quarta-feira, maio 07, 2014

Cair no real




Expresso das ilhas, edição 649 de 7 de Maio de 2014

Editorial

Ilusão e realidade confundem-se de tal forma em Cabo Verde que dificilmente se consegue descortinar onde uma começa e a outra termina. Na questão do emprego, por exemplo, o fosso entre os números oficiais e a realidade que socialmente se pode constatar é enorme. As proclamações de país de sucesso brigam com os dados de um crescimento anémico que ameaça perdurar porquanto os investimentos realizados não têm o retorno esperado e a dívida pública fica cada vez mais pesada. As grandes expectativas postas pelos indivíduos e as famílias na educação e formação como via para uma vida melhor deparam-se com as deficiências e falta de qualidade do sistema que os deixa sem a devida adequação ao mercado de trabalho. Apesar das frustrações que tudo isso gera e que tende a levar os indivíduos e a sociedade para a resignação e o conformismo, não é visível que esforços consequentes estejam a ser feitos para fazer com que o país “caía no real”, como diria o brasileiro.
O discurso oficial do governo domina a comunicação no país. Qualquer tentativa de sacudir a ilusão esbarra na barragem de dados, eventos, inaugurações e pronunciamentos produzidos todos os dias e que de uma maneira ou outra estão em conflito com a realidade vivida. Fala-se em políticas activas de emprego, mas o desemprego é cada mais crítico particularmente para os mais jovens. Apontam-se portos, aeroportos, energia e água como exemplos de transformação, mas o que se nota é que os transportes continuam caros e infrequentes, os estrangulamentos administrativos persistem e os custos de factores-chave impedem a competitividade. Agitam-se repetidamente declarações de entidades estrangeiras a considerar Cabo Verde como um país de sucesso e um exemplo para os outros, quando é notório o desfasamento entre o crescimento dos últimos e os dos países da sub-região africana. A desproporção de recursos da comunicação do Estado em relação a qualquer comunicação privada, que, aliás, espelha o peso enorme que o Estado directa e indirectamente tem sobre a economia, as empresas e os cidadãos, garante que, na generalidade dos casos, a posição oficial prevaleça sobre os factos.
O ambiente de coacção de consciências que esse estado de coisas pressupõe tem sido constatado e denunciado por vozes vindos de todos os quadrantes. Os partidos da oposição repetidas vezes acusaram o partido no governo de partidarização da administração pública, de manipulação política de associações e de condicionamento da liberdade de voto. Um estudo recente pôs em 11% o número de eleitores aliciados a vender o voto. Curiosamente de entre sensibilidades diferentes no interior do partido no governo surgiram denúncias similares por altura das eleições presidenciais em 2012. E já transpareceram para a imprensa nacional relatos de confrontos entre candidaturas à liderança do PAICV que se acusam mutuamente de condicionamento de posições políticas e militantes e amigos com a utilização de recursos do Estado.
A luta pelo controle de recursos e a tentação de os utilizar politicamente em proveito próprio ganha especial importância nos estados como o cabo-verdiano que se ergueram como gestores da ajuda externa e não como promotores e facilitadores da iniciativa privada produtora da riqueza nacional. Concentram-se na captação dos fluxos externos e esforçam-se por se posicionarem no topo da proverbial cadeia alimentar. Naturalmente que a democracia é prejudicada em tal ambiente mesmo que quanto a eleições, o exercício de direitos e a responsabilização e prestação de contas não aparenta ter grandes disfuncionalidades. O facto de se dotar de uma administração pública fortemente partidarizada e de apresentar uma sociedade civil sem grande autonomia, um empresariado frágil e um número significativo de cidadãos dependentes, não favorece a cidadania plena. E não é o facto de todo o ambiente de coacção não ser visível que o torna menos real.
A insistência em noções ilusórias do género “blindados contra a crise”, “sustentabilidade de dívida pública a mais de 100% do PIB” e “clusters” para além da evidência em contrário poderá ser um sinal que o exercício das liberdades e do contraditório na democracia cabo-verdiana está a ter alguma dificuldade em trazer a verdade ao de cima, em forçar mais honestidade na esfera pública e uma maior responsabilização política da governação do país. Provavelmente não será indiferente a este entorse no funcionamento democrático que caracterizações como “partido único benigno”, a par com “anos tenebrosos da democracia” façam parte do discurso político. O mesmo discurso que, por outro lado, se mostra determinado em glorificar os anos de ditadura e os seus protagonistas ao mesmo tempo que aponta todos os defeitos aos anos de liberdade e de construção do Estado de Direito democrático.
Nenhuma sociedade consegue avançar com uma governação que privilegia a propaganda e o marketing político. A responsabilização política não é completa, os problemas não são devidamente encarados, os erros não são corrigidos a tempo e oportunidades são desperdiçadas. Não é a toa que os países mais avançados do mundo são democracias. Mostram-se capazes de adaptar a mudanças e não se perdem em ilusões. Com a liberdade e o primado da lei soltam a energia produtiva e criadora de todas as pessoas, ficando ao Estado o papel de facilitar a expressão dessa energia a favor da toda a comunidade e não coarctá-la e subordiná-la aos interesses de alguns.


quarta-feira, abril 30, 2014

Flexibilização não é tudo




Expresso das ilhas, edição 648 de 30 de Abril de 2014

Editorial

A greve geral marcada para as vésperas do 1º de Maio, Dia do Trabalhador, não se realizou. A confederação sindical CCSL que a tinha convocado desde Dezembro deixou de contar nos fins de Março com o apoio da outra central sindical UNTC-CS. Esta justificou-se com a criação pelos parceiros sociais e o Governo de uma comissão com um prazo “conveniente”, 6 de Maio, para chegar a acordo em várias questões laborais pendentes. Mas certamente que os vários pronunciamentos do Governo e de entidades patronais considerando a greve desnecessária e inoportuna tiveram o seu impacto. Até se falou em lock-out dos empregadores, acção proibida pela Constituição (artigo 67º), para contrapor ao direito da greve.
Questões laborais existem obviamente no país, sendo o mais grave deles todos o desemprego persistente nos dois dígitos. Na legislatura anterior o Governo não cumpriu com a promessa de baixar o desemprego para um dígito. No novo mandato absteve-se de definir metas no crescimento económico e no emprego e prosseguiu, no essencial, com as mesmas políticas que tinham falhado na criação de postos de trabalho em número suficiente para debelar o desemprego. A dinâmica do sector turístico não conseguiu contrariar essa falha por razões múltiplas em que se destacam a incapacidade em unificar o mercado nacional, os custos de factores, os custos de contexto e a inadequação da mão-de-obra às necessidades do mercado.
Confrontados com a complexidade desses problemas, e provavelmente não tendo respostas para eles a curto prazo, os governantes resolveram centrar-se na questão da flexibilidade do mercado de trabalho. Seguir essa via tinha a vantagem de ser algo factível na medida em que se tratava simplesmente de legislar e tinham maioria parlamentar necessária para passar qualquer alteração. Em acréscimo, a flexibilização das leis laborais melhoraria a baixa classificação que o país até então vem obtendo nos índices mundiais de competitividade (119 em 147 países). Mas continha a desvantagem de pôr os sindicatos em pé de guerra perante a hipótese de perda de direitos adquiridos dos trabalhadores. 
As razões do crescimento anémico, posto pelo FMI em 0,5% em 2013, e do elevado desemprego de 16,4%, segundo o INE, ficam por ser identificadas e resolvidas quando o que parece estar em jogo é a velha disputa - direitos adquiridos versus flexibilidade. Em tal ambiente não se questiona porque jovens escolarizados nos níveis secundário e universitário não conseguem se empregar. Nem tão pouco quer-se saber porque, depois de rios de dinheiro gastos em formação profissional, é notória a inadequação da mão-de-obra às necessidades do mercado. Só recentemente é que a preocupação com a qualidade do ensino e da formação passou a constar dos discursos oficiais. E mesmo assim não se sabe se é para valer.
Quer-se desenvolver uma economia de serviços e não se vê esforço algum em mudar a atitude das pessoas com vista a criar uma cultura de serviço. Não é evidente que se interiorizou a importância central do capital humano para o desenvolvimento de Cabo Verde. O país não tem outros recursos e é um arquipélago com uma pequena população e um mercado exíguo. Só com exportações de bens e serviços se poderá garantir crescimento sustentável e criação de emprego. Para isso exige-se mão-de-obra altamente qualificada e não simplesmente flexível ou com baixos salários. Infelizmente esse esforço de qualificação não tem sido assumido de forma consequente nem pelo Estado nem pela sociedade.
A situação crítica de desemprego não tem encontrado da parte do Governo a melhor resposta, não obstante já apresentar sinais preocupantes de estar a causar tensões sociais. Às vezes, o Governo dá sinais de alguma desresponsabilização ao passar a culpa aos outros. Diz que já fez a sua parte e que cabe ao sector privado criar postos de trabalho. Chega mesmo a sugerir que em certos casos seriam os próprios desempregados a não estar interessados em trabalhar. Na falta de uma dinâmica de criação de empregos, apela ao auto emprego e aponta como soluções caminhos designadamente os da pequena agricultura a que chama “agronegócios”. 
A realidade já demostrada em vários países nas últimas décadas é que, para se combater a pobreza, para se aumentar os rendimentos das famílias e criar riqueza, os países têm que ser competitivos e aumentar a sua produtividade. Não se é competitivo deixando que ineficiências múltiplas na administração pública, nos transportes, na produção de energia persistam e aumentem extraordinariamente os custos das empresas no país. Não se pode aumentar a produtividade se, por um lado, não se faz aposta séria no capital humano e não se consegue atrair capital estrangeiro e, por outro, se incentiva as pessoas a auto-emprego ou a se empregarem em actividades de baixo valor acrescentado.
Com tais políticas, compreende-se por que, ano após anos, e mesmo em tempos de vacas gordas, o país não consegue dar o salto definitivo para um nível de crescimento forte e sustentável. E certamente que não é simplesmente ficando pela flexibilização de mão-de-obra que se vai compensar a falta de reformas em outros sectores e no melhoramento do capital humano indispensáveis a uma real e rápida criação de emprego de que tanto o país precisa. Diálogo entre os parceiros é importante, mas para que seja frutífero tem que existir confiança. Uns não podem ganhar à partida enquanto outros ficam com o ónus de só ver resultados a médio e longo prazo, se os houver. 

quarta-feira, abril 23, 2014

25 de Abril, 40 anos depois




Expresso das ilhas, edição 647 de 23 de Abril de 2014
Editorial

Posto numa certa perspectiva e parafraseando Saddam Hussein pode-se considerar que o golpe de Estado do 25 de Abril de 1974 foi “a mãe de todas as mudanças”. É o que o politólogo americano Samuel Huntington também constatou quando em retrospectiva apontou a Revolução dos Cravos como ponto de origem da terceira vaga de democracia que nas duas décadas seguintes fez da liberdade e do primado da lei valores universais. Por onde passou a onda só ficou a má lembrança das ditaduras militares e dos regimes autoritários e totalitários. Mas a esperança que alguns puseram na vitória incondicional da democracia e num “fim da história” veio a se revelar prematura. Os recentes acontecimentos na Ucrânia mostram como ainda forças antidemocráticas e iliberais ameaçam a liberdade e o pluralismo.
Com o derrube do regime de Salazar/Caetano, Portugal iniciou um processo político que o iria conduzir à construção de uma democracia parlamentar e à sua integração na União Europeia. Contribuiu grandemente para o sucesso desse empreendimento a capacidade das lideranças nos partidos emergentes após a revolução em criar uma base forte de suporte à Constituição, em pôr fim à tutela militar e em libertar o potencial do país com a liberalização da economia e dinamização do sector privado. Mesmo actualmente sofrendo os efeitos da crise financeira e obrigado a fazer reformas profundas e dolorosas para enfrentar os desafios da economia mundial, ninguém duvida das vantagens que a democracia representa na busca das vias para o sucesso. Definitivamente para trás ficaram os anos de ditadura, de censura e de recusa do pluralismo.
Portugal para fazer essa caminhada teve primeiro de efectivar o desmembramento do seu império colonial. A retirada, em menos de dois anos, de três frentes de guerra em África e dos outros territórios sob a sua administração, não foi tarefa fácil. Ainda para mais todo o processo verificou-se a partir de uma posição de fraqueza. As consequências para Portugal não foram demasiado traumáticas. Os chamados retornados das colónias rapidamente se integraram na sociedade portuguesa. Quem mais suportou os custos da descolonização foram os novos estados independentes. Guerras civis duraram décadas em Angola e Moçambique. Na Guiné-Bissau reinou a instabilidade na sequência de sucessivos golpes militares. Timor-Leste viu-se invadido pela Indonésia e alvo durantes anos seguidos de massacres e crueldades extremas. Cabo Verde deixou-se levar pela ilusão de uma unidade com a Guiné-Bissau e suportou quinze de ditadura do partido único.
Só a partir de 1989-1990, com o fim da Guerra Fria, com o desmembramento do império soviético e com a perda completa de credibilidade das ideologias comunistas e afins é que nas ex-colónias portuguesas se veio a reacender a chama da liberdade que por breves momentos no após 25 de Abril também tinha animado os respectivos povos. Em Cabo Verde rapidamente se pôs fim ao partido único, se adoptou uma Constituição democrática e se realizaram reformas económicas que fizeram o país ganhar uma nova dinâmica com resultados evidente no nível e na qualidade de vida das pessoas. Mas os quinze anos de economia estatizada, de supressão da iniciativa individual e de aversão a investimento estrangeiro deixaram a sua marca. O atraso que ainda Cabo Verde apresenta quanto comparado com outras economias insulares designadamente as Maurícias - menos de um terço do PIB per capita (PPP) - deve-se em grande parte às políticas erradas seguidas por tantos anos.
Felizmente que após 23 anos de construção da democracia não existem muitas vozes que claramente põem em causa os valores da democracia e liberdade. Pedro Pires no seu octogésimo aniversário vai publicar os seus discursos enquanto presidente da república em tempo de democracia e não os que proferiu como primeiro-ministro nos anos da ditadura do partido único. Com essa decisão implicitamente reconhece a superioridade do regime democrático e constitucional actual sobre o regime anterior. O mesmo devia fazer todos aqueles que persistem em encontrar razões para glorificar o partido único.
Para comparar momentos históricos, é preciso conhece-los bem e sem quaisquer reservas. Hiatos no conhecimento não devem ser promovidos com omissões, tabus ou distorções deliberadas dos factos particularmente por quem detém o poder ou controla meios de comunicação pública e dirige instituições públicas de educação. Preservar a memória é fundamental para evitar que o debate político se desvie dos problemas actuais e futuros do país e caía na esterilidade dos discursos do passado.
Como a experiência de outros países demonstra, viver na democracia coloca sempre desafios designadamente de representação e de participação dos cidadãos, de exercício de direitos e de qualidade das instituições. Isso não dever ser razão para cepticismo ou mesmo cinismo. Um estado de alerta permanente deve evitar que à medida que passam os anos haja retrocesso nos direitos fundamentais e desvirtuamento da democracia e das suas regras procedimentais. Democracia é ainda o melhor regime para se criar prosperidade na liberdade.


quarta-feira, abril 16, 2014

O Governo está contente. E o povo?




Expresso das ilhas, edição 646 de  16 de Abril de 2014

EDITORIAL:


Nesta semana os cabo-verdianos constataram que invariavelmente o governo mostra-se contente com os resultados das suas políticas. Contente com descidas no desemprego de 0,4% mesmo que seja à custa do aumento do subemprego e da classificação de muita gente já desesperançada como população inactiva. Contente com os dados das contas nacionais do INE que põem a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto de 2012 em 1,2 %. Provavelmente continua satisfeito com a taxa de 0,5 % para o PIB de 2013 calculado pelo FMI no World Economic Outlook do corrente mês de Abril. O Sr. Primeiro-ministro mostrou-se ainda contente com a perspectiva de a ELECTRA começar a ter lucros, embora esses lucros só sejam possíveis com preços de electricidade dos mais altos do mundo.
Passou a ser habitual classificar-se de optimista e de positiva a posição do governo que não muda ou não reconsidera as suas opções face a resultados decepcionantes. Serve bem para contrapor aos críticos das políticas ou aqueles que vêem, nos baixos resultados, sinais comprometedores do futuro. Esses seriam os negativos e os pessimistas. A realidade é que uma atitude dessas constitui, de facto, um convite ao conformismo das populações, uma via para manter as pessoas enredadas numa perspectiva de curto prazo e uma forma de negar qualquer alternativa ao rumo actual seguido pelo país. Faz tábua rasa da experiência recente de vários países que se deixaram levar por euforias diversas, mas que depois foram forçados a acertar o passo de forma drástica. Ninguém pode viver indefinidamente acima das suas posses.
Dani Rodrik, o especialista de Harvard em políticas de desenvolvimento, num recente artigo, notou que a travagem no crescimento de alguns países em desenvolvimento devia-se ao facto de “segmentos de baixa produtividade” dessas economia não estarem a encolher, mas sim a expandir. Em vez da transferência de trabalhadores de sectores tradicionais e de baixa produtividade como a agricultura e os pequenos serviços para o trabalho industrial e para os serviços modernos verificava-se precisamente o contrário. A mudança ia no sentido de actividades transaccionáveis para não transaccionáveis, de sectores organizados para informalidade, de empresas modernas para tradicionais e de empresas de grande e média dimensão para empresas pequenas e não no sentido inverso que é típico nas economias em crescimento rápido. Para Dani Rodrik essa é a via de perda de produtividade, da incapacidade de ganhar competitividade a e da impossibilidade de criação rápida de postos de trabalho.
Os dados sobre o crescimento e emprego de Cabo Verde referidos acima, conjugados com a dívida pública já projectada para 115 % do PIB em 2014 deviam merecer uma outra reacção do governo que não o regozijo público por pretensamente estarmos a enfrentar bem os efeitos da crise financeira. Aliás, quando se reconhece que urge gerir melhor as infraestruturas, ponderar melhor os investimentos públicos, avançar com privatizações e reformas na administração pública é porque algo falhou nos cálculos anteriores. Não se está a crescer como previsto, nem a criar emprego suficiente e nem a mobilizar investimento privado como esperado. O problema é que não se vai à raíz dos problemas e prefere-se persistir no caminho já conhecido de mobilizar mais financiamentos públicos para suprir a falta de retornos nos feitos anteriormente. A projectos antigos sucedem-se projectos novos e a infraestruturas existentes sucedem-se outras sem que se consiga, com uma gestão adequada, extrair o retorno desejável.
Agrava ainda as coisas o facto de nesse mar de ineficiência o impacto dos novos investimentos na economia já seguirem a lógica dos retornos decrescentes. Quando, por exemplo, no caso da ELECTRA, se procura ultrapassar os constrangimentos imensos da empresa com uma tarifa brutal das mais altas no mundo, todos pagam. O custo é suportado pelas famílias, pelas empresas e pela economia do país que com os actuais preços de energia e água não tem como ser competitiva. Falar de lucros da ELECTRA neste contexto é descabido. De facto, está-se literalmente a tirar dinheiro dos bolsos das pessoas para pagar as políticas erradas seguidas durante mais de uma década no sector de energia e água.
A atenção governativa devia orientar-se no sentido apontado por Dani Rodrik de estímulo à produção e ao crescimento da produtividade. Como ele diz, o apoio às pequenas empresas serve objectivos de política social, designadamente de luta contra pobreza, mas não substitui políticas e incentivos direccionados para os sectores modernos e de bens transaccionáveis. A falta de clareza e foco neste aspecto só contribui para que ano após ano se ver os dados reais da economia a ficar sempre muito aquém das previsões e demasiado abaixo das médias regionais africanas e de economias insulares semelhantes. O país precisa de uma dose de realismo e de pragmatismo que não se deixa esvaziar pelo estilo de governação de campanha permanente.