Por todo o mundo a ilusão que se podia viver indefinidamente acima dos recursos caiu por terra com o início da Grande Recessão em Setembro de 2008. Os tempos das vacas gordas anteriores à crise tinham convencido muitos de que riscos associados a transacções financeiras podiam ser diluídos de tal forma que para todos os efeitos deixavam de existir. E que reformas necessárias para adaptar aos novos tempos e manter competitividade no mundo cada vez mais global de hoje podiam ser sistematicamente adiadas.
Cabo Verde deixou-se também embalar na ilusão particularmente quando nos últimos três anos antes da crise beneficiou do influxo de capitais estrangeiros. Acreditou que as coisas só iriam melhorar a partir daí e adiou o aproveitamento cabal das oportunidades oferecidas. Com o início da crise levou um tempo desmedido para reconhecer a realidade da nova situação global marcada pela contracção do comércio internacional, a redução brusca do investimento directo estrangeiro e a diminuição das remessas dos emigrantes.
Assim foi porque tudo se fez para manter a ilusão de que tudo estava bem pelo menos até às eleições legislativas e a renovação do mandato do partido no governo. Repetiu-se vezes sem conta que o país estava blindado contra a crise, endividou-se externamente o país para manter uma aparência de dinâmica e acusou-se a oposição de ser profeta da desgraça. Entretanto reformas ficavam por fazer, não se incentiva a nação a adoptar uma outra atitude perante os novos tempos, os défices orçamental e de contas correntes agravavam-se e a dívida pública aproximava-se perigosamente dos limites da insustentabilidade.
Antes da crise já havia sinais claros de que os preços dos cereais, do petróleo e de matérias-primas em geral estavam num processo de subida em consequência da forte procura de economias dinâmicas de países como Brasil, Rússia, Índia e China, os BRICs. A crise provocou a queda dos preços mas sabia-se que a retoma da subida verificar-se-ia assim que a economia mundial iniciasse a recuperação. Para um país como Cabo Verde era fundamental que particularmente na área de energia e água o país se preparasse para a alta dos preços de combustíveis que com certeza viria.
Mas a gestão da Electra continuou altamente politizada. Também não se fez uma ofensiva séria para envolver a sociedade na luta pela eficiência energética. E os investimentos nas energias renováveis, na ausência de uma estratégia própria, ficaram ao sabor das imposições de quem estendia as linhas de crédito. O resultado é que quando chegou o aumento dos preços dos combustíveis não havia como segurar as tarifas de água e energia. O Estado a braços com um défice orçamental de dois dígitos não tem condições de continuar a subsidiar.
As novas tarifas de água e energia certamente vão afectar a generalidade dos preços. O impacto no custo de vida das populações particularmente dos mais pobres e vulneráveis será significativo. E isso numa conjuntura actual de desemprego e pouca dinâmica económica que o Governo não está em condições de vir em socorro e a ajuda externa é cada vez menor. Tempos difíceis vêem ai, consequência de não se enfrentar os desafios no tempo próprio.
Editorial do Jornal Expresso das ilhas de 13 de Abril de 2011
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