2011 ficou marcado por três fenómenos de grande impacto: a primavera árabe, o agravamento da crise da dívida soberana e o protagonismo dos países emergentes. Os movimentos para a dignidade e contra a corrupção nos países árabes derrubaram tiranos e agora ensaiam passos de democracia, lidam com islamistas e reorientam-se para confrontar problemas existenciais colocados pelos dois estados teocráticos da região: o Irão e a Arábia Saudita, e também por Israel. A dívida soberana na Europa conheceu outros desenvolvimentos que ameaçam a economia mundial e o euro como moeda da União Europeia. A dinâmica dos BRIC´s aliviou os efeitos globais do abrandamento económico na Europa, América e Japão mantendo um volume expressivo do comércio internacional e estimulando exportações e investimentos em muitos países, designadamente, africanos.
De permeio, os Estados Unidos abriram espaço para um outro reposicionamento do país no mundo com a restauração da credibilidade perdida nos anos Bush, a retirada dos soldados do Iraque e do Afeganistão e o uso de novos métodos e alianças na luta contra o terror e o narcotráfico demonstrados no caso de Bin Laden. O Médio Oriente ficou refém das pretensões nucleares do Irão e da arrogância do novo governo de Israel que o impossibilita a qualquer tipo de negociações com os palestinianos. E a Europa tida como o exemplo de diminuição da desigualdade social e de promoção do Estado Social depara-se com um dilema: ou faz regredir o projecto europeu com uma Europa a duas velocidades; ou, em sentido inverso, aprofunda-o avançando para uma união fiscal com emissão de títulos de dívida europeus (eurobonds) e o estabelecimento pleno de um banco central europeu.
O PAICV conseguiu um inédito terceiro mandato que rapidamente se tornou venenoso quando ficou evidente que não trazia soluções frescas em particular para os problemas de energia e água. A perda de capital político acelerou-se com o envolvimento do governo nas eleições do presidente da república e com a gestão desastrosa das ambições de colegas do partido a esse cargo suprapartidário. O descrédito maior surgiu quando promessas eleitorais reiteradas, o 13º mês e ajustes salariais, feitas em plena crise internacional não foram cumpridas. Por pura conveniência, invocam-se razões da crise anteriormente negada.
O MpD procura ainda encontrar-se na sequência de umas eleições legislativas que podia ter ganha. Os sinais de cansaço da governação do PAICV neste terceiro mandato, em retrospectiva, deixam transparecer que o país já pedia um governo mais fresco. Os resultados das presidenciais demonstram que era possível mobilizar o descontentamento popular para renovar a liderança e a orientação do país.
O aprofundamento da crise internacional faz notar que os remédios do antigamente, presentes nos donativos, empréstimos concessionais e ajudas em geral não são suficientes para garantir o crescimento com emprego de qualidade. A redução para quase metade dos fundos do MCC constitui um aviso sério. Também sério é a dificuldade em atrair investimentos privados nacionais e estrangeiros. A falta de competitividade externa aí revelada obriga a que sejam revistas orientações e medidas de política e definidas outras prioridades nos investimentos públicos para se garantir eficiência e eficácia na consecução de objectivos nacionais traçados.
Espera-se que em 2012 se inaugure uma nova atitude face aos extraordinários desafios que se colocam ao país nesta crise sem fim à vista. Tapar o sol com a peneira e deixar-se enganar pela imagem sedutora do país que se projecta lá fora não são opções a continuar. As pessoas, a sociedade e o país só irão unir-se para responder aos desafios se sentirem que a clareza de objectivos, a verdade e a honestidade irão prevalecer sobre o imperativo de manter o Poder a todo o custo.
Editorial do jornal “Expresso das ilhas” de 28 de Dezembro de 2011
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