Nestas eleições interpretações diversas do Código Eleitoral quanto ao papel da comunicação social já teve efeitos inéditos mas também positivos de motivar o presidente da república a pedir a fiscalização abstracta e sucessiva de normas dos artigos 105 e 106 do referido código. O incidente à volta do comício do PAICV na semana passada focou outra vez sobre o que parece ser incongruências na lei. Indo ao fulcro da questão dificilmente se pode tirar a conclusão que é vontade do legislador que nenhum partido faça comícios fora do período de campanha eleitoral. Parece evidente que a todo o momento os cidadãos como os partidos gozam da liberdade de expressão e têm direito à reunião e manifestação. Eleições são marcadas e a elas só podem apresentar candidatos partidos políticos no caso das legislativas, partidos e grupos de cidadãos no caso das autárquicas e só grupos de cidadãos nas presidenciais. Em todos esses casos prevê-se um período de campanha. O objectivo maior nesses quinze dias é assegurar que todas as forças políticas tenham igualdade de oportunidades na interacção com o eleitorado. Claro que se sabe à partida que os recursos dos partidos não os mesmos para os grandes e pequenos partidos, nem se comparam com os novos partidos e muito menos com os dos grupos cidadãos criados ad hoc. Cria-se portanto a igualdade de oportunidades essencialmente no acesso a recursos públicos, por exemplo, à radio e televisão públicas, aos lugares para colocar cartazes e outdoors, lugares para comícios, segurança durante a campanha, dispensa de trabalho etc. Pode-se controlar o financiamento que os partidos podem receber de indivíduos ou empresas e ainda, como é o caso dos comícios durante a campanha, determinar o nível dos agrupamentos musicais e artistas que podem ser contractados para animação antes da actividade política. Que tudo isso seja controlado durante o período de campanha e que por isso o exercício da actividade política seja condicionado para não pôr em causa a igualdade de oportunidades é aceitável. Estender essa restrição para um período fora de campanha já não é. Em Cabo Verde em nome da igualdade parte-se facilmente para restrições que penalizem liberdades fundamentais. Olhando para outras experiências democráticas desde os excessos da campanha eleitoral nos Estados Unidos ou mais recentemente as eleições em Portugal não se vê quem queira resumir a actividade dos partidos ao período da campanha. Mesmo em Cabo Verde, já vamos na sexta campanha eleitoral em ambiente livre e plural e nunca antes houve restrições semelhantes. Naturalmente que, mesmo não concordando, há que respeitar as decisões de um órgão central da administração do processo eleitoral como é a CNE. A legitimação a olhos de todos do processo eleitoral passa por respeitar o órgão que o supervisiona. Quando não se concorda, há sempre a possibilidade de recursos para outras instâncias. De qualquer forma, o próximo Parlamento terá oportunidade de rever o código e, se achar necessário, fazer as emendas para que não haja dúvidas quanto à sua conformidade com a Constituição da República.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 744 de 02 de Março de 2016.