Governantes adoram
infraestruturas. Portos, aeroportos, estradas, diques e barragens, escolas e
outros edifícios públicos são obras visíveis e facilmente aproveitáveis para
granjear apoio popular. Ganhos políticos conseguem-se em vários momentos: no
anúncio, na assinatura de contrato, no lançamento da primeira pedra, nas visitas
de seguimento e finalmente na inauguração. Mas nem sempre as promessas de
desenvolvimento que as acompanham se realizam. Depois do fulgor das festas da
inauguração muitas vezes a vidas das pessoas continua no marasmo de sempre.
Como bem escreve Justin Yifu
Lin no seu recente livro “Em busca da prosperidade” o desenvolvimento pressupõe
identificação e aproveitamento de oportunidades em linha com as vantagens
comparativas do país e facilitação do crescimento das empresas de forma a serem
competitivas no mercado interno e no mercado global. Segundo o mesmo autor, o
investimento nas infraestruturas hard (portos, aeroportos , estradas,
transportes, telecomunicações e energia) e nas infraestruturas soft
(instituições, educação, formação) só se mostra rentável se resulta da correcta
identificação de oportunidades e se é feito no tempo certo e sequenciado ou
encadeado de forma a facilitar e potenciar a actividade empresarial. Obras
realizadas por razões populistas e eleitoralistas ou com base em pressupostos
não condizentes com os recursos e vantagens do país facilmente se transformam
em elefantes brancos e em monumentos ao desperdício e à má gestão de fundos
públicos.
Infraestruturas dão votos e
ajudam governos a manterem-se no poder. Por isso é grande a tentação de as
construir numa perspectiva de ganhos de curto prazo. Os custos vêm depois em
dívida acumulada, em produtividade baixa e fraca competitividade externa. As
dificuldades terríveis por que passa Portugal e outros países advêm desse
cálculo mal feito. Casos que não serviram de exemplo às autoridades
caboverdianas.
Nos últimos anos o governo
embarcou na construção de infraestruturas por todo o país atraído por uma
linha de crédito que, de facto, condicionou a escolha das obras e que impôs a
obrigatoriedade da presença maioritária de empresas portuguesas nos consórcios
e a utilização de produtos de exportação portugueses. Desses investimentos
condicionados e feitos sob pressão das eleições de 2011 não resultaram níveis
de emprego e crescimento económico que o país precisa. Bem pelo contrário, o
endividamento público já atingiu pontos críticos e a população terá que
suportar aumento generalizado de impostos e taxas, e ficar mais pobre, para
que o governo possa equilibrar as contas públicas.
A essa falha em dinamizar a
economia, como prometido, vêm-se juntar notícias de auditorias a obras na Boa
Vista e no Fogo que dão conta de práticas complicadas nos processos de
adjudicação. Os relatórios referem-se a práticas que poderão estar na origem
de falhas graves como a queda da ponte de Ribeira D’Água, na Boa Vista, a ultrapassagem
por muitos milhões do custo inicial de muitas obras e no aparecimento de
indícios de apropriação indevida de fundos públicos por pessoas ou entidades. O
governo procurou alijar a sua responsabilidade ou repassando-a para quem já não
é ministro ou atribuindo as falhas à pressa em fazer e a insuficiências
técnicas do país. O risco de desvios nos concursos e adjudicações de obras por
causa das condicionantes existentes e do eleitoralismo permanente para proveito
de uns e outros nunca foi assumido.
Governos presidem sobre a
gestão de fundos públicos cuja origem são os impostos actuais dos contribuintes
ou empréstimos que futuramente são pagos pelos mesmos contribuintes. O Estado,
por si, nada produz. Por isso, a utilização pelo governo desses fundos na prossecução
do interesse geral deve ser feita com a devida parcimónia e com assunção plena
de responsabilidade pelos actos praticados.
Há uma inversão perversa da realidade quando se
faz crer ao cidadão de que obras feitas pelo Estado ou apoios recebidos do
Estado são dádivas ou prendas dos governantes e por isso não se discutem se os
critérios foram os melhores e se foi ponderado o custo-benefício. Tudo para
reforçar a crença no Estado providência e a dependência das pessoas numa
perspectiva de manutenção do poder. Há que pôr cobro a estas situações. O
combate pela responsabilização dos poderes públicos é central para que se tenha
um governo do povo, pelo povo e para o povo.
Humberto Cardoso
Editorial do jornal Expresso das Ilhas de 30 de Janeiro de 2013