Nº 545 • 9 de Maio de 2012
Editorial: Política externa: do Estado ou do Partido
As autoridades caboverdianas vêm seguido a
crise na Guiné- Bissau na sequência do golpe de Estado de 12 de Abril com muita
atenção e manifesta preocupação. Os posicionamentos públicos em certos momentos
deixaram a impressão de terem sido excessivos, demasiado reactivos ou apoiando
partes no conflito. Diferenças entre o PR e o PM a propósito da cimeira da
CEDEAO de Dakar confirmadas pela entrevista do PM à Inforpress denotam um certo
voluntarismo no tratamento de questões delicadas e complexas. Uma atitude que
provavelmente contribuiu para que a posição de Cabo Verde ficasse isolada no
contexto da sub-região. A CEDEAO tomou as rédeas da situação ao estabelecer um
período de transição democrática com a duração de um ano seguido de eleições e
de reformas nos sectores de segurança e defesa. A CPLP foi, na prática,
colocada à margem do processo quando não se deu atendimento à sua insistência
no regresso do presidente interino e do primeiro-ministro. Cabo Verde, ao
secundar o protagonismo de Angola, designadamente nas declarações do ministro
da Defesa, sem ter em devida conta as sensibilidades geopolíticas da região,
expôs-se a ser visto como parcial e de utilidade duvidosa como eventual
mediador da crise. É do conhecimento geral que as crises na Guiné não são de
hoje e têm raízes profundas. O assassinato brutal do presidente Nino Vieira, do
Chefe de Estado Maior Tagma Na Waie e de muitas outras individualidades,
nomeadamente deputados, candidatos a presidente, etc. são factos chocantes de
um passado recente que ainda clamam por esclarecimento e justiça. Encontrar
soluções para a situação complexa da Guiné não é fácil. Mas certamente que não
pode ficar pelo simples destacamento de tropas de outros países para manter a
paz enquanto ela é constantemente subvertida por ódios antigos, por uma cultura
de intriga e por ambições desmedidas de aqueles que se consideram donos do
país. A política externa de Cabo Verde deve ser política do Estado de Cabo
Verde e não a de qualquer partido que conjunturalmente esteja a governar. Não
pode ser condicionada por interesses particulares como aparentemente foi o caso
desta crise na Guiné. Sentiu-se aí o peso da relação solidária entre os
partidos no poder nos PALOP que se reclamam da herança histórica dos movimentos
de libertação. E isso teve consequências. O governo tem a responsabilidade de
formular e conduzir a política externa, mas fá-lo envolvendo os outros órgãos
de soberania, designadamente o Presidente da República e a Assembleia Nacional
em vários momentos e processos. Porque a representação externa da república é
da competência do PR, espera-se que haja um especial dever de articulação entre
o governo e a presidência da república para evitar qualquer sombra na imagem
exterior ou ambiguidade nos posicionamentos do país.
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