quarta-feira, março 07, 2012

Poder Local: escolhas por fazer



Nº 536 • 07 de Março de 2012
Editorial:
As eleições autárquicas já se aproximam e os partidos políticos finalizam o processo complexo de seleccionar o candidato ao cargo de presidente da câmara. Depois virão a constituição das listas, o traçar das estratégias eleitorais e a mobilização da máquina partidária para suportar o candidato. Curioso é que, depois de poucos meses atrás se ter insistido numa ideia de cidadania que não se esgota nos partidos políticos, a grande oportunidade de grupos de cidadãos participarem na gestão autárquica não esteja a ser aproveitada. As autárquicas de 2012 serão a sexta eleição desde a restauração do municipalismo cabo-verdiano. Após as primeiras eleições realizadas em 1991, muitas esperanças foram colocadas no poder local. Pensou-se que podia ser o cadinho onde a experiência democrática seria mais imediata, mais efectiva e mais gratificante. Tais esperanças não viriam a realizar-se em pleno. A experimentação autárquica, primeiro em 14 municípios e actualmente em 22, não deixou porém de ser rica e de trazer ganhos significativos para a organização do espaço municipal, para a prestação de serviços indispensáveis e para o bem-estar geral e auto estima dos munícipes. O reviver da autoridade local não conseguiu pôr travões suficientes ao abandono e degradação das questões municipais dos primeiros quinze anos da independência. Vê-se isso na forma caótica, quase por inércia, que os principais centros urbanos do país continuaram a crescer, na evidente falta de civismo e na persistência de uma administração ainda pouco prestável e facilitadora. Talvez os desafios colocados pelo crescimento rápido da economia nos anos seguintes não deixou muita margem aos novos autarcas para se debruçarem sobre os graves problemas herdados. Em consequência, desenvolveu-se um estilo de actuação em que “fazer” sobrepunha-se ao “planear” e a centralização de poderes era a tentação óbvia. Falhas outras, designadamente no aproveitamento das oportunidades e no desenvolvimento das potencialidades locais, devem-se ao facto de se terem transformado as autarquias num campo de disputa entre o governo e a câmara municipal. A cooperação entre os serviços desconcentrados do estado e os municípios foi prejudicada e no terreno surgiram organizações sociais financiadas pelo governo a rivalizar com as câmaras na prossecução de competências municipais. Todos esses embates desnecessários causaram ineficiências na utilização de recursos e perda de eficácia na concretização de objectivos de desenvolvimento. Reclama-se muito que a sociedade civil, seja local ou nacional, tarda a tornar-se autónoma e actuante. Certamente que contribui para essa inibição o elevado grau de conflitualidade política existente. Também não ajuda a centralização de iniciativa e de decisões tanto a nível central como local e o insuficiente esforço em motivar e facilitar protagonistas locais. Muitas dificuldades encontradas na selecção de candidatos compreendem-se pela estrutura do poder excessivamente personalizada que os presidentes de câmara acabam por construir para assegurarem o mandato e a posterior reeleição. Sendo quase pessoal, o Poder não é facilmente transferível. Devido a isso os partidos vêem-se apanhados numa armadilha: por um lado, têm dificuldades em renovar candidatos e em preparar eventuais sucessões; e, por outro, arriscam-se a perder as suas câmaras quando finalmente o titular desiste ou torna-se impossível reelegê-lo. O engajamento dos municípios no aproveitamento das vocações das ilhas e em torná-las competitivas é fundamental para o desenvolvimento equilibrado do país. Para que isso aconteça, há que mudar atitudes na governação do país. Opções como concentração na captação de fluxos externos e manutenção da lógica de redistribuição de acordo com critérios de poder devem ceder lugar ao engajamento com a economia mundial via exportação de bens e serviços. Se a mudança não for feita, irá manter-se o status quo: a centralização, a guerrilha política no palco municipal, a sociedade civil murcha e as disparidades entre as ilhas. O sucesso numa nova orientação, pelo contrário, implicaria o soltar das energias e uma motivação superior das pessoas e comunidades. Precisamente o que se pretende para garantir que todas as ilhas e recantos do país tenham a oportunidade de prosperarem e contribuíram para o progresso do todos.

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