O 13 de Janeiro é feriado nacional para relembrar da importância central de eleições livres e plurais para a nossa dignidade como indivíduos, para a nossa liberdade como cidadãos e para satisfação do nosso desejo de paz e justiça como nação. Em todos os momentos em que se repete o ritual democrático de ir às urnas e depositar o voto, seja nas eleições legislativas, seja nas presidências ou nas autárquicas, espera-se que estejam garantidos os fundamentos desse acto de soberania do povo: a liberdade e o pluralismo. A realidade eleitoral porém tem sido uma outra, muito distante do que se espera numa democracia consolidada. O regime democrático caboverdiano, novo ainda com vinte anos, apresenta falhas graves que se tornam particularmente notórias no dia do voto. É um dia que devia ser de tranquilidade e de alegria. Depois de toda a euforia, de todos os argumentos e contra argumentos e de todas as paixões exacerbadas da campanha o cidadão espera sentir-se completamente livre para escolher os seus governantes e decidir o rumo do país. Para que assim seja a lei eleitoral estipula o fim de todas as actividades de campanha 24 horas antes precisamente para que serenidade volte a reinar e ninguém se sinta coagido. Não é porem o que acontece. O dia do voto é dia um triste e é um dia de vergonha. As pessoas saem de casa para ir votar e deparam-se com viaturas cruzando as ruas em todas as direcções pejados de pessoas com rosto fechado. Chegado ao local do voto há muitos poucos sorrisos e os cumprimentos entre pessoas conhecidas são muito pouco efusivos. A volta do local de voto há sujeitos hiperactivos a questionar eleitores se sabem onde vão votar e a oferecerem-se para ajudar. A agressividade no ar de tempos em tempos aumenta de intensidade com a chegada de outros tantos que entram pelos locais de voto, interpelam quem está ali na fila à espera de votar ou enfrentam outros que lá chegaram primeiro. Bilhetes de identidade são disputados aos donos ou por quem se oferece para os ajudar a encontrar o local certo do voto com o intuito de sugerir um sentido do voto ou então por aqueles que se prestam a comprar votos. O ambiente criado repele eleitores, intimida e condiciona. O que é feito à luz do dia durante a votação vem no seguimento do que nos sábados de reflexão e na noite antes de votação se constata por todos os cantos do país: uma pressão despudorada opressiva e chantagista dirigida à população social e economicamente vulnerável. Não se sabe se os efeitos no eleitorado dessas operações são decisivos na determinação dos resultados. Os métodos e procedimentos utilizados lembram organizações militares preparadas para infundir terror. E facto é que envenenam o ambiente. É só ver o número de incidentes que se verificam no chamado dia de reflexão e no próprio dia de votação. A tensão criada subsiste mesmo depois dos resultados publicados e de se conhecer o vencedor. As várias mortes violentas verificadas em vários pontos do país nos dias que seguiram às últimas eleições ilustram isso. Já antes um clima de violência latente tinha se instalado no país durante o período eleitoral. Vários factores contribuíram para isso designadamente as disputas dos outdoors, a tensão com as câmaras à volta da colocação de material de propaganda do partido no governo e, mais grave ainda, as denúncias de sabotagem na Electra por membros do Governo. A colocação de elementos das forças armadas na Electra serviu para tornou real uma ameaça imaginária e quase lançou multidões em manifestações à procura de sabotadores na central eléctrica da Praia. O linchamento público da imagem de dois técnicos da Electra sem inquérito algum tivesse sito feito das condições específicas de um particular apagão mostra o quão perigosamente longe se foi no esforço de manipular os caboverdianos. Os partidos da oposição aceitaram os resultados das eleições mas isso não significa que a democracia caboverdiana está de boa saúde. O abuso dos recursos do estado, a disponibilidade em dar golpes da mão e em intimidar e a explorar escandalosamente os mais vulneráveis da sociedade não vaticina nada de bom. Não obstante todo o verniz de respeitabilidade que a elite actualmente no poder cobre as suas operações e a sua governação é visível o traço profundamente anti-democrático da sua actuação e cultura política. Os ideais do 13 de Janeiro ainda estão por se realizar.
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