quarta-feira, abril 17, 2013

Não repetir os erros do passado



“Fornecimento de energia e água com qualidade e a custos baixos é essencial para a melhoria do ambiente de negócios e das condições sociais”. Este é um dos vários conselhos dados pelo FMI no final da missão de Novembro de 2012 para se ultrapassar a situação actual de crescimento raso, o aumento do défice das contas correntes e o endividamento a aproximar-se dos limites da sustentabilidade. O relatório do FMI (WEO) publicado ontem baixava em 0,3% a previsão de crescimento para 2013 e alargava o défice de contas correntes de -8,9% para -13,2% do PIB.


Infelizmente o documento do FMI que trazia essa e outras recomendações ainda não foi publicado porque, segundo a ministra das Finanças, em declarações à rádio nacional, o governo não o autorizou. Supostamente continha erros nos cálculos da dívida externa. O Governo, com esta estória de erro nos dados, procura de facto minimizar o impacto da baixa do rating de Cabo Verde feita pela empresa de notação financeira Fitch. Imagine-se a felicidade dos gregos, portugueses,cipriotas e outros se pudessem dizer o mesmo e mudar a realidade vivida.


A fraca competitividade do país em vários sectores de actividade resulta em grande medida dos custos excessivos de energia e água. Uma década de uma gestão desastrosa do sector de energia e água deixou comparativamente o país com tarifas das mais altas entre os países da África. As famílias e as empresas tiveram que lidar anos a fio com blackouts sucessivos, imprevisíveis e duradoiros. Foram obrigados a arcar com os custos da baixa qualidade e falta de garantia de fornecimento contínuo adquirindo geradores e substituindo equipamentos e electrodomésticos danificados por variações bruscas de tensão. Enquanto tudo isso acontecia, assistia-se ao espectáculo protagonizado pelas autoridades de escolher em quem deitar as culpas na sequência de mais um apagão ou período de semanas sem água.


Na próxima semana, o Governo leva à Assembleia Nacional o debate sobre o sistema energético. Provavelmente considera que o momento é ideal para mostrar que colocou o país num caminho seguro para a resolução dos problemas de energia. O discurso oficial põe enfase nas taxas de penetração das renováveis, ontem de 25%, hoje de 50% e até já se fala de 100%. Mas, como em muitos desses investimentos feitos com recurso a crédito externo, a relação custo/benefício não é a melhor como é notório no caso das centrais solares de Santiago e do Sal. O facto é que mesmo com infusão da energia eléctrica a partir dos aerogeradores ainda não houve abaixamento do preço e o custo no consumidor do KWh, à volta de meio dólar, continua dos mais altos do mundo.


Quando se vê a situação actual da Electra com a sua reputação abalada junto do público e constituindo pelo volume das suas dívidas um risco orçamental, convém lembrar do que se deve evitar na governação do país e na gestão da coisa pública. Primeiro, há que fugir à tentação de transformar sectores chaves da vida do país em campos de batalha ideológicos em que se deixam soltos sentimentos neonacionalistas e anti-privatizações. Segundo, os investimentos devem ser programados de forma a serem feitos em tempo próprio, encadeados para terem maior impacto e submetidos a uma estratégia com objectivos bem definidos. Terceiro, a responsabilização pelo andamento do processo e pelos resultados deve ser assumido por quem de direito não deixando vazios de orientação que deitam a perder o capital humano e organizacional acumulado e sentido de pertença e orgulho dos trabalhadores.


O mundo da energia ainda traz muitas surpresas: quando se pensava que o preço dos combustíveis fósseis seria só a subir, inovações tecnológicas como o fracking, a extracção do gás natural das rochas xistosas, dão-lhes nova vida. Aumenta a oferta, baixam os preços, aparecem novos produtores e mais longo e árduo se torna o caminho para a implantação das energias renováveis. Cabo Verde, pelo potencial em energia eólica e nível de irradiação solar existente, tem um futuro nas energias renováveis. Importa agora, com uma rede inteligente “smart grid” e com a promoção de atitudes e regulações viradas para a eficiência energética, criar condições para que apareçam novos operadores e soluções inovadoras. Soluções que contribuam para que a energia chegue a todos a um preço aceitável e seja um factor de competitividade do país.


Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 17 de Abril de 2013

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