Os quinze anos de governo do PAICV debilitaram bastante o Parlamento cabo-verdiano. Para o público foram passadas imagens de intransigência, de incapacidade de fiscalização do governo e de fragilidade dos deputados. Com as reformas pretendia-se fazer avançar o Parlamento para um novo estádio no qual os trabalhos nas comissões especializadas ganhariam outro peso, a fiscalização do governo tornar-se-ia mais efectiva e a produção legislativa seria maior. Tardaram e acabaram por ser obscurecidas na controvérsia à volta do regime remuneratório dos titulares do poder político. O fim das reformas levou a Assembleia Nacional ao seu ponto mais baixo, seja em termos de imagem pública, seja em termos de auto-estima dos seus titulares. A crise serviu para trazer ao de cima muita da cultura anti-partido e contra o pluralismo que vem dos tempos do salazarismo e dos 15 anos de partido único. Felizmente que as eleições de 20 de Março pela forma como decorreram, pela abstenção relativamente baixa e pelos resultados, demonstraram que o eleitorado continua a acreditar no sistema de partidos: demonstrou que é capaz de forçar a mudança de governo ao mesmo tempo que deixa força política expressiva no sistema capaz de garantir alternância futura. Agora o Parlamento com legitimidade renovada deve saber mover-se com rapidez para assumir em pleno o seu papel dentro do sistema político designadamente em garantir a discussão plural das grandes questões do país, na fiscalização do governo e na adequação do ambiente legal e institucional necessário para acelerar o crescimento e desenvolvimento do país. Para o forte engajamento nesse sentido é de maior importância o papel do presidente e da mesa da Assembleia Nacional. Em particular do presidente da Assembleia Nacional é fundamental que sua condução dos trabalhos parlamentares seja percebida por todos como isenta e imparcial. Embora originário do partido maioritário, o presidente deve esforçar-se por não permitir que o governo juntamente com a sua maioria dificulte o debate parlamentar, trate com sobranceria os deputados da oposição e crie obstáculos à prestação de contas. A imagem negativa do Parlamento como instrumento dócil do governo diminui o seu papel de centro do sistema político, fere a dignidade dos seus titulares e desprestigia-o perante a opinião pública. A perda em democracia e em pluralismo que daí resulta tem consequências gravosas não só nas garantias de liberdade como também afecta as possibilidades do país de encontrar os caminhos certos, fazer os ajustes de percurso e mobilizar as energias e capacidade para crescer e prosperar. Um novo começo precisa-se.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 752 de 20 de Abril de 2016.