domingo, abril 10, 2011
Democracia: consolidação difícil
quarta-feira, abril 06, 2011
Democracia do consenso
Flashes do Programa do Governo
“Terá de haver um consenso entre os partidos políticos, o parlamento, o governo e a presidência [da república] sobre onde estamos e onde vamos.”
“O consenso e a colaboração entre todas as partes interessadas nacionais chave são a única maneira de fazer face ao desafio levantado pela situação difícil externa”.
A plataforma do PAICV sufragada pelo povo constitui a matriz programática para a Governação(…)”. “(…)a elaboração do Programa de Governo é um momento importante, de participação e debate, num processo partilhado e da responsabilidade de todos.
“Os partidos podem competir sobre ideias. Podem competir a muitos níveis mas nós temos de estar unidos sobre onde queremos chegar (…)”
“(…) o desenvolvimento e a transformação genuína não podem ser oferecidos pelo governo ao povo”.
“A democracia e o desenvolvimento são co-responsabilidade do governado e do governo”.
Engajaremos o povo, as organizações da sociedade civil e o sector privado. A colaboração será maior do que o diálogo.
Papel das câmaras municipais
“Têm de estar na mesa quando os problemas são definidos, os objectivos estabelecidos, as estratégias formuladas e os planos de acção propostos de modo a que possam ser entusiásticos membros da equipa aquando da implementaçãosexta-feira, março 25, 2011
Não há mais tempo a perder
O novo governo tomou posse perante o Presidente da República no dia 21 de Março. É o início de um terceiro mandato que tudo leva a crer vai ser um mandato difícil. A situação económica e política internacional continua instável, de contornos pouco claros e imprevisível quanto à sua evolução futura. E Cabo Verde, a partir de 2013, vai ter de confrontar-se com maiores exigências no acesso a financiamentos concessionais e a mercados preferenciais derivadas da graduação a país de rendimento médio.
A crise internacional em Setembro de 2008 encontrou o País com uma economia pouco diversificada e cada vez mais dependente do turismo. Nos anos da euforia pré-crise verificara-se um surto de investimento directo estrangeiro dirigido fundamentalmente para o sector do turismo e da imobiliária turística. Em consequência, Cabo Verde cresceu mas não o suficiente para criar o número de empregos necessários. Com a crise, a situação social degradou-se. A perda de postos de trabalho na construção civil e nos serviços ligados à actividade turística não foram contrabalançados por emprego criado directa ou indirectamente pelas obras de infra-estruturação feitas com recurso a linhas de crédito estrangeiras.
Na avaliação da competitividade de Cabo Verde pelo Forúm Económico Mundial (117º lugar em 139 países) ficaram evidentes os constrangimentos que ainda se colocam à economia, retirando-lhe eficiência e mantendo baixa a produtividade. Esses constrangimentos mostram-se ainda nos resultados aquém dos desejados conseguidos das apostas do Governo em fazer de Cabo Verde uma praça financeira internacional, um hub aeroportuário e um centro para o transhipment e ainda uma cyber island. O facto das metas propostas pelo Governo para o crescimento do PIB e para o desemprego não terem sido atingidas, mesmo considerando a crise, apontam para sérias dificuldades em lidar com a economia real.
Diferentemente do que aconteceu na generalidade dos países, em Cabo Verde, a crise não foi motivo de grande reflexão e preocupação mesmo quando de crise financeira passou a crise económica e depois a crise social com desemprego generalizado. Hoje é crise da dívida soberana afectando os principais parceiros de desenvolvimento. Apesar disso o País, protegido segundo o Governo por blindagem segura, como que ficou acima, pairando sobre dificuldades que só pareciam atingir os outros. O período eleitoral serviu para camuflar a situação, em vez de ser razão para uma discussão aprofundada e séria de como o País se devia preparar para o pós-crise.
Muitos esforçaram por dizer que não havia necessidade de arrepiar caminho e de ter uma outra atitude em relação ao desenvolvimento. Insistiu-se em manter o rumo e a ideia passou. Hoje, já depois das eleições, é o próprio Primeiro-Ministro que vem informar o país que se vive “tempos de grandes incertezas e de grandes riscos”. E que “a crise vai perdurar” e “a subida dos preços dos combustíveis e dos produtos alimentares vem agravar esse quadro”. Mas os sinais enviados na apresentação da estrutura do Governo e nas nomeações feitas em sectores chaves como a economia e o desenvolvimento do capital humano não auguram mudanças significativas. E sem uma nova abordagem dificilmente poder-se-á enfrentar com sucesso os desafios actuais.
Passado o período da polarização eleitoral, os caboverdianos esperam que o governo assuma que tem um mandato de cinco anos para colocar o país numa base sólida de crescimento com mais emprego, mais rendimento e mais qualidade de vida. E que não deve condicionar a sua agenda às outras eleições e desperdiçar tempo precioso que o País precisa para se preparar para os tempos difíceis que aí vêm.
Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 23 de Março de 2011
terça-feira, março 22, 2011
Ao serviço do consumidor
domingo, março 20, 2011
Triunvirato na direcção do Estado
A intenção de levar para o Estado a cumplicidade política que sempre existiu entre o Presidente do PAICV e os seus dois vice-presidentes Manuel Inocêncio e Basílio Ramos coloca problemas sérios. O sistema político tem como fonte de legitimidade directa as eleições partidárias para a Assembleia Nacional e a eleição suprapartidária do presidente da república. Da configuração de forças no parlamento extrai-se uma solução de governo completando o trio de órgãos de poder político na área de soberania. A relação entre esses órgãos orienta-se obrigatoriamente pelo princípio constitucional de separação e interdependência dos poderes. Assim, a actividade legislativa do Governo e do parlamento é controlado via o exercício do poder de promulgação do presidente da república que pode vetar os diplomas apresentados. O governo e o parlamento são concorrentes na produção das leis mas à A.N. é reservada de forma absoluta competência para legislar sobre certas matérias. À oposição no parlamento é dado o poder de bloqueio com a exigência que matérias bem determinadas exigem maiorias qualificadas de dois terços dos deputados para serem aprovadas. Ao PR, ao PM ao Presidente da A.N. e a outras figuras do Estado como o Procurador Geral da República e ao Provedor de Justiça faculta-se a possibilidade de recorrer directamente ao Tribunal Constitucional a para fiscalização da constitucionalidade das normas. A par da actividade legislativa, o parlamento fiscaliza o Governo e a Administração Pública, podendo instaurar inquéritos basicamente sobre qualquer matéria . O PR por seu lado, exerce ainda o seu papel moderador do sistema no seguimento que dá às propostas do Governo de nomeação de personalidades para altos cargos do Estado. No funcionamento do sistema é de maior importância que haja lealdade institucional, mas não cumplicidade. Cumplicidades roubam os órgãos de soberania da sua autonomia e do poder de fazer “checks and balance” ao sistema. A cumplicidade de semanas atrás em que se viu a A N a esconder o veto do PR para depois vir dizer que não havia tempo para confirmar diplomas aprovados pela unanimidade dos deputados, deixou mal o presidente da república e o parlamento. As instituições falharam por razões de pura conveniência política. O plano do PAICV de transpor o triunvirato do partido para os três órgãos de soberania traz consigo o perigo de se ver repetidos episódios como o do veto presidencial. É o que acontece quando esbatem-se os contornos e os limites de actuação de cada um deles. A dinâmica do sistema pressupõe uma certa tensão que não deve desenvolver-se em crispação permanente nem, muito menos, quedar-se por um consenso cúmplice que rouba aos seus titulares o sentido de integridade, de dignidade e do bem servir ao país e à república. A ir-se por esse caminho restará somente a Oposição democrática para fazer o contrabalanço do sistema e manter o Estado longe das medidas discricionárias e arbitrárias que ameaçam a liberdade e a autonomia de indivíduos e colectividades públicas e privadas. Mas só a oposição não chega. Fundamental ter-se uma sociedade civil autónoma e participativa, uma imprensa livre e comprometida com as liberdades individuais e o constitucionalismo e um poder judicial independente e célere na administração da justiça. E, no ambiente assim criado, ver-se emergir todos os dias uma maior consciência individual e cívica dos cidadãos suportada no respeito pela dignidade pessoal e na valorização da honestidade e verdade.
quinta-feira, março 17, 2011
Equívocos: VIII ou V Legislatura?
terça-feira, março 15, 2011
Presidenciais: Partido impõe-se
segunda-feira, março 14, 2011
Centenário do Dia das Mulheres
Comemorou-se, no passado 8 de Março, o Dia Internacional das Mulheres. Neste ano de 2011, a celebração desse dia tem um sabor especial. Completam-se cem anos que em Viena de Áustria se instituiu este dia para relembrar a todos a necessidade de continuar a luta pelos direitos plenos das mulheres. Em 1977 a Assembleia Geral das Nações Unidas consagrou a data e hoje é festejada em todos os países.
O dia 8 de Março celebra as realizações e sucessos das mulheres nos domínios político, económico e social no passado, no presente e no futuro. Em 1911 as reivindicações das mulheres eram o direito ao voto, o direito a ter formação e não ser discriminadas. Cem anos se passaram e os ganhos das mulheres têm sido extraordinários.
Ao nível político, o direito ao voto é quase universalmente reconhecido e cada vez mais mulheres ocupam cargos de Chefes de Estado, Chefes de governo, ministros e parlamentares. Ao nível económico verificaram-se grandes avanços com o acesso generalizado ao ensino. Abriram-se-lhes as portas nos diferentes sectores da economia e posições cimeiras nas maiores empresas do mundo já são ocupadas por mulheres. Ao nível social e da família a percepção cada vez mais generalizada que o homem e a mulher gozam dos mesmos direitos tem revolucionado o papel entre os sexos e permitido que as mulheres conciliem de forma mais gratificante a vida familiar com a carreira. A disponibilidade de anticonceptivos efectivos deu às mulheres um maior controlo sobre a sua vida sexual e tornou a maternidade um acto de vontade própria e por isso de maior alegria e realização pessoal.
Infelizmente os ganhos das mulheres não são universalmente uniformes. Em muitos países as mulheres são discriminadas, humilhadas e violadas nos seus direitos e na sua integridade física. Na praça de Tahrir, na cidade do Cairo, viu-se a presença forte das mulheres na luta pela liberdade. E foi encorajador e certamente que inspirou em muitas outras mulheres por todo o mundo a enfrentar as forças que ainda as aprisionam e as ofendem na sua dignidade. A violação de uma jornalista da televisão americana CBS nessa mesma praça mostra que a possibilidade de abuso e de regresso a formas de humilhação existe e há que manter uma vigilância e uma pressão permanente para controlar comportamentos desviantes.
Neste dia 8 de Março a nossa solidariedade deve ser dirigida para todas as mulheres que ainda sofrem por razões do seu género, em particular para as que nas zonas de guerra são vítimas de violações brutais, e para as que em todos os continentes são reduzidas à escravidão e lançadas na prostituição.
Em Cabo Verde avanços extraordinários foram já feitos na defesa dos direitos das mulheres e na criação das condições para a uma vida plena a todos os níveis. O advento da democracia traduziu-se num salto qualitativo na participação das mulheres designadamente ao nível político e empresarial. As potencialidades de milhares de jovens meninas e mulheres foram desenvolvidas com generalização do ensino secundário para todos os pontos do país e o acesso cada vez maior ao ensino universitário. O país em todos os domínios já sente a contribuição substancialmente significativa propiciada pelas mulheres que no governo, no parlamento, na magistratura, nas empresas, nas escolas, nos hospitais nas fábricas, nos serviços se destacam pela sua capacidade de trabalho, inteligência e sensibilidade.
Editorial do Jornal "Expresso das Ilhas" de 8 de Março de 2011
sábado, março 12, 2011
Paroquialismos
Os dados da Afrosondagem vindos a público na sexta feira, dia 4 de Março, chamam a atenção para um aspecto e preocupante. O carácter marcadamente local das intenções de voto nos candidatos presidenciais. Atingem valores elevados de preferência nas ilhas ou regiões de origem. O facto seria normal ou inevitável se de eleições autárquicas e mesmo legislativas se tratasse. Mas são eleições para o cargo de “presidente de todos os caboverdianos”. Há que perguntar o que poderá estar a alimentar perspectivas tão estreitas dos cidadãos. A questão da origem de candidatos a posições cimeiras do Estado tem vindo paulatinamente a público. Primeiro de forma velada e cada vez de forma mais directa. Os partidos têm resistido mais ou menos a isso na composição dos seus órgãos. Mas a pressão existe e não é ignorada. Por alguns é utilizada para dissuadir colegas de perseguir certas posições. Para outros é uma forma de forçar avanços na carreira porque se dizem representativos da “ilha maior”. O Engenheiro Manuel Inocêncio, segundo ele próprio, foi confrontado com questões acerca da viabilidade da sua candidatura por ser originário de S.Vicente. Agora parece que as sondagens vêm confirmar as preferências fortemente regionais. O Dr. David Hoffer Almada tem a preferência de Santiago Norte, o Eng. Inocêncio é forte em S.Vicente e o Dr Aristides Lima na Boavista e no Fogo. Estas tendências contrariam o que foi normal noutras eleições presidenciais, a começar pela primeira eleição em 1991 em que a questão da origem do candidato nunca se colocou. Como aliás nunca se põe nas democracias com consciência profunda da nação. Em Cabo Verde também não devia ser um problema. Muito antes da independência, já existia a ideia do caboverdiano e da caboverdianade, não obstante as especificidades reconhecidas das ilhas. Não havia à partida razões para tensões entre as ilhas. Muito menos que disputas procurassem expressão política no acesso privilegiado a lugares cimeiros do Estado. O desagregar de uma certa noção da unidade da nação poderá ser efeito do esforço de centralização em curso no país. Centralização provoca desigualdade entre as ilhas tanto na repartição de recursos como na criação de oportunidades. Em consequência, desertifica em termos humanos umas ilhas em favor de outras. Provoca sentimentos de abandono que são aproveitados em discursos populistas que reforçam a perspectiva local e perpetuam a frustração. Em contrapartida, onde o Poder reside a arrogância cresce e faz-se ouvir. O resultado é o enfraquecimento da ideia da nação com o aparecimento de tendências hegemónicas e a perda da diversidade que sempre caracterizou a caboverdianidade seja na índole das suas gentes seja ainda, na língua, na música e nos costumes.
sexta-feira, março 11, 2011
Precipitação?
Para qualquer observador, parece apressada a tomada de posição da direcção nacional do MpD em relação às eleições presidências. Pela via da revisão constitucional de Fevereiro de 2000 optou-se por separar as duas eleições legislativas e presidenciais por um período de seis meses. O objectivo era evitar o contágio de uma eleição pela outra e assim acabar com a quase inevitabilidade do Governo e do presidente da república virem sempre do mesmo quadrante político. As necessidades de equilíbrio, arbitragem e moderação no sistema político podiam ser melhor satisfeitas retirando esse quase determinismo nos resultados eleitorais. Os partidos, face aos resultados eleitorais das legislativas, teriam tempo para melhor decidir quanto às presidenciais que viriam depois. Naturalmente que para o partido vencedor o ideal é manter viva a euforia da vitória para, meses depois de governação, conseguir galvanizar os eleitores e eleger um presidente da sua escolha. Por isso apressa-se a escolher o seu candidato com um mínimo de atrito interno e rapidamente reúne o partido a sua volta para limitar perdas no suporte de militantes e eleitorado. Uma outra abordagem tem os partidos vencidos. Não estão no governo, interessa-lhes um maior equilíbrio do sistema político e sabem que o tempo pode jogar a seu favor. Nos meses que se seguem pode-se verificar o desencanto de certos eleitores devido ou a promessas que tardam em ser cumpridas ou a sinais de excessos do novo governo que indiciam que lhe faria muito bem ter um travão na presidência da república. Na expectativa de lidar com um cenário político diferente do que tiveram nas legislativas os partidos na oposição analisam as razões da derrota e procuram de entre as individualidades disponíveis o candidato que melhor perfil tem para prevalecer sobre outros candidatos na nova conjuntura política. E aí não tem razões para pressas desnecessárias. Por isso, que a decisão da DN em analisar a questão presidencial surpreende primeiro, porque não estava inicialmente agendada e depois porque dificilmente se descortina razões para antecipar ao PAICV numa matéria dessa natureza. A publicação das sondagens da Afrosondagem mostrando candidatos do mesmo quadrante político do MpD em clara desvantagem em relação aos do PAICV devia ser motivo para um compasso de espera. E outros estudos de opinião poderiam, entretanto, ser feitos com vista a uma decisão final mais abalizada, menos apaixonada e mais consensual.
quinta-feira, março 10, 2011
Pulsão para denegrir o Poder Local
terça-feira, março 08, 2011
Cumplicidades, dez anos atrás
As várias cumplicidades à volta do veto presidencial, designadamente a não publicidade do veto, a não fundamentação do mesmo, a sonegação de informação, as ausências para não decidir e, finalmente, as desculpas esfarrapadas para não deliberar fazem lembrar acontecimentos de há dez anos atrás. Também estava-se perto do fim da legislatura e o PAICV tinha saído vencedor nas eleições legislativas. No dia 1 de Fevereiro de 2001, a meio da campanha eleitoral presidencial, o então presidente Dr. Mascarenhas Monteiro resolveu empossar um governo do PAICV. A legislatura não tinha terminado. Só viria terminar no dia 13 de Fevereiro com a sessão constitutiva da nova Assembleia Nacional. O País viveu um caso inédito de ter um governo que não correspondia à configuração de forças políticas no parlamento. De facto o MpD ainda detinha maioria absoluta e um governo que não fosse por ele formado não sobreviveria à moção de confiança necessária para ser um governo pleno e não de gestão. O então PR resolveu o problema jogando com os prazos. Empossou o governo do PAICV 13 dias antes do fim de legislatura mas ainda com uma folga de mais dois dias para completar os 15 dias do prazo de apresentação do seu programa do governo. De modo que quando o Paicv veio solicitar confiança para o seu programa já encontrou um parlamento cuja configuração de forças políticas lhe era favorável. O facto é que o então PR contornou o estipulado na constituição para a transferência de poderes na sequência das eleições legislativas. A Constituição é clara: Vinte dias depois de publicados os resultados eleitorais no Boletim oficial, inaugura-se uma nova legislatura na sessão constitutiva da nova assembleia nacional. O governo até ao momento em pleno uso das suas competências, demite-se automaticamente e passa a governo de gestão. Condição essa que irá manter até ser exonerado pelo presidente da república no mesmo momento em que é empossado o novo governo. Este, por sua vez, entra em gestão e só inicia efectivamente o mandato com a apresentação do programa ao parlamento e aprovação da moção de confiança. Em Fevereiro de 2001 a conveniência reinou. O então PR, em entrevista posterior, desculpou-se dizendo que o ex-primeiro- ministro, Dr. Gualberto do Rosário, pedira demissão e ele “não mandou arquivar”. Assim, mesmo sabendo que o Governo do MpD ficaria demitido automaticamente no dia 13 de Fevereiro com a nova legislatura, optou por exonerar o Dr. Gualberto do Rosário e empossar o Dr. José Maria Neves como Primeiro-ministro. Precisamente a meio de eleições presidenciais que viriam a ser declaradas ganhas pelo candidato apoiado pelo PAICV, por apenas 12 votos. Claro que é absolutamente legítimo perguntar-se até que ponto a posse do Governo antes de tempo e a meio da campanha influenciou os resultados das presidenciais. Particularmente quando se sabe como o Governo do PAICV moveu-se logo a seguir a sua posse. Fulgurantemente moveu-se para controlar a polícia, o processo eleitoral e a rádio e televisão. Os pontos nevrálgicos que todos que querem o poder ou querem projectar uma imagem de força ocupam para tornar bem visível o domínio que têm sob as coisas, as pessoas e os processos. Sabe-se o que aconteceu depois.
sexta-feira, março 04, 2011
Transparência nos assuntos do Estado
No Estado de Direito democrático exige-se publicidade dos actos dos órgãos de soberania. Assim é porque transparência na esfera pública é fundamental para se salvaguardar direitos fundamentais dos cidadãos, para se certificar que o Estado age de acordo com a lei e para se fiscalizar e responsabilizar os governantes. No mesmo sentido vai a consagração do princípio de separação e interdependência de poderes dos órgãos de soberania para se evitar concentração e abusos de Poder.
O veto do Sr. Presidente da República ao Estatuto dos Magistrados Judiciais e ao Estatuto dos Magistrados do Ministério Público não foi objecto de anúncio público por iniciativa da presidência da república. A Assembleia Nacional, o destinatário da mensagem do presidente da república falhou, por mais de duas semanas, em dar conhecimento aos deputados e ao público em geral da devolução dos diplomas vetados. Depois de se conhecer a mensagem do Presidente da República o país ainda está por saber quais os fundamentos do veto político.
A reforma da Justiça, por todos aplaudida, comportava um pacote de cinco leis a saber: A lei de Organização e funcionamento dos tribunais judiciários, a lei orgânica do Ministério público, a Lei de organização e funcionamento do Conselho Superior da Magistratura e os Estatutos dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público. Para se conseguir acordo sobre a reforma de justiça os partidos políticos levaram dois anos em negociações árduas. De permeio fez-se uma revisão constitucional para clarear obstáculos significativos no caminho da instituição de um sistema judicial livre de interferência política e com juízes seleccionados na base do mérito e com recurso a concurso público.
Vetos do presidente da república são instrumentos necessários de equilíbrio e moderação do sistema político. Perante leis por promulgar o PR pode recorrer à fiscalização preventiva de constitucionalidade se tem dúvidas em relação à constitucionalidade das normas aprovadas. Noutras situações o PR pode vetar na base do que os entendidos chamam de “não conformação política” dos diplomas. Em todos os casos o veto é fundamentado para que o órgão legislativo, a Assembleia Nacional ou o Governo, ajam para confirmar ou fazer as alterações necessárias.
O insólito no caso presente é, primeiro, a falta de publicidade de um acto tão importante como é veto político do Presidente da República. Segundo, é o Presidente da Assembleia Nacional e a maioria parlamentar a bloquear uma Reunião Plenária para os deputados deliberarem sobre os diplomas que tinham aprovado por unanimidade. Não pega a desculpa de que a realização das eleições legislativas de alguma forma diminuiu o actual parlamento. Assim como o governo só entra em gestão no dia 11 de Março com o fim da legislatura também o parlamento tem poderes plenos até essa data. Noutros países os parlamentos legislam normalmente durante todo o tempo até à transferência de Poder e o início de um novo mandato.
quinta-feira, março 03, 2011
Protagonismo externo deslocado
No domingo dia 20 de fevereiro o presidente Pedro Pires encontrou-se mais uma vez com o presidente da Guiné equatorial Nguema Mbasongo na ilha do Sal. O encontro, acompanhado de perto pela comunicação social estatal, mostrou o PR a protagonizar mais uma investida diplomática junto a esse país africano internacionalmente tratado como um pária. Nas palavras do PR a insistência nas relações com a Guiné Equatorial justifica-se com as potencialidades desse país e do que pode oferecer aos caboverdianos em termos de emprego, de investimento e de oportunidades de negócio. Uma linha similar de raciocínio foi seguida na aproximação feita à Líbia de Khadaffi que o levou varias vezes a Tripoli nos últimos dois anos. Os resultados não se viram e dificilmente os acordos eventualmente feitos irão concretizar-se agora que o regime autocrático vê-se ameaçado pela sublevação popular. Khadaffi está por um fio. O Nguema Mbasongo já está a tomar medidas severas de calar a imprensa nacional para não sofrer contágio do que se passa nos países do Maghreb e no Médio Oriente. Tem razões para se preocupar. O nível de corrupção e os abusos dos direitos humanos na Guiné Equatorial têm merecido repúdio geral. No ano passado a Unesco recusou-se a instituir um prémio internacional com o nome do presidente. E a CPLP não respondeu positivamente ao pedido de integração na comunidade linguística apesar da posição favorável de Cabo Verde expressa por Pedro Pires. Por tudo isso causa estranheza a visibilidade dada ao encontro do Sal dos dois presidentes na actual conjuntura de “caça” aberta a déspotas por todo mundo. Não parece que seja uma boa imagem para Cabo Verde. A condução da política externa pertence exclusivamente ao governo mas por razões não muito claras o Presidente da República envereda-se por um certo de protagonismo que aparentemente não se ajustam ao papel de simples representação externa da república que a Constituição lhe atribui. E os ganhos para o país não são visíveis como testemunham os casos citados. O envolvimento do PR na mediação do conflito da Costa de Marfim não beneficiou ninguém. Nem tão pouco faz algum favor ao país passar-se a ideia de que Cabo Verde esforça-se por associar-se a regimes como os da Líbia, da Venezuela, da Guiné Equatorial e de outros regimes autocráticos africanos. Actos do governo na condução da política interna e externa são sujeitos aos mecanismos de fiscalização política do parlamento nos termos da constituição. Se o governo se deixa ser secundarizado em certas iniciativas externas, é de se perguntar quais os motivos para isso e quem deve prestar contas dos fiascos já verificados. Solidariedades antigas construídas essencialmente para justificar mutuamente a imposição de regimes autocráticos aos respectivos povos não devem ser repetidas na nova era da democracia. Insistir nelas simplesmente sinaliza que os apetites de total controlo ainda continuam. Pior ainda, pode-se ficar a um passo de ver essas "solidariedades" transformadas em interferências externas particularmente no processo eleitoral para ajudar na vitória de governos "amigos". E isso é inadmissível. Por tudo isso accountability completa também é necessária nas relações externas.