No Conselho de Ministros da semana passada, o Governo anunciou a adopção de uma política para a imigração. Depois de anos seguidos a varrer o problema debaixo do tapete, eis que toma consciência do facto de que Cabo Verde é um arquipélago com uma diminuta população e predispõe-se a conter as consequências da imigração desregrada vinda principalmente da África Ocidental. Demasiado tarde, dirão muitos. O mal já está feito. Outros continuarão a argumentar ingenuamente que, sendo um país de imigrantes, Cabo Verde não devia opor-se também a tornar-se destino para os outros. Esquecem a condição insular do país e ignoram a descaracterização sócio-cultural que particularmente as ilhas menos populosas poderão sofrer com o crescimento rápido e não planeado de uma população não autóctone. Mas a inacção do Governo face à imigração descontrolada não foi completamente inocente. Serviu vários outros propósitos, designadamente o de justificar a falta de acções determinadas e consistentes para promover o emprego e conter a expansão da economia informal. Dizia-se que muito do desemprego entre os jovens resultava de se recusarem a trabalhar. E a prova eram os imigrantes empregados. Ao mesmo tempo romantizava-se a “economia do Sucupira” porque supostamente criava emprego. Agora, o Governador do Banco Central vem revelar que a persistência de informalidade no mercado do trabalho simplesmente contribuiu para que se adiasse a tomada das medidas indispensáveis para o tornar flexível e fazer o país mais competitivo. Aparentemente tapava-se um buraco com o trabalho precário dos imigrantes, mal pagos e sem protecção da previdência social mas outros buracos surgiam. Como ele próprio diz “a informalidade constitui um dos mais sérios obstáculos no acesso ao financiamento, limitando o investimento privado e o crescimento da economia”. Naturalmente que sem um forte ritmo de crescimento da economia não há como criar empregos. Os custos de por demasiado tempo o governo ter ignorado os problemas e os confrontar decididamente são cada vez mais evidentes. A crise de 2008 deveria ser o grande alerta. Não foi porque havia uma eleição a ser ganha e havia que manter todas as ilusões de blindagem contra a crise, de criação do salário mínimo e de se generalizar o 13º mês. O ilusionismo do Governo persiste. Continua a procura de influxos externos que lhe permitem continuar a camuflar os problemas reais do país sem preocupação com a insegurança, a desigualdade social e a marginalização das ilhas que a persistência em tal modelo de governação gera. Assim fez no passado e, apesar de o sr. Primeiro-ministro mostrar-se ultimamente preocupado com a crise, continua esperançoso que fará o mesmo no futuro.
sexta-feira, outubro 28, 2011
quinta-feira, outubro 27, 2011
Brincar esconde-esconde com a Verdade
A realidade da Crise caiu finalmente sobre os governantes caboverdianos. Mas fugas ao óbvio continuam a ser tentadas. Na entrega da proposta do Orçamento Geral do Estado à Assembleia Nacional, a ministra de Finanças justificou com argumentos morais a necessidade de contenção das despesas: não se pode utilizar o dinheiro dos contribuintes europeus para financiar aumentos salariais dos cabo-verdianos, quando nos países da UE há cortes "drásticos" nos salários. Ou seja, o governo não cumpre a promessa eleitoral do 13º mês, por “solidariedade” com os “contribuintes dos países doadores que transferem toda esta riqueza que é distribuída em Cabo Verde”. Na cerimónia da apresentação do relatório do Doing Business a posição do Sr. Primeiro Ministro é completamente outra: há que tomar 100 medidas de reformas urgentes porque agora é hora de reformas microeconómicas para continuar a garantir os fundamentais do desenvolvimento. Antes parece que os tais “fundamentais” estavam a depender da generosidade de estrangeiros e que o imperativo actual é de se pegar na economia nacional. Grave erro e muito tempo perdido, porque, como é sabido, não há equilíbrios macroeconómicos sustentáveis sem políticas microeconómicas que desemboquem em mais emprego, classe empresarial sólida, maior captação de capital estrangeiro e melhor competitividade externa traduzida em aumentos significativos nas exportações de bens e serviços. Sobre o que deviam ser as prioridades do país, o Governador do Banco de Cabo Verde lamenta no texto publicado por este jornal que “as exigências para a competitividade externa não estão colocadas na agenda e nem foram ainda comunicadas aos caboverdianos”. Resumindo, a grande simulação continua e a verdade continua elusiva. O governo mantém a esperança de poder assegurar transferências externas que tornem desnecessária aplicar-se em desbloquear a economia nacional e lançá-la para níveis mais elevados de crescimento. Quer algum crescimento, mas retrai-se perante a perspectiva de uma sociedade mais dinâmica e mais autónoma.
quarta-feira, outubro 26, 2011
Estado aumenta morosidade
Morosidade da Justiça foi o tema central das intervenções nas cerimónias do arranque do Ano Judicial e dos discursos no parlamento no âmbito do Debate sobre a Situação da Justiça. Assim foi porque cada vez mais se sente quão imprescindível é a qualidade da justiça para a manutenção de paz num ambiente de liberdade e de respeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos. Universalmente reconhece-se hoje a importância de se ter uma justiça célere e eficaz. A qualidade da democracia é preservada, os indivíduos têm as condições para partirem à busca da felicidade e o ambiente económico mostra-se atractivo para investidores e operadores nacionais e estrangeiros.
Vários factores foram identificados com sendo empecilhos a uma maior produtividade na administração da justiça. Falta de meios adequados, número insuficiente de magistrados, deficiência de formação, ausência de especialização foram dos mais referenciados. O presidente da república fez um apelo directo aos juízes para incarnarem a qualidade de servidores da justiça e mostrarem a sua segura disponibilidade pessoal para o rigor e o método, a dedicação à causa e o bom senso.
O grau da litigiosidade foi apresentado em debates na rádio e na televisão, em entrevistas nos jornais e no debate parlamentar como um factor importante da morosidade da justiça. Quando o grau é elevado, como actualmente se regista em Cabo Verde, cria um volume de processos que naturalmente sobrecarrega todo o sistema de justiça. A recomendação avançada é que se procure pela via da mediação e arbitragem evitar que muitos conflitos cheguem aos tribunais. E que pela insistência numa cultura de legalidade, entidades públicas e privadas se abstenham de usar o seu poder económico, administrativo ou político para atropelar direitos das pessoas.
Chamou particularmente a atenção o facto de muitos terem apontado o Estado, incluindo administração pública, institutos e empresas públicas como useiro e vezeiro em não cumprir na relação com utentes e trabalhadores ciente da fragilidade dos indivíduos em lidar com todas as consequências de um conflito prolongado. Parece que, maliciosamente, os agentes do Estado envolvidos nessas práticas ainda contam com a morosidade da justiça para tornar a punição ou simples abuso em algo quase permanente. É inconcebível que quando todos se esforçam por encontrar formas para diminuir a morosidade da justiça, práticas de certos sectores do Estado estejam a agravá-la com práticas ilegais e violentadoras de direitos.
As denúncias feitas, devem poder desencadear acção rápida e efectiva do governo para as investigar e pôr cobro definitivamente. O Estado deve ser pessoa de bem. Cabe ao Governo garantir que assim seja. Os cidadãos e contribuintes não podem estar a financiar um Estado que dá cobertura a actos arbitrários, discricionários e de puro abuso do poder, confiante que a justiça não funciona.
Editorial do Jornal Expresso das ilhas de 26 de Outubro de 2011
domingo, outubro 23, 2011
Voluntarismo revolucionário
Em Setembro último o Sr. PM decidiu discursar em crioulo na Assembleia Geral das Nações Unidas. Com esse acto, o PM colocou-se à frente das leis do país a começar pela própria Constituição. Em Fevereiro de 2010, a Assembleia Nacional, em sede de revisão constitucional, considerou que o Estado ainda não tinha criado as condições para oficialização do crioulo e que a língua portuguesa continuava por mais algum tempo como a única língua oficial. Perante isto, cabe ao governo criar as condições para a oficialização que conduza a um crioulo escrito e falado standard, aceite e estudado por todos. Certamente que não lhe cabe saltar etapas no processo e muito menos promover certas variantes em detrimentos de outras usando dinheiros públicos. Na ONU, até os países da CPLP tiveram que recorrer a traduções noutras línguas para compreender o representante caboverdiano. Não passaria pela cabeça de nenhum deles utilizar uma das línguas faladas não oficiais no seu país de origem para se dirigirem à comunidade internacional. O voluntarismo aí verificado não é um caso isolado. É só ver os anúncios múltiplos, escritos na rádio e na televisão de vários ministérios e outros agentes públicos num crioulo ao sabor de quem o escreve ou fala. Sempre que isso é feito discriminam-se variantes, ilhas e pessoas a favor de outrem. E usam-se recursos públicos e autoridade do Estado para o impor. A bagunça linguística não para aí. Na rádio e na televisão mesmo o português está sujeito à falta de compreensão das exigências de se ter uma língua oficial. Permitem-se na rádio e televisão nacionais locutores e jornalistas com sotaques óbvios que distorcem significativamente a língua standard. Os vícios de linguagem perpetuam-se porque não há um esforço concertado nas escolas para que as crianças sejam ensinadas a pronunciar correctamente as palavras. Deixam-se completamente os professores à vontade particularmente no ensino básico para passarem aos novos alunos as suas deficiências de pronúncia. Depois, quando ouvem repetidos na rádio esses mesmos defeitos, o ciclo fica completo e gerações são prejudicadas e possivelmente discriminadas por isso. A atitude do Estado nesta matéria tem sido de uma negligência quase criminosa. Fazer política identitária ignorando os perigos que acarreta tem sido uma tentação difícil de resistir por parte do governo. Tem uma compreensão ideológica da história e cultura caboverdiana e procura impô-la usando recursos públicos, em completa violação de princípios constitucionais que impedem que o Estado sujeite os cidadãos a “directrizes filosóficas, estéticas, políticas ou religiosas” da sua escolha. Os custos do voluntarismo são elevados. A violência que lhe é intrínseca, mantêm a sociedade em permanente crispação e não deixa que se estabeleçam as bases do crescimento sólido, consensual e inovador em todas as esferas da vida do país.
Renováveis. Custos excessivos?
Table 1.1: Estrutura de custos de aerogerador de 2 MW instalado na Europe (year 2006 €)
| Investment(€1,000/MW) | Share(per cent) |
Aerogerador | 928 | 75.6 |
Alicerces | 80 | 6.5 |
Installação eléctrica | 18 | 1.5 |
Ligação à rede | 109 | 8.9 |
Sistemas de controlo | 4 | 0.3 |
Consultadoria | 15 | 1.2 |
Terrenos | 48 | 3.9 |
Custos financeiros | 15 | 1.2 |
Estradas | 11 | 0.9 |
Total | 1,227 | 100 |
Source: Cálculos baseados em dados selecionados de instalação de aerogeradores eruropeus
sexta-feira, outubro 21, 2011
Varrer os problemas para debaixo do tapete
A quase inutilidade do debate sobre o estado da Justiça como, aliás, da generalidade dos debates no parlamento ficou patente, outra vez, ontem. Exige-se responsabilização do governo pela sua condução de todas as matérias de política interna e externa do país como é o seu dever constitucional e a reacção são manobras de diversão que acabam por esvaziar o debate. Os cidadãos, as empresas e a sociedade estão insatisfeitos com a falta da eficácia da justiça. O governo responde apontando “ganhos” designadamente em matéria de legislação, construções, equipamento, formação. Parece não importar se a disponibilização, organização e operacionalização dos meios conduzem aos fins desejados. Essa posição, no mínimo desconcertante, bloqueia a procura particularmente em sede do contraditório das razões para a ineficácia verificada. O debate vira-se então simplesmente para o apontar do dedo estéril que exacerba a rigidez ideológica e o fanatismo de uns e outros, criam uma incapacidade para pensar para além do curto prazo e faz dissolver o interesse nacional em vantagens partidárias. Em tal ambiente, as instituições a quem todos em uníssono deviam exigir maior e melhor prestação não se sentem pressionadas para mudar o comportamento. É evidente que na manutenção deste estado de coisas a culpa maior está com o governo. Quando confrontado com a falta, insuficiência ou desadequação dos resultados nas instituições que dirige ou superintende defende-se dizendo que são os funcionários e outros agentes do Estado os realmente visados pela oposição nas suas críticas. A cumplicidade assim criada retira qualquer espaço para o governo exercer liderança sobre elas e imprimir novas orientações. Não espanta, pois, que muita coisa não melhore significativamente em matéria de segurança, de contenção dos excessos policiais, de qualidade de ensino, de celeridade da justiça, na capacidade de resposta da administração e no tratamento de utentes de serviços públicos diversos. Fica ainda a percepção de que muitos problemas estão a ser varridos para debaixo do tapete, até que um dia reaparecem para assombrar e cobrar caro o esquecimento de anos.
quinta-feira, outubro 20, 2011
Tomar a nuvem por Juno
Cabo Verde subiu 10 pontos nos indicadores do “Doing Business” passando do 128º lugar para 119º em 183 países. A evolução em relação ao ano passado deve-se essencialmente ao indicador referente a registo de propriedade. Houve ainda mais uma subida no acesso ao crédito e quedas nos restantes indicadores. A posição de Cabo Verde continua a não ser boa. Continua atrás de 11 países africanos e quase 100 lugares atrás dum outro país arquipélago, as Maurícias. Não obstante, o sr. Primeiro Ministro mostrou-se satisfeito com o resultado e congratulou a equipa que o governo criou com o duplo objectivo “de melhorar a implementação das políticas e de trabalhar junto das instituições que medem os indicadores de desempenho”. A preocupação do Governo parece concentrar-se simplesmente em burilar a imagem: cria a ilusão de mudar mas na prática mantém-se dentro da mediocridade geral. Resultados espectaculares como os de Ruanda há dois anos atrás e que efectivamente atraíram a atenção dos investidores, ficam aparentemente fora de alcance. E na introdução de reformas não é de comparar o grau de dificuldades a encontrar nos dois países. Enfrentar com sucesso resistências histórico-culturais muitas vezes profundas exige visão, liderança e cultura de resultados. O sr. PM, no seu discurso, anunciou 100 medidas para, como diz ele, antecipar a crise. Medida que, vendo bem, deveriam ter sido tomadas não “ontem” mas sim “anteontem”. A dúvida que fica é se desta vez é para valer ou se é mais uma “habilidade” para ficar bem na imagem que se apresenta aos doadores internacionais. O facto de não assumir a crise, deixa a forte impressão de que toda a verdade ainda não esta a ser dita ao país.
quarta-feira, outubro 19, 2011
Novo paradigma de participação?
No sábado passado dia 15 de Outubro “indignados” desfilaram em 665 cidades do mundo. A causa próxima da indignação é a carga desproporcional das consequências das medidas de austeridade tomadas para combater a crise que 99% da população vai suportar enquanto o restante 1% fica cada vez mais rico. A desilusão cedeu lugar ao desespero, à medida que se tornavam evidentes os falhanços repetidos dos governos em debelar os efeitos da crise. A percepção geral é que muitos dos postos de trabalho perdidos não serão recuperados e o desemprego estrutural irá situar-se ao nível mais alto de sempre.
A Crise de 2008 conhece agora uma nova evolução. Começou por ser uma dívida financeira, passou a crise económica e depois a uma crise social. O amontoar da dívida soberana pelos estados que se seguiu e a incapacidade de a financiar fez implodir a confiança dos cidadãos na liderança dos respectivos países. As movimentações que se sucedem por toda a parte parecem estar à procura de outras formas de participação dos cidadãos e de escolha e responsabilização dos governantes. Pode-se estar à beira de uma mudança de paradigma com consequências profundas para os sistemas políticos existentes e seus pilares fundamentais, os partidos.
A relação entre governantes e governados certamente que será também afectada. Durante grande parte da década passada o mundo viveu com euforia anos de rápido crescimento em consequência da expansão do comércio internacional e do crédito fácil. Tudo parecia possível e muitos governos prometiam que não havia fim à vista. Fizeram-se reeleger com discursos cheios de meias verdades, com muita propaganda e com um estado despesista. Enquanto todos pareciam estar no mesmo “comboio de alegria” não se notava que uns beneficiavam mais do que os outros. Mas, quando chegou o dia de acertar contas, a verdade teve que ser dita. E foi dura. E as pessoas não perdoaram.
Em Cabo Verde, o fenómeno novo de cidadania sinalizou a sua presença durante as eleições presidenciais. Apontado por alguns como simples artifício de uma candidatura na procura de sobrevivência num ambiente político dominado por partidos, o facto é que se mostrou forte na 1ª volta e decisivo na 2 ª volta. Depois das eleições sente-se que não desapareceu.
A questão grave de energia e água, em relação à qual não se vislumbra solução nem rápida nem duradoira, constituiu um factor de aglutinação do descontentamento dos cidadãos. As pessoas sentem no ar que a exemplo do se passa com a Electra muita coisa não está a ser bem gerida no país. Contribui para isso a crescente insegurança, a precariedade no mundo do trabalho e a perda de valores que faz da solidariedade, do civismo e da honestidade palavras ocas.
Os efeitos da crise foram atenuados com infusão de fundos externos concessionais. A promessa do governo que com os investimentos feitos, particularmente nas infraestruturas, a produtividade e a competitividade do país aumentarão, o investimento privado substituirá o público como motor do crescimento e mais capital directo estrangeiro será atraído. Os indicadores porém não apontam para tais resultados. Cabo Verde poderá estar a se preparar para o tipo de choque sentido em outras paragens, quando descobriram que a sua realidade era feita de meias verdades, de propaganda e das dádivas do Estado. Espera-se que desta aterragem forçada se saia com mais vontade de agir com base em princípios, mas com pragmatismo e menos com objectivos político-partidários de curto prazo.
Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 19 de Outubro de 2011
segunda-feira, outubro 17, 2011
Estado da Justiça. O Presidente da República falou
O Presidente da República na abertura do ano judicial foi peremptório ao dizer que será um presidente sempre atento às questões de Justiça. E tem que ser. A revisão constitucional de 2010 deu-lhe amplos poderes com implicações importantes no sector judicial. São competências do Presidente da República a nomeação do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, a nomeação de um juiz para o Conselho Superior de Magistratura e do presidente desse órgão. O discurso do PR marcou pela diferença. Deixou claro o que espera dos juízes. Quer que “encarnem o espírito da Constituição, de imparcialidade face aos poderes públicos e interesses político-partidários, reputação ilibada, senso de justiça, notório saber jurídico e, sobretudo, vontade para defender a Constituição e realizar os direitos fundamentais”. Com isso o PR explicitou o que a nação espera deles e naturalmente quais as linhas de força que devem nortear na profissão que escolheram para melhor a dignificarem e nela se distinguirem. Também foi claro em dizer que “o juiz não é funcionário, mas titular de um órgão de soberania e que não deve ter preocupações de intendência sindical”. Neste ponto o PR mostrou as suas reservas quanto ao sindicalismo dos juízes, algo controverso em muitos países e proibido explicitamente noutros como por exemplo a Espanha. Um outro aspecto importante do discurso do presidente foi mostrar que a morosidade não é exclusivamente um problema intra-sistema judicial. Que está ligado ao que ele chama de litigiosidade reinante. Para o PR isso tem suas origens na ausência de uma cultura da legalidade que afecta cidadãos, empresas e autoridades públicas, conjuntamente com falta de valores, de tolerância e de responsabilidade. E apela a um maior controlo social dos actos lesivos dos direitos e interesses comuns como forma de evitar a sobrecarga do sistema judicial. Espera-se que agora, com as leis feitas, meios disponibilizados, órgãos renovados e orientações claras se aprofunde a construção do sector de justiça de forma a garantir cada vez uma justiça célere que seja protectora dos direitos dos cidadãos e um factor de competitividade do país.
sábado, outubro 15, 2011
Barraca. Os custos escondidos
O Governo mantém-se firme na sua postura de ganhar “à cabeça”. Na Boa Vista o Estado já arrecada milhões de contos anuais em vistos de turista, direitos alfandegários, IVA, e taxas de utilização dos aeroportos. Satisfeito com as receitas que centralmente vai dar uso e gastar, esquece de cobrir os custos que ainda a insuficiência de condições humanas, habitacionais, económicas provocam na ilha. A factura porém não fica “solteira” e cai sobre toda a gente na ilha. Os salários baixos dos hotéis só são possíveis num ambiente de rendas de casa altíssimas porque as pessoas vivem em barracas. Muitos lidam com preços elevados de produtos alimentares e outros porque encontram outras fontes de rendimento nem sempre as mais lícitas ou dignificantes. Potenciais empregos não são conseguidos porque as estruturas de ensino e formação adequados não existem ou carecem de insuficiências várias. A China e muitos outros países que se desenvolveram subsidiaram durante anos a fio alimentos básicos e a habitação da população que nos anos oitenta se moveu para zonas económicas especiais e a lançou para a modernidade e a industrialização. Em consequência muitos milhões ascenderam à classe média. Na Boa Vista são na realidade as pessoas que subsidiam a actividade económica para que o estado continue a tirar a sua renda à cabeça. E já há pressão para também passarem a subsidiar a AEB, pagando preços mais elevados de energia e água do que o resto do país. Quando a atitude do estado não é desenvolver, mas sim de parasitar a economia na procura de rendas, a “galinha de ovos de ouro” acaba por sucumbir. A pressão dos custos acumulados e o aparecimento de novas oportunidades e destinos fará mover os operadores. Ontem foi a ilha do Sal. Hoje é Boa Vista. Daqui a alguns anos que ilha será. Maio?
sexta-feira, outubro 14, 2011
Prioridades deslocadas
Em Setembro último o primeiro ministro inaugurou a estrada Sal-Rei Bofareira de 9 km e que custou 550 mil contos. Discursando na ocasião o PM justificou a abertura da estrada como uma “uma questão de honra”. Acrescentou ainda que a estrada tinha sido um sonho da população de Bofareira e que o destino do seu governo era “realizar os sonhos dos caboverdianos”. Facto é, porém, que Bofareira não passa de trezentas pessoas e que a nova infraestrutura fica completamente fora das zonas turísticas especiais. Ou seja a estrada é um investimento de milhões que de imediato muito pouco contribui para dinamizar a ilha, incentivar o investimento e potenciar as zonas turísticas. Mais uma vez vê-se como nas opções do governo motivações outras, designadamente político-eleitorais facilmente ultrapassam razões justificadas de desenvolvimento. São centenas de milhares de contos que vão acrescentar à já considerável dívida externa. Não são aplicados na construção do liceu, na rede de esgotos, ou ainda canalizados para amenizar a urgente situação habitacional da ilha. Muito menos são dirigidos para completar a estrada estruturante da ZDTI de Santa Mónica e Lacacão. E é pena, porque assim eventuais oportunidades com impacto directo no rendimento e qualidade de vida perdem-se neste jogo duvidoso de prioridades em que interesses político-partidários acabam por se sobrepor aos interesses de desenvolvimento da ilha. Acontece na Boa Vista e acontece também nas outras ilhas.
quinta-feira, outubro 13, 2011
Blindar contra o tráfico
No fim da semana passada a PJ caboverdiana desencadeou uma operação contra o narcotráfico que já resultou na apreensão de armas, de milhares de contos em dinheiro e de mais de uma tonelada e meia de cocaína. Os grandes valores envolvidos e a quantidade de droga encontrada mostram que Cabo Verde continua atractivo como entreposto no tráfico de droga a partir da América Latina em direcção à Europa. O sucesso até o momento da operação evidencia o nível de eficácia já atingido pela PJ. E isso é reconfortante para todos nós.
A localização geográfica que até agora não foi possível potenciar em termos de estratégia económica parece revelar-se de grande utilidade para quem procura sítios remotos e fracamente guardada para as suas actividades ilegais. A constatação deste facto, que não é de hoje, devia ter conduzido a uma discussão profunda da estrutura das forças de segurança no sentido de garantir os cerca de mil quilómetros de costa de Cabo Verde não ficassem sem guarda efectiva. Para muita gente torna-se cada vez mais urgente dotar o país de uma força de segurança vocacionada para o policiamento da costa e das águas territoriais e adaptada aos rigores e exigências das missões que tal tarefa acarreta.
Há meses que vem saindo notícias de aparecimento de pacotes de droga em vários pontos da ilha de Santiago, designadamente em Calheta de São Miguel e no Tarrafal. Tais ocorrências e o impacto que poderão ter nas comunidades que de uma forma ou outra entraram em contacto com esses “achados” devem ser monitorizados minuciosamente pelas autoridades. Servir de entreposto para o tráfico já é muito mau, mas permitir que a população desprotegida entre em contacto com mercadoria de traficantes pode trazer consequências graves e constituir um factor de aumento da criminalidade violenta.
Um outro perigo sério tem a ver com os vultuosos valores em causa. Há meios suficientes para tentar corromper pessoas e instituições. Exige-se neste momento um elevado nível de alerta contra quaisquer sinais de corrupção, particularmente de elementos da polícia e de outros serviços de controlo de entrada no país. A probidade das instituições é fundamental para se fazer face à ameaça do narcotráfico e para garantir a cooperação de entidades estrangeiras nessa luta.
A persistência de uma cultura de dependência deixa as pessoas e as comunidades susceptíveis ao suborno. O hábito já instalado de viver de favores ou de pagar dádivas recebidas com declarações públicas de gratidão e apoios políticos e eleitorais, deixa a população indefesa perante quem, munido de muito dinheiro, pede silêncio e cumplicidades várias. Agir contra a droga e contra o narcotráfico também significa respeitar e fazer respeitar o princípio da dignidade humana e esforçar-se por criar as condições para que as pessoas tenham a sua autonomia e ajam com base na sua vontade própria.
Os acontecimentos dos últimos tempos renovam a necessidade de se discutir a melhor forma de o país se preparar para enfrentar essas ameaças globais, incluindo o tráfico de droga, de armas e de pessoas. A reacção das autoridades não deve ficar por medidas pontuais. Deve ser compreensiva e estratégica de modo a blindar as pessoas e as instituições de quaisquer tentações de infiltração e corrupção. Há que cultivar valores como honestidade, diligência e perseverança como os que realmente levam à prosperidade com dignidade.
Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 12 de Outubro de 2011
quarta-feira, outubro 12, 2011
Equívocos da Mo Ibrahim
O ex-Presidente da República Pedro Pires foi galardoado com o prémio Ibrahim 2011. Segundo a Fundação Mo Ibrahim o prémio é dado a antigos chefes de Estado executivos e a chefes de Governo eleitos democraticamente que terminaram os respectivos mandatos de acordo com os limites impostos e demonstraram excelência durante o mandato. O agraciado é escolhido de entre candidatos com menos de três anos fora das funções. Independentemente do mérito da escolha, as razões apresentadas pela fundação pecam por equívocos vários. Os chefes de Estado em Cabo Verde não são executivos e não governam. O reconhecimento da prestação de qualquer presidente da república deve ter outros suportes diferentes dos citados pela fundação. “Gestão macroeconómica, boa governação e uso responsável da ajuda dos doadores para melhorar as infraestruturas, para construir a industria do turismo e para colocar em primeiro plano o desenvolvimento social” resultam, de facto, de opções e do trabalho dos governos. Da mesma forma, não se pode atribuir ao presidente da república mérito pela graduação de Cabo Verde a país de rendimento médio. No ano 2000, Cabo Verde já preenchia 2 dos 3 requisitos para a graduação. Quanto ao justificativo avançado que pesou na apreciação o anúncio que o então presidente Pedro Pires teria feito de que deixaria o cargo ao fim do segundo mandato isso não faz sentido algum. Desde as eleições multipartidárias de 91 e da adopção da Constituição de 1992 que o presidente da república em Cabo Verde só pode fazer dois mandatos. E a Constituição não pode ser alterada nesta matéria, muito menos pelo PR que no processo de revisão constitucional só lhe é reservado o papel de promulgação da lei de revisão aprovada pelo parlamento. Apesar dos equívocos, a escolha da Fundação Mo Ibrahim traz o benefício de por em devido relevo a importância de se ter governantes eleitos pelo povo em ambiente livre e plural e com mandatos fixos; a importância de se exigir responsabilização e prestação de contas pelos actos dos governos e governantes; e a importância da governação do país resultar em ganhos para a generalidade da população e não para certos grupos e personalidades à volta do poder. O prémio disponibiliza meios significativos à personalidade escolhida para de forma efectiva e ao longos dos anos promover os princípios democráticos e de boa governação que o justificaram. De todos os galardoados espera-se que, em coerência, o façam.
terça-feira, outubro 11, 2011
Embuste
O país parece estar em polvorosa com toda a gente a tentar encontrar uma solução para a Electra. Lidera este processo o governo que de tempos em tempos, particularmente a meio de graves crises de energia e água, tem novas razões para justificar a crise do sector de energia. Fá-lo não porque quer alimentar um debate público e participativo de cidadãos mas sim para desviar atenções encontrar bodes expiatórios e fazer toda a gente assumir-se como co-responsável. Mas o governo sabe quais são as reais causas: défice no investimento e custos não cobertos pela tarifa politicamente administrada. Por isso nos períodos eleitorais contrata contentores de geradores para suprir dificuldades na produção de energia e subsidia combustíveis para conter os custos da Electra. Em Fevereiro depois de ter ganho as eleições desapareceram os geradores e terminaram os subsídios. As tarifas aumentaram e todos puderam sentir o impacto completo da falta de política energética no aumento geral dos preços. Em 2000 tinha ficado assente que se deveriam investir 250 milhões de dólares até 2015. Até agora só foram utilizados 110 milhões. Com 140 milhões de dólares por mobilizar, não há gestão que aguente. E eficiência no sector só acontecerá com investimentos certos na produção e na rede de transporte e distribuição. Outrossim, para um país como Cabo Verde devia ser central a adopção de uma cultura generalizada de eficiência energética e de atitudes de poupança de água. Isso diminuiria consideravelmente a taxa de crescimento da demanda desses bens essenciais com ganhos para os consumidores e também para os produtores que assim poderiam adiar certos investimentos. As coisas correram mal porque o governo politizou sempre a questão da Electra. Depois da saída do parceiro estratégico, falhou em dar continuidade ao programa de investimentos essenciais para a sobrevivência da empresa. Falhou também em manter o público informado sobre opções possíveis no sector com os esquivos à responsabilidade, a denúncia torpe de sabotagem e o apontar de dedos aos inimigos de estimação. Acabou por cair na própria armadilha e propaganda e não sabe como deslindar-se. Entretanto as quebras sucessivas no fornecimento de energia e água criam um ambiente de insatisfação e de desconfiança em relação ao futuro. Já há quem pergunte se outros dossiers chaves do país não estarão a ser geridos com a mesma displicência.
segunda-feira, outubro 10, 2011
A Crise inexistente
O governo apresenta um orçamento do Estado de 2012 com 9.8% de défice, mais de três vezes superior ao estipulado na lei de enquadramento orçamental. A ligação do escudo caboverdiano ao euro obriga que défices orçamentais se situem à volta de 3 % e que a dívida pública não vá acima dos 60%. A dívida já a aproximar-se dos 100% do PIB ultrapassou de muito esse limite. Apesar disso a ministra mostra-se confiante e declara que a economia caboverdiana não está em crise. Provavelmente o mesmo diriam ministros e governos da Grécia, de Portugal e de outros países se não tivessem de recorrer aos mercados para financiarem os seus défices orçamentais. Mas em Cabo Verde, como diz a própria ministra, quem financia o défice são recursos externos concessionais. E os critérios para a disponibilização desses recursos não são certamente os do mercado. Não passam, por exemplo, por saber se a propalada reforma do Estado está a resultar em poupança com aumento da eficiência e qualidade das despesas e diminuição de custos de contexto. Ou por certificar-se se as infraestruturas construídas, realmente, constituem factor de atracão de capitais privados e não obras de prestígio feitas primariamente para potenciar apoio eleitoral. Ou ainda para confiar que os níveis de crescimento da economia nos próximos anos assegurará o pagamento da dívida e o investimento endógeno necessário para manter a dinâmica económica durante anos seguidos. A perspectiva e a atitude dos governantes a partir do casulo de protecção que a ajuda internacional fornece devia ser mais realista e proactiva na preparação do país para a “selva” que se vive lá fora. O período de transição no processo de graduação para país de rendimento médio termina este ano e claramente Cabo Verde não está preparado. Não conseguiu diversificar a economia, não se tornou suficientemente competitivo para atrair investimento directo estrangeiro significativo e falhou mesmo em potenciar a sua mão-de-obra com um ensino de qualidade e uma cultura de excelência como bem revela o índice Mo Ibrahim que põe Cabo Verde no nono lugar em matéria de educação. Por isso é que o Governo está pedir que se prolongue mais o período de transição. Mas será que desta vez finalmente se decidirá em preparar o país para enfrentar os seus desafios com pragmatismo, visão e perseveração até atingir o objectivo pretendido? A ver vamos.
domingo, outubro 09, 2011
Armadilha
Semanas atrás, em Washington, a ministra das Finanças mostrou a sua preocupação com a possibilidade de Cabo Verde ser apanhado na chamada armadilha dos países de rendimento médio. De seguida, apelou aos países desenvolvidos e às instituições de Bretton Woods que não deixassem de ajudar; presume-se que seja no tocante ao aceso a mercados preferenciais e a créditos concessionais. Ou seja, o que Cabo Verde ainda precisa é o que já se lhe tinha proporcionado durante os seus anos de país de baixo rendimento (LDC) e nos quase oitos anos a partir da sua graduação, em 2004, para país de rendimento médio (DC). A questão é se aproveitou esses anos para se pôr à altura dos desafios que terá que enfrentar sozinho ou se dormiu à sombra da bananeira, confiante de que sempre conseguirá ajuda e compreensão. E que para isso bastava trabalhar bem a imagem junto das instituições internacionais e certificar-se de que era sempre comparado com os outros países da África. Agora colhem-se as consequências da procrastinação. A expressão “Armadilha dos países de recursos médios” é normalmente usada para a situação que países como a Malásia e a China que têm economias a crescer sob o impulso das exportações, a inflação tende a aumentar e há outros sinais de sobreaquecimento que ameaçam a competitividade externa. Não é propriamente a situação de Cabo Verde, em que, segundo a ministra, na entrevista referida, se parte de uma base estreita de exportações em que a produtividade é baixa e em que o mercado de trabalho não é flexível e a oferta de mão-de-obra não corresponde às necessidades da demanda. Aqui há basicamente tudo por fazer. Encontrar a agricultura certa que pelo seu alto valor acrescentado aumente os rendimentos da população rural, desenvolver o sector das pescas para potenciar recursos existentes, identificar indústrias que mais se adaptam às características de um país arquipélago sem recursos naturais e pequena população e incentivar um sector de serviços voltado para a exportação que melhor uso poderá fazer das características culturais e humanas das pessoas. Tudo isso pressupõe uma preocupação central com a economia, designadamente com a criação de um ambiente de negócios favorável, com o desenvolvimento de uma classe empresarial nacional e com a existência de um sistema de educação e formação qualidade. Resumindo, perdeu-se tempo. Os anos das “vacas gordas”, de 2004 a 2008 acrescidos da bonança das linhas de crédito até à crise de Portugal em 2011serviram para ganhar eleições, mas não deixaram o país em melhor posição para enfrentar os desafios do amanhã.
sábado, outubro 08, 2011
Poeira
É facto notório que as pessoas, as empresas e a sociedade estão a ficar cada vez mais cépticas perante as evidentes dificuldades do governo em gerir os problemas urgentes do país. O destaque vai para o drama de energia e água que directa ou indirectamente afecta todos e fragiliza a economia. Nesta maré de desconfiança não ajuda muito a postura recente de membros destacados do governo durante as campanhas presidenciais. Muita gente ficou perplexa pela falta de ponderação manifestada tanto na relação com os correligionários do partido como também no uso e abuso dos recursos do estado. O governo em resposta à evidente perda de confiança que vem sofrendo resolveu tirar da cartola os “mesmos coelhos” que outrora lhe serviram tão bem para gerir as expectativas da população. Ou, dito de outra forma, de lançar a poeira que lhe permitiu navegar vários certames eleitorais sem ter de dizer a verdade sobre os reais desafios que o país confronta. Os últimos anúncios dos projectos da ENAPOR, que já vêm de 2004 e várias vezes retomados em momentos políticos cruciais, inserem-se nesta estratégia de desvio de atenção, de simular acção e esvaziar críticas. O retomar do processo da reconstrução das instalações da interbase foi a oportunidade encontrada para repescar projectos antigos mas agora embrulhados e apresentados como parte do “pilar” Cluster do Mar. Outra vez, ficou a saber-se que se pretende que Cabo Verde seja uma potencia regional no sector do transbordo. O projecto aponta como objectivo na sua última fase chegar a capacidade de armazenagem de contentores em 1 milhão de TEUs com investimentos superiores a 300 milhões de dólares. Fica-se por saber como. Não há projecção de movimento na região, nem se define uma estratégia de actuação e muito menos se equaciona a reacção dos outros portos na região africana. Será que vão ficar de braços cruzados, por exemplo o porto de Dakar que em 2008 já movimentava 331191 TEUs, o porto de Abidjan com o seus 670000 TEUs, Lagos 650000 TEUs e Tema, no Gana, 342882 TEUs? Os portos de Cabo Verde nesse mesmo ano não passavam de 57263 TEUs. Ganhar quota de mercado em tais condições não é fácil. E para que as pessoas não fiquem frustradas, nem caiam no desespero, é fundamental que se governe com uma visão clara, suportada por estratégia bem definidas e operacionalizada por acções que todos podem ver, monitorizar e acreditar que vão resultar. Todos perdem quando lançar poeira, fazer propaganda e excitar paixões primárias substitui pela governação que todos querem honesta, verdadeira e ao serviço do bem-estar de todos.
sexta-feira, outubro 07, 2011
MP e PN. Desajustes continuam
No relatório do Conselho do Ministério Público entre ao Parlamento diz-se que a afirmação que muitas vezes se ouve de polícias de que “ nós já fizemos o nosso trabalho; cabe agora aos juízes e ao Ministério Público fazer o seu” é destituída de fundamento legal. Os membros do conselho tomam a afirmação como uma crítica aberta à acção de fiscalização do MP no decurso do processo penal e denunciam-na como uma “ideia perigosa” de desjudicialização ou policialização do processo penal. Mais, acrescentam que “persiste um défice grande de articulação ” com prejuízo para o combate à criminalidade. Estranha-se em todo este imbróglio a falta de intervenção do Governo. É quem superintende a polícia e tem a responsabilidade de assegurar-se da colaboração das instituições para que os objectivos da lei de política criminal sejam cumpridos. Também cabe ao governo garantir que os órgãos de polícia criminal se abrem à fiscalização externa do MP nos termos da lei para que não haja abusos e os procedimentos sejam melhorados com ganhos de eficácia na luta contra o crime. È injustificável a falta de acção do governo para pôr cobro às acusações mútuas e facilitar entendimento institucional. Porque, entrementes, abusos são cometidos, direitos dos cidadãos ficam lesados e o país vive um ambiente de insegurança prejudicial à economia e à qualidade de vida desejada por todos.
quinta-feira, outubro 06, 2011
Pioneiros. Desrespeito à Bandeira e à República
A presença da bandeira do regime de partido único no funeral de Estado realizado para Aristides Pereira, no dia 27 de Setembro, configurou um desrespeito e uma afronta aos símbolos nacionais. Foi uma acção deliberada que logo de seguida mereceu as honras de foto de apresentação do facebook dos pioneiros de cabo verde. Mais uma vez instrumentaliza-se politicamente crianças para passar mensagens de arrogância de quem não reconhece a bandeira nacional estabelecida na Constituição da República. Naturalmente que, como sinal de homenagem dos seus camaradas, bandeiras do PAIGC e/ou do PAICV, partidos que ele dirigiu como secretário-geral, podiam ter sido ostentadas. Em vez disso, optou-se pela bandeira da I República. Neste ponto é interessante verificar que se omitem da biografia oficial de Aristides Pereira os actos, pronunciamentos e imagens do período, como se tivessem sido anos de vergonha, mas em contrapartida aproveitam o momento para, mais um vez, mostrar o desprezo pela II República. Tudo isso na presença de titulares de órgãos de soberania e na sede da Assembleia Nacional. Actos que, pelo desrespeito aos símbolos nacionais, podem configurar crimes de responsabilidade de acordo com a Lei nº 85 de 26 de Dezembro de 2005.
Governo já em campanha para as autárquicas
A campanha pré-eleitoral para as autárquicas já começou. Os protagonistas políticos não deixam o país relaxar. Pretextos não faltam para polarizar a sociedade e causar crispações. A ministra do sector de administração Local, urbanismo e habitação já deu sinais que irá amolecer os municípios em vários “desencontros” para os fazer presa fácil dos opositores políticos. Na semana passada lançou uma longa salva de artilharia contra a câmara municipal da Praia. Fiel à sua crença de que a tutela do governo sobre administração municipal não é simplesmente uma tutela de legalidade, como estipula a Constituição e a Lei, mas sim uma tutela do mérito lançou-se numa visita pelos bairros da cidade da praia dispensando remédios e fazendo críticas sem absolutamente nenhum respeito pela autonomia municipal. Para o governo parece difícil aceitar plenamente que municípios surgem da compreensão de que comunidades espalhadas pelo país têm interesses específicos, diferentes umas das outras e da colectividade nacional. A Constituição manda que a especificidade seja respeitada e que as comunidades sejam capazes de autogoverno através de órgãos eleitos e que tenham participação justa na repartição dos recursos do Estado. Sempre que o Governo é criticado por subverter as bases desse entendimento vem a ministra com memórias ilusórias de um tempo de “filhos de dentro e de fora” e de afirmações de que “pedra ca ta djuga cu garrafa”. Este refrão politiqueiro é ironicamente dirigido a Carlos Veiga. Precisamente, o primeiro-ministro que resgatou a tradição municipal caboverdiana, antiga de vários séculos e quase que destruída nos quinze anos de partido único. O insulto só mostra como o Paicv continua impenitente em muitas das suas convicções designadamente esta de subordinação das comunidades ao centro do Poder. Antes feita através do delegado do governo, hoje as tentativas de controlo passam por tirar meios aos municípios, menosprezar os órgãos eleitos e as suas decisões e neutralizar a administração autónoma, cedendo poder e meios a organizações sociais e comunitárias telecomandadas. É nessa base que a ministra questiona o desejo da cidade da Praia em ter o seu cine-teatro e arroga o direito de ditar prioridades apontando para os problemas de bairros degradados. Parece não causar desconforto a este governo que cabo verde seja provavelmente o único país no mundo onde não há cinemas. Mas aí já não é a ministra mas sim o dirigente partidário