A evolução positiva nas projecções denota algum optimismo quanto às
perspectivas de crescimento do país no futuro próximo. Comunga de optimismo
similar o Banco de Cabo Verde que no Relatório de Política Monetária publicado
também no mesmo dia coloca o crescimento económico no intervalo 3,5-4,5% do PIB.
Entre as múltiplas razões para o maior crescimento estará certamente a actual
conjuntura de aceleração da economia mundial. O referido relatório do FMI põe
uma taxa de crescimento de 3,9% para 2018 e para o próximo ano. O problema com
esta conexão forte com a dinâmica mundial é que se ela perder o ritmo as consequências
poderão tomar a forma de choque externo para o qual o país a braços com uma
dívida pública pesada e na posse de uma base produtiva frágil e de limitada
capacidade de exportações de bens e serviços dificilmente estará em condições
de encaixar devidamente.
Christine Lagarde, a directora-geral do FMI
numa intervenção na Universidade de Hong Kong, sexta-feira passada, congratulou-se
com o forte crescimento de que beneficiam as grandes economias e também os
países emergentes, mas chamou a atenção para os riscos que já se despontam no
horizonte e que poderão em dois anos provocar uma perda de dinâmica com
consequências para todos. Identifica riscos financeiros e fiscais, riscos
geopolíticos e também o risco de guerras comerciais desencadeadas por medidas
proteccionistas tomadas por iniciativa própria ou em retaliação a barreiras
colocadas pelos outros. Por isso mesmo aconselha que de imediato todos os
países se esforcem nesta conjuntura de “vacas gordas” para fazer as reformas
necessárias para, por um lado, aumentar o potencial de crescimento das
respectivas economias e, por outro, criar “almofadas” que lhes permitam ser
mais resilientes face a choques externos. Conselhos que deveriam ser óbvios se,
de facto, não existisse a tentação permanente de politicamente se cavalgar os
bons tempos, adiar reformas urgentes e alimentar a ilusão que a bonança irá
continuar sem necessidade de grandes mudanças.
O governo de Ulisses Correia Silva pôs como
objectivo fazer o país crescer no mínimo a 7%. Até agora só se conseguiu atingir
taxas de 3,8% em 2016 e 3,9% em 2017. Para 2018 a estimativa do BCV vai até 4,5
% do PIB, enquanto o FMI fica pelos 4,3%. A opinião de alguns economistas entre
os quais o ex-governador do BCV, Carlos Burgo, é que o país está a crescer
em torno do seu potencial. Crescer mais do que isso deverá implicar
primeiro aumentar o potencial. E isso consegue-se com reformas profundas,
investimento na capacitação da mão-de-obra e um esforço dirigido para aumentar
significativamente a eficiência global da economia com particular enfase na
diminuição dos custos de contexto, diminuição do custo de factores e melhorias
significativas nos transportes marítimo e aéreo. Também é fundamental que se
mantenha a atitude de abertura ao mundo na perspectiva de diversificar trocas
comerciais, atrair investimentos, aumentar fluxos turísticos e aproveitar as
oportunidades que a criação de cadeias de valores globais propiciam. Se isso é
verdade para a generalidade dos países mais é para uma pequena economia e num
país arquipelágico com diminuta população como Cabo Verde.
Infelizmente muito do discurso político que é
aqui feito não é dirigido para colocar em devida perspectiva os problemas com
que o país se depara para ultrapassar as suas ineficiências, melhorar a sua
conectividade, ser competitivo e capacitar os seus jovens e toda a população.
Isto é ilustrado quando, no processo de busca de soluções a discussão fica pela
troca de epítetos como foi recentemente evidenciado pelo esgrimir de expressões
como “neoliberalismo” e “socialismo escalavrado” que nada
explicam e nada ajudam a resolver. O mesmo acontece quando se traz à baila a
questão da diminuição dos custos da máquina do Estado, invariavelmente aparece
um líder político a propor cortes, no número de deputados ou no número dos
membros do governo. Parece que há vantagem junto ao público de se apresentarem
como anti-políticos e anti-partidos. Entretanto a necessidade real de diminuir
as ineficiências do Estado e aumentar a sua eficácia perde-se na demagogia e no
populismo com que questão é tratada. Também nota-se algo similar quando face ao
problema sério de uma cultura burocrática, centralizadora, hostil a negócios
que se manifesta a todos os níveis do aparelho do Estado e da administração
local responde-se com a regionalização erigida em autêntica panaceia para todos
os males.
Entre os caminhos a não seguir na resposta a
choques externos Christine Lagarde aconselha vivamente que se evite o proteccionismo
particularmente na forma de tarifas alfandegárias. Ela diz que a História
mostra que restrições de importação fere toda gente, especialmente os
consumidores pobres. Acrescenta que “não só levam a produtos mais caros e
limitam escolhas, mas também impedem o comércio de desempenhar o seu papel
essencial em impulsionar a produtividade e disseminar tecnologias. No
processo, diz ela, mesmo as indústrias
protegidas acabam por sofrer à medida que se tornam menos dinâmicas do que os
seus concorrentes estrangeiros”. A recomendação visa travar tendências em
inverter o já conseguido nas relações de comércio internacional que até agora
possibilitaram o crescimento sem precedentes do volume de transacções mundiais
e com vantagens globais.
Este e outros problemas e soluções deviam
merecer a atenção de todos visto que o está em causa é a viabilidade e a sustentabilidade
de todo o desenvolvimento do país. A manter-se porém o discurso nos termos
descritos e por todos conhecido a tendência será a sociedade polarizada ficar
dominada pelo discurso partidário que afasta muitos que numa outra situação
poderiam participar activamente na procura de soluções. Perdem as pessoas,
prejudica-se a sociedade e adiam-se os problemas. Com o país numa encruzilhada
devia ser aparente que não há tempo a perder e que o diálogo a todos os níveis
deve ser encetado para que seja encontrada a melhor via para resolução de
problemas. Espera-se que com o alerta do FMI cresça um sentido de urgência no
que deve ser feito e que as forças políticas saibam encontrar formas de alargar
o debate e colaborar no que for estruturante para o país e contribua para seu futuro.
Humberto Cardoso
Texto originalmente publicado na edição
impressa do Expresso
das Ilhas nº
855 de 18 de Abril de 2018.
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