Nº 546 • 16 de Maio de 2012
Editorial: Baralham-se as cartas
Com a posse do novo presidente francês,
François Hollande, a Europa procura vislumbrar uma outra saída para a crise que
não seja a “pura e dura” austeridade. O efeito das medidas de contenção orçamental
em particular nos países chamados PIGS tem sido brutal. Centenas de milhares
foram para o desemprego com a recessão induzida pela diminuição brusca de
despesas públicas e cortes nos rendimentos das pessoas. As eleições francesas e
gregas colocaram um novo ênfase e uma nova urgência na procura de caminhos que
também conduzam ao crescimento. Praticamente o mundo inteiro passa por uma
encruzilhada. Saber qual o caminho a seguir para a retoma do crescimento é o
desafio que se coloca a governos e nações em todos os continentes. E não se
trata simplesmente de encontrar formas mais suaves de pagar a dívida pública e
privada que suportou a prosperidade dos anos anteriores. A globalização, o
dinamismo dos países emergentes e a natureza limitada de recursos energéticos,
minerais e de biomassa obrigam as diferentes economias a renovarem-se para se
manterem competitivas e dinâmicas. Para vários estudiosos, muito do desemprego
existente, particularmente nos Estados Unidos e na Europa, é da natureza
estrutural. Não resulta só das medidas de austeridade e do clima recessivo
induzido pela crise financeira. Tem muito a ver com a desindustrialização,
mudanças tecnológicas e o nível deficiente do capital humano. Os caminhos para
o crescimento apontam para o uso mais eficiente dos recursos, para um novo
papel do estado e adequação do ambiente regulatório e investimentos nas
infraestruturas certas. A publicação, ontem, do relatório da política monetária
do Banco de Cabo Verde com previsões de travagem no crescimento económico,
aumento da dívida pública interna e externa, e diminuição das reservas externas
confirma que Cabo Verde também se encontra numa encruzilhada. A diminuição
previsível da ajuda externa não foi compensada pelo aumento de exportações e
por mais investimento directo estrangeiro. O país deixou-se ofuscar por
demasiado tempo pelo modelo da reciclagem dos fluxos externos e não fez as
reformas necessárias para melhorar a competitividade do país. No momento da
graduação a país de desenvolvimento médio, depara-se com um ambiente
internacional deprimente e está a braços com uma dívida pública a atingir os
limites da sustentabilidade. Para muitos povos e governos impõe-se uma
alteração do rumo. Daí as mudanças eleitorais ocorridas recentemente em vários
países europeus. Em Cabo Verde não há esse sentido de urgência na mudança de
políticas. A propaganda oficial que canta maravilhas do modelo existente ainda
surte efeito e dissuade posturas críticas. O governo parece acreditar que o
pais é “too small to fail” mas a realidade das dificuldades que terá que
enfrentar a médio prazo são de facto incontornáveis, como, aliás, o são para os
outros. A exemplo do que se passa noutras paragens, há que trilhar outros
caminhos e facultar um outro tipo de liderança, mais conforme com os desafios
dos tempos.
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