quarta-feira, julho 23, 2014

Igualdade das ilhas




Expresso das ilhas, edição 660 de 23 de Julho de 2014

Editorial

Um dos temas de discussão na próxima sessão da Assembleia Nacional com início na próxima sexta-feira, dia 25, tem a ver com a questão regional em Cabo Verde. Não se trata ainda de escolhas de modelos de regionalização ou de criação de autarquias supramunicipais. O que estará em causa é a composição do Conselho de Desenvolvimento Regional, uma matéria sobre a qual os sujeitos parlamentares não conseguiram chegar a acordo em sessões anteriores. A divergência está na forma de representação no conselho: se as ilhas deverão ser igualmente representadas por dois eleitos ou se a representação terá como base o círculo eleitoral ficando neste caso a ilha de Santiago com quatro e as outras ilhas com dois.
O Conselho de Desenvolvimento Regional faz parte do Conselho Económico e Social, conjuntamente com o Conselho de Concertação Social e com o Conselho das Comunidades. Pretende-se com as diferentes sensibilidades desses conselhos fazer do Conselho Económico e Social um espaço de concertação em matéria de desenvolvimento económico, social e ambiental. A representação adequada dos vários interesses nesses conselhos é fundamental para que cumpram o seu papel consultivo e de órgãos auxiliares da República. No caso do Conselho de Desenvolvimento Regional espera-se, por exemplo, que dê pareceres sobre o Plano Nacional, os planos regionais, o orçamento do estado e ainda sobre leis referentes às autarquias e às finanças locais. Os pareceres ganham um outro valor com a percepção de equilíbrio e equidade na sua formulação. Daí que a insistência do grupo parlamentar do PAICV na representação por círculo eleitoral e não por ilha peca por ser improcedente.
 Na discussão da proposta de lei na generalidade tinha-se chegado a um entendimento em que as ilhas seriam igualmente representadas. Porém, em Junho, durante a discussão na especialidade, o PAICV deu o dito por não dito e ficou em contramão com as posições dos deputados do MpD e da UCID e mesmo do próprio governo que é proponente da lei. A questão foi então adiada e será revisitada na última sessão deste ano parlamentar. Veremos se desta vez haverá acordo e a lei será aprovada. 
A representação na Assembleia Nacional segue a distribuição da população pelas ilhas. Ilhas com maior número de habitantes têm proporcionalmente mais deputados e o peso e a influência deles fazem-se sentir nas decisões tomadas. Se se quer “calibrar”essas decisões com pareceres de órgãos consultivos em matérias como planos nacionais e regionais, o orçamento e leis sobre poder local é evidente que nesses órgãos não se deverá adoptar o mesmo tipo de representação que existe no Parlamento. Aliás, é o que acontece nos parlamentos bicamerais em que a assembleia reflecte o número de habitantes por círculo e no senado normalmente existe representação igualitária de regiões ou estados.
A Constituição de 1992 ao criar o Conselho de Assuntos Regionais, uma proto-segunda câmera do Parlamento, estabeleceu o princípio da igualdade de representação das ilhas precisamente para que o processo decisório político fosse mais eficaz em traduzir o interesse geral das populações em toda a sua abrangência. A revisão constitucional de 1999 deu um passo atrás. Em vez de evoluir o Conselho de Assuntos Regionais fê-lo regredir, integrando-o no Conselho Económico e Social enquanto Conselho de Desenvolvimento regional com basicamente as mesmas competências. Mas parece óbvio que a composição com base na igualdade de representação das ilhas devia manter-se.
O debate sobre a descentralização está na ordem do dia. Todos os partidos passam a ideia de concordar com a ideia de regiões, discordando quanto ao formato a adoptar. Entretanto, começam a surgir dúvidas se as competências das futuras autarquias regionais estarão à altura dos desafios que se colocam neste momento às populações nas ilhas. Num outro registo, o Governo deu sinais de querer explorar estruturas inframunicipais em resposta a certas necessidades particularmente de comunidades pequenas e isoladas. Outros querem regionalização para se conseguir redistribuição mais equitativa dos recursos do Estado. Mas já se ouvem vozes de que a criação de regiões não será suficiente para combater as assimetrias nacionais. E há que mexer também no centro do sistema político.
De vários quadrantes surgem vozes, ainda limitadas, que até já falam em bicameralismo. No actual ambiente de debate, de paixões e também de esperanças, a posição do Paicv quanto à composição do Conselho de Desenvolvimento Regional vem completamente contracorrente. Espera-se que sintam isso e que na próxima sessão da Assembleia Nacional aceitam o princípio da igualdade das ilhas.

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