No jogo da bolha também conhecido por jogo de pirâmide ou esquema de Ponzi o dinheiro de novos “entrantes” alimentam as extraordinárias mais valias ganhas pelos já lá estavam antes. A bolha estoura quando ninguém mais põe dinheiro suficiente para garantir os juros elevados pagos aos outros. Uma coisa é sempre certa nesse tipo de jogo: há uns poucos ganhadores que são os que montaram o esquema e aliciaram outros a participar. Perdedores são muitos e são aqueles que se deixaram apanhar na miragem de lucros fáceis e fartos. A crise financeira que lançou o mundo na Grande Recessão teve na sua origem em algo que, segundo o economista Paul Krugman, assemelha-se a um “gigantesco esquema de Ponzi”. Alguns faziam muito dinheiro à medida que muitos outros lançavam-se a comprar casas acima das suas posses, seduzidos pela subida aparentemente imparável do valor comercial das mesmas. Sabe-se o que aconteceu quando o mundo real bateu à porta e muitos deixaram de poder pagar as amortizações mensais. Tudo veio abaixo. Um outro esquema que apresenta bastantes semelhanças com o “jogo da bolha” é o modelo preferido do PAICV de desenvolvimento com base na ajuda externa. Sustentam o jogo a cooperação externa, a ajuda orçamental, os programas de instituições internacionais como o Banco Mundial. Os programas de ajuda em doações ou empréstimos, ao longo do tempo, vão se justificando com os avanços, muitas vezes aparentes, nos índices de desenvolvimento e de governança e na modernização e competitividade da economia. Mas raramente há retorno adequado dos investimentos seja em emprego, seja em crescimento. A realidade é que ano após ano a situação das populações não muda significativamente, a desigualdade social aumenta e a disparidade entre o campo e as cidades, em particular a cidade Capital, acelera. Á volta do Estado/gestor da ajuda cresce uma elite cúmplice e engajada em perpetuar a situação de dependência das populações porque é nessa gestão que reside a fonte dos seus rendimentos e do seu poder. Entretanto pelo país proliferam, como num cemitério, marcas deixadas por projectos sucessivos da cooperação externa sem que resultados práticos, perenes e sustentáveis sejam visíveis nas comunidades, nas famílias e nas pessoas. Elefantes brancos resultantes de investimentos feitos mais por razões de prestígio e de expedientismo político do que por razões de natureza económica e estratégica completam o quadro. A economista zambiana Dambisa Moyo ilustra muito bem essa questão no seu livro “Dead Aid”. O problema com tais esquemas é que, a exemplo de todos os jogos da bolha, o estouro final acaba sempre por acontecer. Assim, da fase de doações passa-se à da dívida concessional e posteriormente à dívida comercial que poderá, rapidamente, revelar-se incomportável e dar origem à reestruturação da dívida soberana com todas as suas consequências. Os sinais, que se está a chegar ao limite, notam-se nas dificuldades crescentes em conseguir financiamentos nas condições anteriores. Cabo Verde está queimar os seus últimos cartuchos com as linhas de créditos conseguidas de Portugal. Os investimentos feitos falharam em criar emprego a curto prazo e mostram-se duvidosos em termos de proporcionar crescimento a médio, longo prazo. Contribuíram porém para se ultrapassar os limites do endividamento sutentável e o FMI já extraiu do Governo do PAICV a promessa de que 2011 vai ser o ano do apertar do cinto. Como em todos os momentos em que a “bolha” rompe-se, sofrem os mais os pobres e vulneráveis. O Governo finge não saber da situação difícil do país e do contexto internacional também difícil que vai ser o ano 2011 com a subida do preço do petróleo, dos cereais e dos minérios. Segundo o jornal Financial Times da segunda-feira , calcula-se que o aço em 2011 vai sofrer um aumento de 66%. Com todos estes dados, o PAICV, em tempo de eleições, promete “mais do mesmo” como se nada estivesse a acontecer. Simplesmente para se agarrar ao Poder por mais cinco anos.
quinta-feira, janeiro 27, 2011
Jogo da "bolha"
Progresso. Como avaliá-lo?
"Dicas" do Presidente Barack Obama no discurso do Estado da União de 25 de Janeiro de 2011 (tradução livre)
“Estamos já prontos para o progresso. Dois anos após a pior recessão dos nossos tempos a Bolsa de Valores voltou à alta. Os lucros das empresas aumentaram. A economia está a crescer novamente.
Mas nós nunca avaliamos progresso só com essas medidas. Avaliamos progresso pelo sucesso do nosso povo. Pelos postos de trabalho que podem encontrar e a qualidade de vida que esses empregos podem oferecer. Pelas possibilidades de sucesso de um pequeno homem de negócios que sonha transformar uma boa ideia numa empresa florescente. Pelas oportunidades de uma vida melhor que legamos às nossas crianças”.
quarta-feira, janeiro 26, 2011
Sanha contra os anos 90
A governação da década de 90 é sistematicamente atacada pelos governo e dirigentes do PAICV. É uma situação algo estranha na democracia. Noutras paragens, ao novo governo, permite-se-lhe cem dias de lua-de-mel, durante os quais as críticas da oposição e dos mídias são mitigadas, e seis meses para ainda culpar a governação anterior. Passado esse período, o novo governo assume total responsabilidade e sofre o impacto total do criticismo da comunicação social e da oposição. Em Cabo Verde acontece algo de extraordinário: o governo, no fim do segundo mandato, ainda continua a confrontar o que o antecedeu, dez anos antes. E a confrontá-lo de forma dura, cáustica e belicista. A percepção geral é que isso constitui perda de tempo, de energia e de atenção, com consequências na resolução eficaz e atempada dos problemas actuais. E também que constitui falta de respeito para com a nação na medida em que se recusa a assumir as consequências dos seus actos. De facto o País não pára. O Cabo Verde que teve a governação do MpD não é o mesmo de vários anos depois. Não se pode, em boa fé, exigir, hoje, do MpD algo que, há muito, não tem possibilidade de resolver porque não governa. Nem se pode culpa-lo hoje, por eventuais erros cometidos ontem, porque, pela mesma razão, não os pode corrigir. A irrazoabilidade dos ataques, aliada à sua natureza sistemática e permanente, pode levar qualquer observador a concluir que os verdadeiros alvos não são o MpD, ou a sua governação. Procura-se atingir, realmente, a memória e o significado profundo dos anos 90. De facto, essa década decisiva do Pais, não se define como o ano dos dois mandatos do MpD. Ficará fundamentalmente para a História como os anos da libertação do totalitarismo, da adopção da primeira Constituição, Democrática e Liberal, da construção do Estado de Direito democrático, da emergência do mundo autárquico, e das reformas económicas, entre as quais a liberalização económica, as privatizações e o acordo cambial, que restauraram a dignidade e a iniciativa ao indivíduo e integraram o País no mundo e na modernidade. O grande problema nisso tudo é que o PAICV foi um protagonista inconformado em todo o processo. Forçado a fazer a Abertura pelos acontecimentos que desembocaram na queda do Muro de Berlim e no fim da Guerra Fria, tentou manter-se no Poder na nova fase, mas perdeu. A 13 de Janeiro de 1991, viu-se na condição de oposição num sistema político que, de forma inexorável, se afastava dos princípios e valores do regime dos primeiros 15 anos após a independência. A adopção de uma nova Constituição e de uma nova bandeira nacional simbolizou a ruptura completa com o passado. Para o PAICV, apresentar-se perante a sociedade, os correligionários e os amigos internacionais como vítima do novo regime passou a ser um componente essencial da sua estratégia de sobrevivência. Resultou, mas o preço a pagar é demasiado caro, tanto para o partido como para o País e a sociedade. O PAICV vê-se completo na sua trajectória histórica. Não assume o conflito inevitável entre o passado de partido único, que nunca renegou, e a sua condição de partido legitimamente eleito para governar num sistema democrático. O conflito de um partido, hoje no Governo, a beneficiar dos ganhos do percurso em direcção à Boa Governança, ou seja em direcção à Liberdade Política, à Liberdade Económica e à afirmação do indivíduo, e, ao mesmo tempo, a resgatar e a integrar, como inseparável de si próprio, uma longa história de luta contra esses mesmos princípios. As baterias apontadas contra a década de noventa, aparentemente numa postura bélica contra o MpD, são na realidade a forma como o conflito é resolvido no seu seio. Esse é o drama do PAICV. O drama do País é que o Cabo Verde moderno tem que ser construído a partir dos alicerces já erguidos. Ao dedicar tanta energia em atacar a década de noventa o Governo fragiliza o trabalho de dar continuidade à construção das instituições democráticas e ao aprofundamento das reformas económicas que já demonstraram ser necessárias para o crescimento a taxas capazes de combater o desemprego. Mantém o País numa postura de, permanentemente, revisitar passos passados, passos esses cada dia mais distantes e cada vez mais longe do contexto onde se situaram, e eventualmente se justificaram. É tempo dos caboverdianos dizer aos governantes que ninguém os elege para olhar para o passado e para procurar reinterpreta-lo. Não é esse o papel do Estado. Foram eleitos para construir o futuro, salvaguardando as conquistas fundamentais, designadamente as que garantem a dignidade do indivíduo, as que preservam a sua liberdade e as que lhe possibilitam exercer o seu direito à felicidade e à prosperidade pessoal e familiar.
domingo, janeiro 23, 2011
Sem ética
sexta-feira, janeiro 21, 2011
Ser e parecer
Um dos grandes ganhos da II República foi o Estado de Direito democrático. O 13 de Janeiro deu o pontapé de saída para a sua construção. Os caboverdianos puderam escolher livremente de entre vários candidatos os seus governantes. E a legitimidade do exercício de Poder pelo Estado passou a depender do seguimento estrito da Constituição e das Leis. Um poder judicial independente foi erigido para assegurar-se de que assim é e para bloquear atentados aos direitos fundamentais dos cidadãos.
A expectativa de Paz e Justiça de todos os caboverdianos depende em muito da percepção que impera no país o Primado da Lei. Nos quinze anos de regime de partido soube-se o que significava lidar com um Estado que não se sentia obrigado pelas leis e que podia a seu bel-prazer atropelar direitos a começar pelo direito à vida e à liberdade. Uma especial responsabilidade tem sempre os governantes do momento em manter o Estado dentro da legalidade estrita. É essencial para os cidadãos se sentirem seguros e tranquilos de que os fundamentos do Contrato Social estão a ser cumpridos.
Exige-se nos períodos eleitorais que são de legitimação e transferência de Poder nas democracias uma sensibilidade maior do Estado tanto no “ser” como no “parecer”, quanto á sua aderência estrita à lei . O princípio de igualdade de oportunidades e de tratamento de todas as candidaturas obrigam a que o Estado, sem deixar de funcionar, se mova para um nível de neutralidade e imparcialidade. Assim é porque devido à autoridade que comanda, aos recursos desproporcionais que detêm e à abrangência da sua actuação pode influenciar acontecimentos, organizações e pessoas, esvaziando de conteúdo completamente o princípio de igualdade das candidaturas acima referido.
O Código Eleitoral justamente retoma o princípio constitucional do nº 5 do artigo 99º da CR que obriga á “neutralidade e imparcialidade de todas as entidades públicas” e regula todo o processo eleitoral. De todos os partidos e candidatos envolvidos nas disputas eleitorais espera-se que cumpram as regras do jogo de modo a garantir transparência, lisura e legitimidade ao processo de escolha popular. Particular exigência de probidade pede-se do partido que suporta o governo precisamente porque está em posição de, de alguma forma, usufruir da influência, autoridade e recursos do Estado.
O comportamento do PAICV desde do início do período pré-eleitoral não tem sido o mais tranquilizador. Claramente aproveita-se das prerrogativas da governação para continuar a explorar eleitoralmente realizações passadas, outras ainda por completar e fazer novas promessas. Ministros viajam pelas ilhas e fazem-se convidar em cerimónias de inaugurações como forma de contornar a proibição da lei eleitoral quanto a inaugurações, patrocínios e donativos. Paralelamente o partido tem comportamento belicoso como aconteceu com a chamada “guerra dos outdoors” onde o Estado acabou coimado pela Comissão Nacional de Eleições. Nos últimos dias, envolveu-se em conflito aberto com a Câmara Municipal da Praia devido à utilização indevida de espaços públicos para colocação de propaganda política.
A deliberada violação de normas legais por quem tem a responsabilidade de dirigir Estado é extremamente grave. Pode configurar um quadro de intimidação, na medida em que deixa todos perceber que não se vê limitado na sua actuação pelas leis da república. Qualquer atitude de intimidação por parte das autoridades é grave. Mas ostensivamente mostrar-se não constrangido pelas leis em vésperas de eleições é gravíssimo.
quarta-feira, janeiro 19, 2011
Quebra de 6% no crime?
segunda-feira, janeiro 17, 2011
A violência nas mentiras do Estado
Podia-se estranhar a forma assanhada e violenta como o líder do Paicv e Primeiro Ministro, o Dr. José Maria Neves, caiu sobre o líder do MpD, o Dr. Carlos Veiga, no debate da quinta feira. Mas não. Afinal usa as mesmas armas de que o Pais já se habituou a ver os militantes do Paicv a esgrimir em todos as situações: “Carlos Veiga abandonou o Governo”; “Carlos Veiga é contra o Poder Local porque disse que pedra não joga com garrafa e há filhos de dentro e filhos de fora” etc, etc. Se o debate se prolongasse, mais outras acusações, como o do chamado caso Enacol, iriam ressurgir das trevas. Comum a todas elas é que não correspondem minimamente aos factos. O Tribunal Constitucional, em Acórdão de 4 de Dezembro de 2000, disse peremptoriamente que não houve abandono do governo e que o então Primeiro Ministro, Carlos Veiga, simplesmente cumpriu a lei quando, com o anúncio da sua candidatura a PR, as suas funções foram automaticamente suspensas. Quanto ao Poder Local foi no governo de Carlos Veiga e com a Constituição de 1992 que reapareceram as câmaras após os 15 anos de Partido Único e de hostilidade extrema à autonomia municipal. A questão da ENACOL baseia-se num documento declarado falso pela Procuradoria Geral da República, após exaustivas investigações. O líder do Paicv, e também Primeiro Ministro, ao pegar em mentiras óbvias para atacar opositores mostra o total desrespeito pelas instituições da República e por todos que naquela noite estavam a seguir no dabate. Mas esse é o estilo de propaganda que o PAIGC/PAICV sempre submeteu Cabo Verde. Cria pseudo factos e obriga todos a aceitá-los e a repeti-los apesar das evidências em contrário. As próprias instituições do Estado são instrumentalizadas para encarnarem essas “verdades históricas”. Um exemplo é a comemoração de 44º aniversário das Forças Armadas no dia 15 de Janeiro num país que só tem 35 anos de existência como Estado independente. Coisa similar acontece, por exemplo, na China em que se comemoraram no ano passado os 83 anos do Exercito de Libertação Popular e os 61 anos da República Popular. Mas aí é claro como diz o presidente Hu Jintao “as forças armadas estão sob o comando do partido comunista”. Não são propriamente forças armadas republicanas. Em Cabo Verde, as FARP, forças armadas revolucionárias do povo e braço armado do partido, desapareceram com a Constituição de 1992, para dar lugar às Forças Armadas de Cabo Verde. É dever das FA cuja missão fundamental é a defesa da ordem constitucional não fugir a essa ordem e reportar-se a algo que só serve a vaidade de uns e a pretensões ao Poder fora da constituição. Já é tempo de Cabo Verde sacudir essa forma de fazer política com base em desinformação, meias verdades e inverdades grosseiras. Revela a persistência de uma cultura política nociva, desrespeitosa da nação e atentatória à dignidade das pessoas. Theodore Dalrymple em poucas palavras revelou a essência dessa cultura: “No meu estudo das sociedades comunistas, cheguei à conclusão de que o propósito da propaganda comunista não era persuadir, nem convencer, mas humilhar – e, para isso, quanto menos ela correspondesse à realidade, melhor. Quando as pessoas são forçadas a ficar em silêncio enquanto ouvem as mais óbvias mentiras, ou, pior ainda, quando elas próprias são forçadas a repetir as mentiras, elas perdem de uma vez para sempre todo o seu senso de integridade, honestidade e decência. (...) A capacidade de resistência das pessoas é desgastada (...) [E] uma sociedade de mentirosos castrados é fácil de controlar.”
domingo, janeiro 16, 2011
Basta de discurso estéril e abusivo
sexta-feira, janeiro 14, 2011
Campanha a partir do Palácio do Platô
quinta-feira, janeiro 13, 2011
A CNE, o art. 105º e a liberdade de imprensa
A coimas aplicadas aos jornais “Já”, “Liberal” e a “Asemana” geram controvérsia em todos os quadrantes. Isso porque as razões apresentadas pela Comissão Nacional de Eleições para penalizar esses órgãos de imprensa parecem colidir com sacrossanta liberdade de expressão e de informação indispensável numa democracia, mormente nas vésperas das eleições. A CNE justifica as suas acções com o princípio constitucional de igualdade de oportunidade e tratamento das candidaturas, estabelecido no nº5 do artigo 99º da CR, e cita o artigo 105º do Código Eleitoral. As várias alíneas do nº 2 desse artigo limitam, de facto, a transmissão, a difusão, a manipulação de programas e imagens que ponham em vantagem candidatos, partidos ou coligações. A questão que se pode colocar é se tais restrições são aplicáveis a todos os órgãos de comunicação social ou só àqueles que fazem “transmissões, difusões, usam imagens e podem truncar áudio e vídeo”, ou seja à radiodifusão e à televisão. A Constituição trata de forma diferente os órgãos de comunicação social. Tem normas especiais para os órgãos públicos. Em relação aos privados faz diferença entre a imprensa escrita e os órgãos como a rádio e a televisão que se servem do espectro electromagnético pertencente ao domínio público. Estipula claramente no nº 6 do artigo 60 que a criação e a fundação de jornais e outras publicações não carece de autorização, enquanto para a rádio e televisão no nº 7 do mesmo artigo exige que se faça concurso público para adquirir licença. No serviço público da rádio e televisão obriga a que fique assegurado a expressão e o confronto das diversas correntes de opinião. Tal imposição, porém, não se aplica aos órgãos privados. Esse sujeitam-se simplesmente a garantir tempos de antena regulares e equitativos a todos os concorrentes nos períodos eleitorais (nº4 do artigo 58 da Constituição da República). A posição de constitucionalistas como Gomes Canotilho e Vital Moreira é que nos órgãos públicos o pluralismo e igual tratamento de opiniões é assegurado internamente. Mas que nos outros órgãos de comunicação consegue-se pluralismo agindo externamente no meio circundante, pela via designadamente de regulação do acesso a licenças, da manutenção do ambiente de concorrência e da facilitação da criação livre de jornais. Pelo que foi dito fica claro que a abordagem que Constituição faz e obriga a fazer da problemática da comunicação social é complexa e diferenciada. Nesse sentido custa a crer que o legislador com o artigo 105º do Código Eleitoral quisesse tolher gravemente a liberdade de expressão na imprensa escrita com preocupações de igualdade de tratamento de candidaturas quando é comprovadamente fácil qualquer organização ou indivíduo recorrer a outros jornais ou criar o seu próprio para fazer valer o seu ponto de vista. Já a radiodifusão e a televisão pedem uma outra posição. Os Meios são mais caros e carecem de licença, por isso mostra-se razoável que se exija que sejam mais comedidos e que sem ferir a liberdade de expressão e informação a que têm direito não anulem o princípio de igualdade de tratamento de todos os candidatos. Concluindo, a percepção geral de que as posições da CNE em relação aos jornais têm sido consideradas demasiado severas advém muito provavelmente do facto de que as restrições da lei eleitoral não lhes ser aplicáveis. Ou então, que num quadro de direitos concorrentes a liberdade de expressão e de imprensa saía tão gravemente prejudicada, sofrendo restrições que a Constituição não prevê e que nenhuma maioria, ou supermaioria, pode criar.
Relembrando o caminho até o 13 de Janeiro
segunda-feira, janeiro 10, 2011
Mais um na ELECTRA: entrada em "espécie"
sábado, janeiro 08, 2011
Despartidarizar a Administração Pública
Uma candidatura ao cargo de deputado da nação significa que, pelos menos por cinco anos, se está a fazer uma opção por uma carreira política. A Constituição exige da Administração Pública e dos seus agentes isenção e imparcialidade na condução dos assuntos do Estado. A ética que daí emerge torna incompatível a condição de servidor público e de activista político. Ir contra isso é alimentar a promiscuidade entre a carreira política e a carreira na função pública; significa perpetuar a partidarização da Administração com todos os seus efeitos nefastos já de todos conhecidos.
O partido no Governo escolheu convidar para Deputado dirigentes de órgãos da administração directa, indirecta e autónoma direccionadas para a prestação de ajudas a sectores mais vulneráveis, designadamente crianças, velhos e mulheres, ou mais sensíveis e influenciáveis como os jovens. Compreendem-se, assim, os convites a dirigentes do ICASE, da Fundação Caboverdiana de Solidariedade, do Instituto para a Igualdade e Equidade do Género, da Direcção Geral de Juventude, da Direcção Geral dos Desportos e delegados dos ministérios de Educação e da Agricultura. Quer-se explorar eleitoralmente a relação que porventura eles pessoalmente ou as instituições que dirigem estabeleceram com esse grupo de pessoas. Evidente que isso não é lícito.
Os convites do partido no governo feitas a dirigentes da Função Pública, seja para candidaturas em eleições autárquicas, seja nas eleições legislativas, geram dinâmicas perversas que vão muito além das eleições. Nas autarquias em que forças de oposição ganham um mal-estar permanente, estabelece-se entre os dirigentes dos serviços desconcentrados do Estado e os órgãos municipais, apimentados de tempos em vez com despiques entre membros do governo, e mesmo directores dos serviços centrais, com os presidentes das câmaras.
Também, em antecipação a convites futuros para exercer cargos políticos, alguns dirigentes colocados em instituições de "grande valor relacional" com grupos específicos da população adoptam, à partida, uma vincada atitude política-partidária. No ambiente assim criado dificilmente se desenvolvem os valores da lealdade institucional e da defesa do interesse público e a cultura de prestação de serviço que se exige da administração pública.
Há que pôr um stop a todo este processo que já vem de muito longe. De outra forma, o país nem irá conseguir que emerja do seu seio uma classe política séria, competente e comprometida com o serviço público, nem conseguirá dotar-se de uma administração meritocrática, livre de corrupção e de tráfico de influências e que se vê a si próprio como o instrumento essencial para a realização do interesse geral.
sexta-feira, janeiro 07, 2011
Mordaças nos telemóveis
O impacto do silenciamento dos telemóveis como plataforma de troca de informações entre indivíduos e grupos com vista a acção comum torna-se mais notório com o aproximar da campanha para as eleições legislativas. Ninguém está recorrer aos SMS´s de forma como se fez nas autárquicas de 2008. E não é por falta de esforço dos partidos concorrentes em fazer uso dos meios mais modernos de comunicação, designadamente a internet e as redes sociais como a Facebook, para chegar aos eleitores. Só não exploram as potencialidades oferecidas pelos telemóveis, considerando que há cerca de trezentos mil utilizadores no em Cabo Verde, é porque estão impedidos pela ANAC. Com uma deliberação, a agência reguladora das comunicações, bloqueou o uso de pequenas mensagens, SMS, como meio de mobilização e coordenação de acções de indivíduos e grupos. Justificou a proibição citando o incómodo de alguns utilizadores em receber mensagens não solicitadas. Só aos operadores de telecomunicações e a certas institucões deixaram essa prerrogativa. Aos operadores talvez para garantir o seu apoio essencial no condicionamento do acesso e aos outros possivelmente só para mostrar que não há motivações escondidas. O problema é que essas posições de autoridades não são nem inócuas nem inéditas. Num artigo da prestigiada revista americana “Foreign Affairs” de Janeiro de 2011 sob o título “O poder político dos Media sociais” O professor da Universidade de Nova Iorque Clay Sherky escreve que “a resposta das autoridades ao aparecimento novas formas de comunicação acessível a todos é apertar na censura e investir na propaganda”. Nesse sentido, o controlo da capacidade de troca de mensagens, abrangendo o universo dos utilizadores dos telemóveis, não deixa de ser uma medida tentadora, por uma razão simples: evita acções conjuntas e coordenadas de cidadãos para serem ouvidos, para informarem e serem informados , para participarem em eventos de toda a espécie ou para pressionarem e influenciarem as autoridades. A experiência recente do activismo social e político no Irão, mas também na Bielorrússia, Ucrânia, Coreia do Sul, Chile e Filipinas, em que o poder do telemóvel e dos SMS´s ficou patente, não deixou de chamar a atenção das autoridades em muitos países que não vêem com bons olhos a autonomia dos indivíduos e da sociedade civil face ao Estado. Governos recorrem permanentemente aos meios poderosos da rádio e da televisão para fazer valer o seu ponto de vista, sem contraditório à altura. Quando aparece um meio como o telemóvel, que a todos possibilita dar e receber informações directamente sem controlo do Estado, sentem-se ameaçados. Mas as liberdades de expressão, de informação e de reunião são essenciais para o exercício da cidadania e para o funcionamento da democracia. Os únicos limites que a Constituição as impõe são as que explicitamente estabelece. Às autoridades não são permitidas que alarguem as restrições, sob que razão for. O bloqueio dos SMS broadcasting configura o que o professor Clay Sherky considera de atentado ao direito de informar e ao direito de reunião, com impacto directo na participação política dos cidadãos e na capacidade de “empoderamento” dos indivíduos e da sociedade civil caboverdiana. E os efeitos desse bloqueio sentem-se: A mão do Estado, e de quem a controla, vai para as eleições mais pesada e influente do que devia. A guerra que o Governo moveu contra os outdoors da Oposição, ao mesmo tempo que teimosamente mantinha os seus, não obstante a Lei e as posições da CNE, confirma o que o referido artigo do “Foreign Affairs” considera a típica reacção das autoridades ao maior protagonismo dos cidadãos e da sociedade civil derivado do uso dos novos media sociais: censura e mais propaganda.