Na semana passada a ministra da Saúde disse numa reunião de avaliação do pacto nacional para a saúde que o sector precisa de mais um milhão de contos para assegurar a cobertura simétrica em todos as ilhas. A taxa sobre o tabaco e o álcool poderá contribuir com uma parte mas também espera que a taxa do turismo financie o Centro de Saúde do Sal e que do Fundo do Ambiente saiam verbas para ajudar a batalhar os vectores de doenças como a dengue e o zika. Mesmo com estes expedientes mais ou menos criativos é evidente que a saúde vai ressentir-se de falta de financiamento. Principalmente se se considerar que a tendência é para aumentarem os gastos à medida que a esperança de vida aumenta, que as doenças crónicas com o envelhecimento da população se tornem mais frequentes e consomam mais recursos e que se tornem maiores as expectativas da população quanto à qualidade dos cuidados de saúde que esperam receber.
A importância do sector da saúde não se restringe simplesmente à natureza e qualidade dos serviços que pode prestar à população num dado momento e numa determinada localidade. A saúde, por exemplo, ganha valor estratégico para o turismo quando este se posiciona como o sector económico com maior potencial no próximo futuro. Mas para que isso aconteça é fundamental que o país tenha capacidade para receber mais de um milhão de turistas e garantir-lhes segurança a todos os níveis, designadamente em termos de acidentes, traumas e ataques súbitos que podem provocar a morte na ausência de cuidados especializados. Depreende-se do que foi dito que a qualidade da saúde que se venha alcançar no futuro depende muito da capacidade em fazer convergir as necessidades dos sectores do turismo e da saúde por forma a garantir a sua expansão permanente e o seu financiamento com receitas geradas pela nova dinâmica do turismo.
A região económica com a qual Cabo Verde tem relação comercial mais próxima é a Europa. Com países europeus é que se faz o grosso do comércio internacional, de lá é que vem grande parte da ajuda externa, dos empréstimos e doações assim como boa parte das remessas dos emigrantes e do capital estrangeiro que tem sido investido em Cabo Verde. Também da Europa é que se originam os fluxos turísticos que nos últimos anos têm dado alguma sustentabilidade à economia cabo-verdiana. Ora, a Europa tem um grande problema. A população está a envelhecer e os custos com a saúde são cada vez maiores. Precisa garantir qualidade e cuidados à sua população na terceira idade mas sem pôr em causa a sua competitividade com custos excessivos impostos a indivíduos e empresas. Tudo leva a crer que Cabo Verde podia posicionar-se para ser de maior valia nesta matéria.
A relativa pouca distância da Europa, o clima ameno e a proximidade cultural são factores que poderiam envolver Cabo Verde, investidores e operadores estrangeiros numa parceria proveitosa para ambas as partes. A vinda de um número significativa de pessoas da terceira idade obrigaria a investimentos importantes nos domínios da saúde. A população cabo-verdiana, além dos ganhos redobrados devidos a mais postos de trabalho e à dinâmica económica criada pela presença mais prolongada de visitantes num modelo de turismo residencial, beneficiaria de um nível mais elevado de cuidados de saúde. Os gastos com a saúde não seriam mais simples despesas, mas sim parte do investimento estratégico para aumentar e qualificar o fluxo turístico para o país.
Desde os anos noventa que com a lei 19/V/96 se abriu a porta para estrangeiros reformados terem autorização de residência permanente no país. Não é pois de hoje a percepção do potencial que poderá estar aí. O problema é ser consequente e estratégico na acção. Associar, por exemplo, a possibilidade de residência ao acesso a cuidados de saúde especializados virados para as necessidades da velhice poderá revelar-se uma fórmula ganhadora. Implicaria um trabalho sistemático de formação profissional no domínio dos cuidados de saúde virados para a terceira idade com níveis internacionais de exigência. Naturalmente que tal formação beneficiaria bastante os nossos jovens e podia abrir-lhes o caminho para bons salários tanto no país como no estrangeiro onde essas profissões têm grande procura. Só falta agora pôr mãos à obra.
Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 24 de Fevereiro de 2016