segunda-feira, dezembro 24, 2012

Natal com alegria verdadeira



 
 Nº 578 • 24 de Dezembro de 2012
Editorial: Natal com alegria verdadeira
O Natal é já amanhã. Todos os anos, com o aproximar da época natalícia, a atitude das pessoas muda. Há maior aproximação fami­liar, nota-se uma maior preocupação com os outros e uma sensação de paz e alegria que se instala. Há quem diga que o Natal suste-se sob os pilares da religião, da infância e da caridade. De facto em antecipação aos festejos do nascimento de Jesus, o Menino-Deus, a atenção vira-se para os filhos e para as crianças em geral e há maior predisposição para a solidariedade sem rosto.
Para muitos, o espírito do Natal está nesse dar sem esperar con­trapartida. Quando deixa de ser isso e passa a ser essencialmente uma época de troca de prendas perde-se alguma coisa. “Dar” e “receber” ficam no mesmo plano, comparam-se valores trocados e, não poucas vezes, por causa disso em vez da alegria e harmonia esperada no momento de celebração do Natal e de abertura de prendas perduram ressentimentos e conflitos. Boa parte da crítica às tentativas de fazer do Natal uma data simplesmente comercial tem a ver com o consumismo desenfreado que o desvirtuamento dos valores do “dar” provoca.
Em Cabo Verde nem o Natal com a sua mensagem de solidarie­dade e generosidade consegue que se desvie uma vírgula do ritual entre doadores e recipientes protagonizado em grande destaque todos os dias nos órgãos da comunicação social. Assim, a par dos espectáculos habituais de distribuição de cestas básicas, lâmpadas de pouco consumo, kits escolares, escovas de dentes, etc., introdu­zem-se prendas de Natal e festas para crianças e idosos onde quase sempre pontificam membros do governo. É evidente para quem assiste a essas cenas diárias que os principais beneficiários desses actos são os “supostos” doadores, muitas vezes intermediários de benfeitores anónimos. Como também é evidente a reprodução do espírito de dependência e a humilhação dos recipientes manifesta nas palavras de gratidão que pronunciam aos microfones solícitos da comunicação social. A falta de caridade e de solidariedade nesses rituais fere profundamente o espírito de Natal e é contra tudo o que ele representa.
O Natal é claramente uma festa civil e religiosa. É virada para a família, para a comunidade e para o divino. A política e o Estado deviam manter uma distância respeitável. Em Cabo Verde acontece o contrário. É o momento de se multiplicarem as aparições de membros do governo em particular do Sr. Primeiro-ministro na comunicação social em encontros diversos com vários grupos de vulneráveis e com crianças. Segundo o site do governo criam-se “momentos reconfor­tantes que ajudam a retemperar as forças e trazem maior inspiração para que o Chefe do Executivo continue a trabalhar em prol do bem comum”. Espera-se provavelmente que no Natal, a Nação faça as suas preces para que o PM continue inspirado.
A omnipresença da política e do Estado em tudo transmite uma sensação de sufoco. Não é por menos que se diz que a sociedade civil em Cabo Verde ainda está por se afirmar. Todas as iniciativas para serem levadas avante ou ganharem visibilidade têm que conseguir algum alto patrocínio de figuras cimeiras da república. Há dias viu-se como o festival de Ribeira da Torre de homenagem a Cesária Évora coincidiu com vários lançamentos de pedra, inaugurações e proclamações do governo. Ainda bem que na cacofonia criada ainda se falou da CIZE.
Comporta-se como se nada existisse para além da política. E isso inibe a iniciativa dos indivíduos, desencoraja a inovação e provoca desmotivação geral. Quando a política está em todas as actividades económica, social e cultural e faz-se com crispação e polarização de posições, há muitos que optam por não serem apanhados no fogo cruzado. Outros, provavelmente menos criativos e ousados, aproveitam as oportunidades abertas pelo status quo. De qualquer forma muito da dinâmica possível perde-se no processo.
É preciso deixar espaço para as pessoas e para a sociedade. Como diz o Papa Bento XVI, há que festejar o Natal com “a paz, a vida e a alegria verdadeira”.
O Expresso das Ilhas deseja a todos um Feliz Natal. Boas Festas.

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