Antes do início da revolução egipcía, na vizinha Tunísia a população em manifestações de rua já tinha provocado a fuga do presidente Ben Ali. O despoletar do movimento popular fora o acto imolação dum jovem desesperado por ver que mesmo com diploma universitário não conseguia emprego e a polícia não o deixava vender frutas e vegetais nas ruas para sobreviver. Muitos Milhares de jovens não só na Tunísia como em muitos outros países árabes como a Jordânia, a Argélia, Iemen e Marrocos reviram-se no drama desse jovem que tinha formação mas não era "empregável".
O efeito de contágio do movimento democrático iniciado na Tunísia e que ameaça quase todas as capitais árabes faz lembrar o grande movimento que,na sequência da queda do Muro de Berlim em 1989, fez cair em cadeia regimes totalitários e autoritários, em todos os continentes. Na época Cabo Verde foi um dos que se juntaram a esse movimento universal para a liberdade e democracia e pelo direito a uma vida melhor, posicionando-se a partir daí no caminho da modernidade e do progresso.
A situação de muitos desses países mostra que só vestir as roupagens da modernidade sem adquirir os instrumentos que permitem potenciar o capital de recursos humanos leva à estagnação traduzida em taxas de crescimento anémicos e em incapacidade de resposta ao problema grave de desemprego. Agrava as coisas a percepção da crescente desigualdade social evidenciada por uma pequena elite com casas e carros faustosos a par de uma população numa luta permanente para sobreviver com o pequeno salário que dispõe. O impacto do aumento dos preços desde do último trimestre do ano passado em produtos alimentares e combustíveis não deixou às pessoas uma outra escolha que não sair à rua para mudar o regime.
Por todo o mundo regimes autocratas seguem com muita atenção o que se passa. Os males que fizeram o povo insurgir-se estão todos lá: repressão, corrupção, baixa responsabilização dos governantes e crescente desigualdade social. Notam que as tentativas de repressão e de neutralização dos movimentos populares têm falhado. No Egipto chegou-se mesmo a provocar um "apagão" na internet para evitar que os revoltosos fizessem uso das redes sociais para se comunicarem e coordenaram o movimento. Nalguns países mais ricos subsídios de mais de 2 mil euros estão a ser oferecidos para acalmar as pessoas. Entretanto muitos estão a aprender que endurecer o regime não é solução.
Para Cabo Verde, com desemprego elevado particularmente entre os jovens e a aumentar precisamente na camada com liceu completo e com licenciatura, a situação socialmente explosiva desses países deve constituir um aviso sério. Ignorar a seriedade da questão ou procurar contorna-la pela via de prosperidade ilusória proporcionada por recursos externos seja na forma de ajuda, ou pior na forma de dívida só adia o problema sem o resolver. Espera-se que o novo governo retire as devidas ilações dos anos passados de perda de oportunidades e invista de forma séria na qualidade do ensino para que os jovens tenham a formação que os pode fazer globalmente competitivos e não caírem no desespero.
Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 16 de Fevereiro de 2011