JORNAL 669 DE 24 DE
SETEMBRO DE 2014
A mexida no governo aparentemente não
satisfez a ninguém. Esperava-se uma remodelação do governo e saiu o que o Sr.
Primeiro-ministro chamou de “ligeiras mudanças” no elenco governamental. Na
falta de uma explicação clara dos motivos, ficou a pairar no ar um sentimento
misto de confusão e frustração mesmo entre próximos do partido no governo. A
expectativa de uns tinha sido de que finalmente se ia imprimir um outro rumo ao
governo para fazer face ao crescimento raso da economia e ao vasto desemprego
que afecta em particular jovens e mulheres e também aos problemas sociais que
se vêm acumulando e ameaçam a tranquilidade de todos. Outros mais envolvidos na
luta partidária interna queriam ver um terreno político mais nivelado entre os
candidatos à liderança do partido sem as eventuais vantagens que cargos
governamentais podem proporcionar. Compreende-se, porém, as opções do PM se
forem vistas não como uma tentativa de reorientação governativa mas sim como
actos de gestão política numa perspectiva eleitoral de curto prazo.
Nas últimas semanas os sectores de energia e
pescas foram alvo de críticas azedas de vários extractos da sociedade.
Descrédito ameaçou cair sobre o governo quando contínuos problemas no
fornecimento de energia e água pela Electra em várias ilhas desmentiram as
declarações do PM, feitas pomposamente no debate do estado da nação, dando
como ultrapassados os problemas da Electra. Também prejudicial à credibilidade
do governo foi a indignação de muitos perante os termos do acordo de pescas
assinado com a União Europeia. A demissão dos membros do governo ligados a
esses sectores serviu claramente para conter o desgaste político que estaria a
verificar-se.
Na remodelação aproveitou-se ainda para
fazer outros reajustes e preencher lugares no governo mas a preocupação
central continuou a ser de gestão política com cunho eleitoral forte.
Pretendendo responder à situação actual caracterizado por baixo investimento
privado e empresas em sérias dificuldades, criou-se o ministério de
investimento e desenvolvimento empresarial como se a designação fosse
mágica suficiente para eliminar todos os obstáculos à iniciativa individual e à
actividade do sector privado. No anterior ministério de crescimento e
competitividade a mágica não teria funcionado. Despois de mais de dez anos
de actividade, a competitividade do país continuou demasiado baixa (114º em 148
países) e o crescimento médio no último quinquénio não passou de 1,5% do PIB.
No mesmo sentido, a nomeação de um jovem no início da carreira profissional e
política para o cargo de ministro da Presidência do Conselho de Ministros
encarregue da coordenação intergovernamental só pode estar a responder a
objectivos de natureza partidária ou eleitoral. Dificilmente no ano e poucos
meses que restam do mandato conseguirá trazer maior funcionalidade aos vários
departamentos sob a direcção e supervisão do governo.
A frustração geral que se seguiu ao anúncio
das mudanças no governo resulta da constatação que não se deu o passo que os
tempos exigem. Há um sentimento de que algo sério, profundo e consequente tem
que ser feito para se sair do marasmo actual. A percepção é que o governo
continua num frenesim ocupando a comunicação pública com anúncios, propostas e
inaugurações mas as coisas continuam a não bater certo. Para além da fraca
dinâmica da economia e da falta de emprego, há preocupação com a insegurança no
dia-a-dia, as insuficiências nos cuidados de saúde, a inadequação do sistema
de ensino ao mercado de trabalho, a insensibilidade da administração pública na
relação com utentes, o centralismo excessivo, as ilhas em processo de
marginalização, e os múltiplos problemas sociais que se percebe por debaixo da
superfície aparentemente “conformada com a sua sorte” de muitas comunidades.
Organizam-se fóruns, workshops, anunciam-se
clusters, assinam-se pactos de emprego, faz-se formação e no país não acontece
nada de fundamentalmente diferente. Investimentos de milhões em infrastruturas
e outros milhões em programas diversos de capacitação não conseguem posicionar
o país para crescer a um ritmo que lhe permita criar emprego de qualidade e
prosperidade para todos. Esgotou-se praticamente a capacidade do Estado em
endividar-se para manter os investimentos públicos e mesmo assim não se
conseguiu criar as condições para que o investimento privado nacional e
estrangeiro aconteçam em ritmo e volume desejáveis para o substituir.
Depois do tudo o que foi feito nesta década
e meia do século XXI o país funciona ainda no quadro de reciclagem de ajuda
externa. O modelo está esgotado mas não se sabe como deixá-lo e partir para
outro. O pior é que aparentemente a preocupação maior não é procurar uma saída
e mover o país para fora deste atoleiro que no ano passado só lhe deixou
crescer a uma taxa de 0,5%, mas sim ganhar mais cinco anos de poder nas
eleições de 2016.
Naturalmente
que as pessoas estão confusas. Esperam uma resposta da classe política e em
particular de quem governa. Sabem que alternativas só virão com as eleições.
Até lá quem tem os instrumentos e os recursos para governar deve saber
mobilizar a vontade colectiva e dirigi-la para a concretização de objectivos
que a todos sirvam directa ou indirectamente. Pena que o eleitoralismo reinante
impeça a troca de ideias e o necessário debate para se identificar saídas para
a situação actual.
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