor de um partido, a partir do momento em que um candidato se situa num quadrante político de seu agrado, o que realmente passa a contar são os aspectos do currí­culo, do carácter e do temperamento da pessoa. Naturalmente que os partidos enquanto organizações têm o direito de dar aval a este ou aquele candidato. Mas é de se lembrar que a decisão do aval é fundamentalmente da direcção conjuntural do partido. Não resulta de um escrutínio interno próprio através de “primárias” em que cada membro do partido se expressaria através do seu voto. E assim é porque, apesar da importância do cargo de presidente da república, a eleição de um ou outro candidato não é vital para a actuação do partido, esteja o partido no governo ou na oposição. Só nos sistemas presidenciais ou semi-pre­sidências do tipo francês é que o cargo é partidário e aí, de facto, os procedimentos são outros e a atitude esperada dos mi­litantes alinha-se pela do partido. Não sendo o caso, mostra-se abusivo tratar os candidatos sem o aval do partido e os seus apoiantes como dissidentes merecedores de oposição sistemática, se não mesmo, de ostracismo. Partidocracia não é o que se quer. A natureza suprapartidária do cargo do PR deve ser perservada. Do presidente da república não se espera que seja conivente com o governo ou que faça ou lidere a Oposição. Para evitar cair-se na tentação de desvirtuar as competên­cias do cargo num sentido ou noutro, os partidos devem ser contidos no apoio a dar aos candidatos e absterem-se de mo­nopolizar o discurso político e polarizar segundo linhas partidárias as eleições presidenciais.

sábado, abril 16, 2011

Tempo para corrigir anomalias

Notícias postas em circulação dão conta que o Conselho de Administração da Assembleia Nacional já decidiu trilhar o caminho da austeridade. Do Governo deve ter recebido dados e indicações do orçamento do “aperto do cinto” em preparação e, sem delongas, adiou um conjunto de investimentos para o ano 2012. A preocupação com os custos não impede porém que se insista em ter um terceiro Secretário e que a Mesa goze de regalias não instituídas em sede do estatuto remuneratório de titulares de cargos políticos. O parlamento tem dois grupos parlamentares, cada um com o seu vice-presidente e seu secretário. Como a Constituição só prevê dois vice-presidentes, em existindo um terceiro ou quarto grupo parlamentar a presença deles na Mesa seria assegurada pelo 3º e 4º secretários. As regras de proporcionalidade não garantem um 3º ao Paicv e só a prepotência da maioria é que o justifica. Os custos inerentes em carro, motorista, secretária, gabinete e subsídios ultrapassam os dois mil contos anuais. E assim é porque a A N resolveu interpretar uma lei de 1986 referente aos estatutos da então Assembleia Nacional Popular que equiparava regalias de membro de Governo às dos membros da Mesa. O resultado foram custos excessivos em vários milhares de contos que colocam a remuneração dos membros da mesa muito acima dos restantes deputados. Em 2008 chegou-se ao desplante de se aumentar os subsídios de renda de casa em conformidade com um decreto-lei do governo que os estipulava para os membros do governo. Uma medida aliás de duvidosa constitucionalidade porque nela o governo altera o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, matéria de competência absolutamente reservada da A N. Entretanto recusa-se a pagar aos deputados residentes fora da Praia despesas de transporte e correspondentes ajudas de custo para ter presença efectiva no Plenário e nas reuniões das comissões especializadas. Continua-se indevidamente com a pressão para os deputados passarem a residir na Capital, sacrificando no processo a diversidade de experiência e de vivências que os deputados vindos das ilhas e do interior de Santiago trariam ao parlamento na ponderação de todos os aspectos da vida da nação. Sem falar nos custos vários impostos aos deputados e seus familiares directos. Para a redução das despesas certamente que, em querendo, muitas outras formas poderão ser encontradas. Mas não é sacrificando a razão de existência do parlamento que é o trabalho do deputado feito em condições de liberdade e total disponibilidade que se consegue isso. Muito pelo contrário. A instituição tende nas circunstâncias a murchar e a tornar-se uma simples câmara de eco do governo: muda, cega e surda e só livre para bater palmas a quem tem o Poder.

sexta-feira, abril 15, 2011

Má governação



Na sexta-feira o sr. Primeiro Ministro presidiu a uma cerimónia de entrega de botes a cinco pescadores da zona do Brasil na Achada de Santo António. Um milhão e setecentos mil escudos do dinheiro do Estado foram aplicados na compra dos botes e de material de pesca. A doação do Estado foi feita à associação dos pescadores do Brasil na pessoa do seu presidente, que por sinal é deputado do PAICV à Assembleia Nacional. Ele, em declarações à RTC não teve rebuços em dizer que os pescadores contemplados foram escolhidos a dedo. Talvez por isso que, nas imagens da cerimónia, via-se que todos os botes ostentavam a sua estrela negra a confirmar a militância de quem recebia dádiva do Estado. E certamente que todo o aparato ali montado visava passar uma lição a todos: os que alinham com o PAICV serão escolhidos a dedo para receber benesses do Estado. Os outros ficam na situação de cidadãos de segunda classe até se converterem. A presença do PM em cerimónia dessas sanciona tais práticas despudoradas de subordinação das populações mais pobres a interesses partidários. A cobertura pelos meios de comunicação estatais ao torná-la acontecimento nacional assegura que a lição é assimilada e transportada a todos os pontos do país.

quarta-feira, abril 13, 2011

Partidarização das presidencias

O cargo de presidente da república na constituição de Cabo Verde é supra partidário. Eleito por sufrágio directo e universal o presidente da república é a par com a Assembleia Nacional os dois órgãos de soberania que gozam de legitimidade directa do povo. Mas o presidente não governa. A governação é sempre partidária e emana directamente do parlamento que o fiscaliza e controla e perante o qual é politicamente responsável. Ao PR é reservado o papel de árbitro e moderador do sistema político e o cumprimento desse papel juntamente com o de defensor da ordem constitucional exige um postura não condicionada pelas as acções, posicionamentos e opções políticas do governo. O PR não deve ser um apêndice do Governo nem também deve constituir-se em oposição. A partidarização do cargo traz consigo a tentação do PR se colocar num ou noutra posição. Se provém do mesmo quadrante político tende a acomodar-se ou a alinhar com as medidas do governo. Vindo de quadrante diferente a pressão para intervir é maior particularmente se o governo depara-se com problemas políticos graves designadamente de perda de maioria parlamentar. Na última revisão constitucional houve a preocupação de separar por período de seis meses as eleições presidenciais e legislativas, precisamente para evitar o efeito de contágio das eleições partidárias sobre as não partidárias. A opção dos agora chamados pré-candidatos em esperar pelo apoio explícito do partido para avançarem, ou seja deixarem-se seleccionar pelo partido, curto-circuitou completamente as alterações feitas na Constituição em 2010. Mais do que nunca as eleições presidenciais vão ser partidarizadas. Do lado do PAICV o objectivo de se instituir um triunvirato que concretize a “colaboração governo, parlamento e presidência” proposta no programa do Governo é por demais evidente. A pressa desconcertante do MpD em escolher um candidato sugere dinâmicas internas que certamente esperam sair beneficiadas em caso de vitória. O engajamento dos partidos nas eleições geralmente conduz a cumplicidades com o PR eleito que num momento ou outro afectam a sua relação com o Governo. A ampla maioria ganha pelo presidente Mascarenhas Monteiro e o facto de não ter surgido das fileiras do MpD deu-lhe mais espaço de manobra para ser árbitro e moderador. Mesmo assim não ficou imune às tensões internas do MpD particularmente nos momentos de enfraquecimento da maioria parlamentar. O Presidente Pedro Pires iniciou a sua magistratura com legitimidade enfraquecida pelos 12 votos de vantagem que posteriormente vieram a ser considerados como fraudulentos pelos tribunais. Só no segundo mandato é que veio a exercer o poder do veto e a solicitar fiscalização preventiva da constitucionalidade de diplomas do governo. No início da terceira década da democracia caboverdiana ainda está-se por dar conteúdo constitucional completo ao cargo de Presidente da República. O peso dos partidos em determinar os protagonistas e em definir o quadro de campanha não deixa muito espaço para se afirmar uma candidatura que realmente realize na totalidade a figura constitucional de presidente da república. Mas a procissão ainda está no adro. A ver vamos.

terça-feira, abril 12, 2011

Ponto de partida

Flashes do Programa do Governo

Desfocagem

“Dados do INE relativos a 2008 indicam que a taxa de desemprego entre a camada com educação liceal e universitária é superior à média nacional”.

Quem semeia ventos…

“Os Cabo-verdianos esperam mais do governo agora”. “(…)Isto tornase num desafio num ambiente de recursos limitados do governo e da iminente possibilidade de redução das ajudas públicas ao desenvolvimento”

Surpresa?

“Ao invés do esperado crescimento acima dos 10 por cento, devido ao orçamento de investimento, o desempenho do crescimento projectado para 2009 e 2010 foram de aproximadamente 4 e 5.5 por cento, respectivamente”.

Economia de renda

“Juntos as remessas e ajuda ao desenvolvimento representam mais do que um terço do PIB e uma parte significativa dos esforços de desenvolvimento”

Cair no real!

“O facto é que sem se construir uma economia dinâmica e inovadora nada mais pode ser conseguido realisticamente”.

Confissão I

“A redução da dependência na ajuda e os fluxos externos em general apenas será possível se pudermos expandir a base produtiva da nossa economia, aumentar a produtividade e melhorar a competitividade”.

Confissão II

“O crescimento económico criou empregos mas não em número suficiente. Na verdade, um dos desafios chave que a economia enfrenta é a capacidade de criação de empregos com salários de níveis médio a alto”

Confissão III

“Mas não poderemos fazer isso com um sistema de ensino de segunda categoria. Não poderemos ter sucesso com um sistema educativo ou uma sociedade que promove a mediocridade”.

Improvisos

“O único recurso que possuímos, e possuímos em abundância é o mar. “(…) Pretendemos igualmente construir uma economia do conhecimento em torno do cluster do mar”.

segunda-feira, abril 11, 2011

Poder e Responsabilidade

Foi entregue, ontem, dia 5 de Abril, na Assembleia Nacional o Programa do Governo para a Legislatura. Os deputados têm 15 dias para o discutir e aprovar com maioria absoluta a moção de confiança que irá permitir ao Governo começar de facto a governar. O voto da maioria dos deputados sela o compromisso que o Governo escolheu assinar com a Nação quanto aos objectivos e metas a atingir até o fim da legislatura.

No programa do Governo consta a avaliação que faz da situação do país e do meio envolvente internacional, há a identificação dos principais constrangimentos e a definição do que o governo se propõe atingir. Define-se a estratégia a seguir e descrevem-se as principais medidas de política que irão assegurar que o prometido será cumprido. A matriz do programa do governo, como bem o diz o Sr. Primeiro Ministro, é a plataforma eleitoral do PAICV sufragada nas urnas.

A clarificação de onde vem o programa, quem o apresenta e quem o vota favoravelmente é fundamental para se saber a quem exigir responsabilidade por eventuais falhas ou incumprimentos. Na legislatura passada a promessa dos dois dígitos no crescimento do PIB e de desemprego abaixo de dois dígitos não foi cumprida e quem de direito não quis responsabilizar-se por isso. Na semana passada, foi notícia, quando finalmente o governo de Cabo Verde aceitou que tinha falhado.

A ética de responsabilidade não deixa que se fique pelas intenções. São os resultados que realmente contam. O exercício do Poder em democracia pressupõe prestação de contas aos governados e assunção de responsabilidades. O programa do Governo tem que ter elementos que permitem que a implementação do mesmo seja avaliado em termos qualitativos e quantitativos. Não cola a declaração do Primeiro Ministro ao programa que "não vale a pena fixar números". O programa do Governo não é um cheque em branco. Tem que ser um instrumento útil de fiscalização e de responsabilização da acção do governo ao longo de toda a legislatura.

O programa do governo não pode ser de co-responsabilidade do governo e da sociedade civil como se pretende sugerir. É o instrumento de responsabilização de um governo em particular. O exercício mediático de convidar contribuições avulsas de cidadãos não retira ao governo a responsabilidade única pelo programa apresentado nem faz dos participantes co-responsáveis pela sua execução, não execução ou execução defeituosa.

A apologia de consensos não deve ser pretexto para se diluir responsabilidades. Consensos sob a batuta de uma matriz programática única brigam com o pluralismo, esvaziam dinâmicas criativas e inovadoras e adiam o surgimento de alternativas de pensamento e acção.

A democracia parece cara e ineficiente porque discute-se, confronta-se e exploram-se alternativas diversas. A História, porém, prova que dispendiosos são, de facto, os regimes únicos, os consensos impostos e as utopias sedutoras. Uma lição que a vaga de democracia no mundo árabe nos relembra neste preciso momento. Hoje, como todos, eles querem também escolher os seus governantes e exigir responsabilidades pelos resultados da governação.

Editorial do jornal "Expresso das Ilhas" de 6 de Abril de 2011

domingo, abril 10, 2011

Democracia: consolidação difícil

As transições árabes para além da autocracia e, espera-se, em direcção à democracia trazem outra vez ao de cima discussões sobre liberdade, cidadania e constitucionalismo. Todos observam os caminhos que cada um deles está a seguir e procura-se avaliar as probabilidades de sucesso. Estudiosos da democracia como Michael Mandelbaum, no seu livro “Democracy´s Good Name”, dizem que para a instalação e consolidação da democracia concorrem três factores: 1- cidadãos, ou seja pessoas que se vêem como parte de uma nação indiferenciada onde qualquer individuo pode ser governante ou governado, 2- auto determinação, querendo dizer que os governos são escolhidos por voto livre e plural; 3- Liberdade, englobando rodas as regras e limites postos ao governo e aos actos de governação nos diferentes domínios, designadamente político, judicial, económico e religioso. A presença desses factores em maior ou menor grau em cada um desses países árabes vai determinar em grande medida o desfecho das mudanças em curso. Já alguns analistas notam que em países com sentido nacional e de cidadania como Tunísia e Egipto as coisas tendem a correr bem enquanto na Líbia e no Iraque o enfraquecimento do punho de ferro do ditador faz renascer conflitos étnicos, religiosos e tribais. A transição democrática em Cabo Verde nos primeiros anos 90 processou-se sem grandes sobressaltos mas iludiu questões e deixou sequelas que de um modo ou outro se fazem sentir e dificultam a consolidação do novo regime. A condição de cidadãos plenos como definida por Mandelbaum tem sido prejudicada por dinâmicas divisivas. Há gente que se apoia no local de origem para recusar a naturais de outras ilhas o direito de posicionarem-se para altos cargos da República. Há quem exija tratamento preferencial no governo por razões de suposto peso político da ilha como se a distribuição de pastas ministeriais se submetesse a lógicas locais. Também divisivo é a extrema partidarização da função pública e o privilégio dadas a uns no acesso a empregos, bolsas de estudo e outros bens públicos com base no cartão de militante de partido. Com manobras de exclusão, assim se criam cidadãos de 2ª classe num país, à partida, sem fracturas étnico-linguísticas ou religiosas. Quanto à auto-determinação de que fala Mandelbaum verifica-se que tem sofrido erosão sob o impacto de um conjunto de acções, já constatadas designadamente pela Comissão Nacional de Eleições, que esvaziam muitos do seu direito de votar e escolher os seus governantes: o recenseamento menos que perfeito e não abrangente do universo dos cidadãos votantes; as falhas inexplicáveis que deixam muitos fora do caderno e que fazem desaparecer outros que lá estiveram; a boca de urna e as múltiplas tentativas de intimidação, de impedimento de voto e de compra de consciências. O terceiro factor, a construção da liberdade, constitui para Mandelbaum a tarefa mais difícil no processo de consolidação da democracia. Sucesso aí significa que o Governo já interioriza que o exercício do Poder nunca é absoluto. E que encontra limites designadamente nos direitos fundamentais, no princípio de separação interdependência dos poderes, no respeito estrito pela Constituição e pelas leis, no respeito pelo pluralismo, na independência dos tribunais e na autonomia do Poder local. È evidente que o actual Governo e o partido que o suporta estão longe de lá chegar. Mais, positivamente não estão para aí virados. É só ver os esforços em curso na promoção da “democracia do consenso”, a democracia sem conflitos mas também sem alternativas que até lembra a democracia orgânica e sem partidos de Salazar. Tentações de desvio não faltam no inicio da terceira década da democracia caboverdiana. Evita-se cair na tentação fazendo da luta pela Liberdade, pelo pluralismo e pela cidadania plena a coluna vertebral de toda a participação cívica e política. Para que não sejam necessários momentos libertadores como o 25 de Abril, o 13 de Janeiro e os actuais vividos na revolução árabes.

quarta-feira, abril 06, 2011

Democracia do consenso

Flashes do Programa do Governo

Imposição

“Terá de haver um consenso entre os partidos políticos, o parlamento, o governo e a presidência [da república] sobre onde estamos e onde vamos.”

Única via

“O consenso e a colaboração entre todas as partes interessadas nacionais chave são a única maneira de fazer face ao desafio levantado pela situação difícil externa”.

Matriz

A plataforma do PAICV sufragada pelo povo constitui a matriz programática para a Governação(…)”. “(…)a elaboração do Programa de Governo é um momento importante, de participação e debate, num processo partilhado e da responsabilidade de todos.

Permitido

“Os partidos podem competir sobre ideias. Podem competir a muitos níveis mas nós temos de estar unidos sobre onde queremos chegar (…)”

Nada de ilusões

“(…) o desenvolvimento e a transformação genuína não podem ser oferecidos pelo governo ao povo”.

Culpar o governo?!

“A democracia e o desenvolvimento são co-responsabilidade do governado e do governo”.

Metodologia

Engajaremos o povo, as organizações da sociedade civil e o sector privado. A colaboração será maior do que o diálogo.

Papel das câmaras municipais

“Têm de estar na mesa quando os problemas são definidos, os objectivos estabelecidos, as estratégias formuladas e os planos de acção propostos de modo a que possam ser entusiásticos membros da equipa aquando da implementação