Nº 562 • 5 de Setembro de 2012
Editorial:
O Estado, o Fisco e a mulher de César
O Estado deve milhões ao sector privado.
Particularmente penalizante são as demoras prolongadas na devolução do IVA. O
sector industrial de produção de bens alimentares e afins vive situações
críticas por causa disso. A isenção de que gozam tais produtos junto ao
consumidor coloca as empresas na situação de se não poderem se ressarcir do
dispêndio feito designadamente no pagamento do IVA nas alfândegas. A resultante
falta de liquidez dificulta investimentos e prejudica a relação de confiança
com os fornecedores que é crucial para o processo produtivo. As queixas de
vários anos das empresas têm-se deparado até agora com um muro de silêncio ou
de inacção da parte do Estado. A insensibilidade repetidamente demonstrada
perante algo que é devido e interfere com o funcionamento normal da economia
nacional deixa a todos perplexos e levanta questões muito sérias. Primeiro
porque a racionalidade fiscal que se intui no sistema é que a tributação da
economia deve produzir receitas suficientes para garantir a prestação dos
serviços vitais do estado, suportar os custos da solidariedade nacional e
financiar os investimentos colectivos com vista à melhor qualidade de vida e à
manutenção da competitividade do país. A acção do fisco não pode constituir-se
em factor de quebra da dinâmica da economia que é afinal a fonte onde vai
beber. Não deve sacrificar o futuro na busca de ganhos de curto prazo. Segundo
porque é fundamental existir uma relação de confiança entre os cidadãos, os
operadores económicos e o Estado para que a actuação das instituições seja
vista como legítima. Confiança pressupõe transparência nos processos e
procedimentos, previsibilidade nas acções e evidente falta de malícia na
motivação. O Estado não deve passar a impressão de que está-se a financiar à
custa de particulares e da própria economia nacional. Nem tão pouco mostrar que
o faz porque pode e sabe as pessoas não têm como escapar da, de facto, extorsão
de que estão a ser vítimas. Finalmente porque pergunta-se até quando se vai
manter esta postura do Estado de se colocar no topo da “cadeia alimentar” em
vez de facilitador de todos, indivíduos e empresas, na criação de riqueza e no
aumento da produtividade nacional. Quando é que se vai deixar a postura
rentista de comer à cabeça e passar a apostar no futuro. O país não tem
recursos naturais valiosos que lhe proporcionem rendas por largos anos. E o
mundo de hoje assegura que só será ganhador quem souber interpretar as
tendências de evolução futura, investir para as aproveitar e agir com rapidez,
flexibilidade e inteligência quando as oportunidades se oferecerem. A
persistência nas actuais atitudes e posturas do Estado significa enveredar por
um caminho que conduz a retornos progressivamente decrescentes. O parasitismo
favorece a ineficiência e ineficácia da administração fiscal com consequências
designadamente na pouca evolução da base tributária, no crescimento da economia
informal e no aumento de incentivos à evasão fiscal. A arrogância confirma e
aprofunda a percepção de imprevisibilidade, provoca retracção de eventuais
investimentos e mostra a sua pior cara em certas execuções fiscais,
catastróficas para as empresas e seus trabalhadores e desestabilizador para o
tecido empresarial. Alguma falta de seriedade não deixa de se manifestar quando
o Estado insiste em receber juros nos pagamentos em atraso dos contribuintes e
recusa-se a pagá-los quando deve. Financia-se ilegitimamente com uma dívida que
sabe estar a diminuir sob o efeito da inflação e recusa-se a compensar
devidamente os donos pelos transtornos, desvalorização e oportunidades
perdidas. A participação num jogo de soma positiva onde todos têm a
possibilidade de ganhar, implica renovar completamente a relação do estado com
os cidadãos e o sector privado. A construção permanente de confiança é
essencial para que se reforce a convicção de que a prosperidade pode ser criada
com trabalho, esforço próprio e espírito inovador.