Já no fim de dois mandatos, o Governo resolveu encarar o problema da habitação em Cabo Verde. Põe o défice habitacional em 80 000 casas e, recorrendo a uma linha de crédito de Portugal, lança um programa chamado Casa Para Todos. O timing do lançamento, a propaganda governamental exaustiva que o acompanha e os enormes esforços na gestão das expectativas das pessoas deixam transparecer que o programa, a curto prazo, visa fundamentalmente servir interesses eleitoralistas do partido no Governo. Corrobora isso a guerrilha contínua movida contra os municípios, ou seja, contra quem necessariamente deve ser um parceiro privilegiado se realmente se quer realizar o programa. O programa deixa omisso como as pessoas vão financiar-se na compra das casas. O ambiente actual de desemprego elevado, de crescimento anémico e de competitividade externa baixa não é garante do nível de vida presente e nem permite que se encare com muito optimismo o aumento significativo de rendimentos de um número crescente da população. Efeitos disso já se fazem sentir. No seu discurso na conferência sobre Oportunidades no Pós-Crise, o Governador do Banco Central de Cabo Verde alertou para o crescente aumento de créditos mal parados no domínio da habitação e para as consequências que poderão ter na estabilidade do sistema financeiro. Para a Ministra da Descentralização, Habitação e Ordenamento do Território em declarações à Lusa “a entrada no mercado do Novo Banco, instituição bancária de cariz social, vai permitir às famílias com menos recursos aceder ao crédito”. O Novo Banco tem o Estado como accionista directamente em 5% das acções. Garante a maioria das acções indirectamente através das participações do IFH, dos Correios, do INPS e da Caixa Económica É gerido pelo Banco Português de Gestão e arranca a 7 de Outubro, em pleno período de pré-campanha, tendo como clientes potenciais agentes económicos necessitados de micro crédito. Apesar da sua proclamada sensibilidade social, os créditos subprime que o banco irá disponibilizar terão que ser pagos sob pena da instituição se mostrar inviável a curto médio prazo. Mas capacidade de pagamento pressupõe a existência de uma economia que crie empregos e proporcione rendimentos. Precisamente o que o programa “Casa para todos” não parece ter em devida conta. Os termos da sua implementação, designadamente no tocante à compra de materiais, que deverão ser em 80 por cento feitas nas empresas portuguesas, e à participação obrigatória e maioritária de construtoras portuguesas nos concursos lançados, não trazem a dinâmica económica esperada dum programa de investimento desta envergadura. Nisso talvez Cabo Verde se distinga como um caso único conhecido de um governo lançar um vasto programa de construção do qual, à partida, não se espera efeitos significativos na economia nacional. Em todos os países do mundo, o sector de construção de habitações é um dos sectores chaves da economia porque por um lado absorve uma fatia importante das poupanças e por outro provoca efeito de arrastamento e dinâmica na criação de postos de trabalho. Para o Governo é um programa para atingir objectivos político-sociais: como tal é subsidiado. O problema é que os subsídios provêem da dívida contraída que irá sobrecarregar o país a médio prazo sem benefícios comensuráveis aos custos envolvidos.
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