O Governo rendeu-se finalmente à evidência. Segundo anuncia o seu site, o Governo vai, brevemente, apresentar propostas para um estatuto especial de Cabo Verde na CEDEAO. Já era tempo de posicionamentos ideológicos datados deixarem de determinar políticas públicas, particularmente a política externa do País. De facto, para além da ideologia oficial herdada do PAIGC, somos africanos e devemos estar na África, não se vê como justificar, em nome dos interesses de Cabo Verde, a nossa presença na CEDEAO. A integração não alterou a natureza das trocas comerciais. Continuaram viradas para Europa. O país não ganhou com importações de produtos mais baratos e de qualidade nem aumentou as suas exportações para um mercado putativo de 200 milhões de consumidores. Também ninguém verdadeiramente se interessou em usar Cabo Verde como porta de entrada para a Africa Ocidental. O gateway óbvio é Dakar e não se vê como Cabo Verde, a mais de 600 km do continente, pode competir com Dakar, o seu porto, o seu aeroporto e as suas comunicações rodoviárias e ferroviárias com os países da região. Para além disso não se descortina na governação do país, ao longo dos anos, qualquer plano de acção de sustento de uma estratégia de aproximação e que visasse potenciar e complexificar as relações com o continente. Quantos estudantes tem Cabo Verde nas Universidades da região? Quantas missões empresariais num e noutro sentido já se realizaram? O nível de relações institucionais existentes entre as câmaras de comércio, associações empresariais, bancos é suficiente para criar o ambiente de confiança necessário ao crescimento e diversificação das transacções entre o país e a região? É evidente que não se fez o mínimo que justificasse a crença na bondade da pertença à CEDEAO. Porquê então insistir na integração? Razões ideológicas? Se sim, quais os custos de se enviesar o interesse nacional? Até hoje, não houve ganhos significativos com o comércio na região mas já se paga, e bem, a imigração descontrolada no quadro da livre circulação. De facto, só podia vir descontrolo quando um país insular de cerca de 450 mil habitantes se abre para uma região de 200 milhões de indivíduos e com um rendimento per capita cinco vezes menor. Em vez de acesso a mão-de-obra qualificada, conforme as necessidades da economia nacional e no quadro de uma política de imigração inteligente e compreensiva, o país depara-se com imigrantes ilegais e não qualificados, suscitando problemas de integração e sobrecarregando as estruturas sociais. Cabo Verde não pode ignorar a região. O problema é saber como interagir de forma a haver vantagens mútuas. Já se viu que não houve ganhos na integração. Talvez um certo distanciamento seja proveitoso para todos. Aliás, há vários anos, a Mauritânia deu o pontapé de saída. Num outro contexto, a Suiça é o exemplo de país que triunfou afirmando a sua neutralidade política e mantendo-se distante das organizações europeias e, até muito recentemente, mesmo da ONU. Isso não impediu um forte comércio com os vizinhos nem que organizações internacionais se instalassem no seu território, com todos os ganhos daí provenientes. A insularidade e a descontinuidade territorial constituem desvantagens se se confronta o mundo com raciocínios rígidos, ditados por ideologias passé. Podem transformar-se em vantagens quando, com realismo e espírito inovador, se capitaliza sobre a flexibilidade e as múltiplas interfaces que oferece para retirar benefícios da inserção na economia mundial e regional.
1 comentário:
Nao, o governo nao se rendeu "à evidência", como diz! O governo sempre soube que é assim, mas nao o punha em pratica, porque queria contrariar as opinioes e posiçoes outras da oposiçao.
O governo fez Politica, enquanto o MPD sonhou, idealizou, ou também nao se "rendeu à evidênci", quando esteve no poder. Toda a gente minimamente inteligente, sabe ou devia saber, que o futuro de Cabo Verde, nunca esteve em Africa.
Os proprios africanos do tempo anda do PAIGC, sempre o souberam, e diziam em circulos fechados que "esses africanos (quer dizer os outros do continente) nao aprendem"!
Conclusao: a sua analise é correcta, mas peca porque vem tarde demais. Alias, peca igualmente por excesso de optimismo no governo. Porquê? Porque, o governo "rende-se à evidência", mas nada me diz que fai adoptar uma politica de ruptura em relaçao à CEDEAO.
Alias tenho a certeza que nao vai adoptar politica nenhuma, mas sim, alguns remendos para deixar a coisa andar e tudo ficar como està.
Nao ha estratégia nenhuma de longo curso, uma estratégia do futuro, com objectivos bem delineados e um calendario preciso no tempo. Tudo o que acontece,nao é por vontade propria, mas porque os outros vao decidindo, que hoje nos podem dar umas migalhas e amanha nao.
Mesmo a tao propalada parceria com a Uniao europeia! E' porque alguns europeus, que querem defender os seus poprios interesses nos vao dizendo que poderao chegar ou nao a um acordo connosco. Do nosso lado, nao ha nenhum pensamento estratégico e a nossa elite politico-economico anda a assobiar para o lado.
Mesmo no MPD; mas verdade seja dita, que o Humberto, é a pequena fonte no meio desse deserto arido e seco. Pode fazer milagres?! Duvido, mas continue, pois é dos poucos politicos nesta terra que tem algo no miolo! O simples facto de criar um Blog é inovaçao nesse mundo onde nao acontece nada!
José Bouquinhas
Enviar um comentário