A declaração de nulidade dos decretos-leis, que alteravam a baixa de incidência do IVA, lançou uma espécie de novela política. Viu-se governo omisso e aumento dos preços. Houve a novidade da moção de censura e o espectáculo do Governo a responsabilizar acórdão, oposição e comunicação social pelo stress vivido no país. Os preços subiram e as receitas do Estado aumentaram. O Governo recusou-se a um entendimento com a oposição por causa da gasolina. Em consequência, a expectativa de receitas para o ano 2007 melhorou em centenas de milhares de contos. O consumidor, em 2007, pelo contrário iria ver-se aflito para pagar 15% sobre o valor da factura na electricidade, na água, no gás e nos combustíveis em geral. No último instante, na lei do orçamento, chegou-se a uma solução, com o Governo a ceder na gasolina. 2007 já não será tão difícil. A novela porém trouxe à baila questões para reflexão, designadamente, a relação carga fiscal/riqueza nacional, o Estado face à economia, parasita ou dinamizador, e a subsistência de preconceitos ideológicos em substituição de políticas públicas. De facto, de um ponto de vista, as receitas fiscais são poupança forçada, são rendimento retirado ao consumo ou ao investimento de pessoas e empresas. Que têm razão de ser na medida em que, designadamente, possibilitem os serviços que só o Estado pode prestar (soberania, justiça, segurança), suportam a solidariedade nacional e regional e financiam investimentos públicos indispensáveis. Nessa perspectiva, o ideal é que a carga fiscal seja suficiente para financiar o Estado, um estado eficiente, mas que não entrave o desenvolvimento, absorvendo percentagens exageradas da riqueza nacional. A via para o aumento de receitas passa pela aposta no crescimento da economia e do emprego. O Estado não deve ser estático e parasitar a economia. O Estado, no mundo de contenção fiscal como condição para se ser competitivo no mundo globalizado, deve ser dinâmico, de incentivo ao crescimento económico e de busca activa de caminhos para diminuição da carga fiscal, a exemplo da Irlanda onde, hoje, essa carga se situa nos 12,5%. Não é a toa que cresce a 9% ano e tem o 2º maior PIB per capita da Europa. O Estado caboverdiano historicamente tem uma postura adversária à economia privada. É preciso dar combate a isso e adoptar uma nova cultura mais consentânea com as exigências dos tempos. Preconceitos ideológicos a determinar políticas é algo que, também, se deve combater. As negociações, por exemplo, sofreram com a ideia arreigada de quem usa a gasolina são os mais abastados. Isso contra toda a evidência. É só ver quem anda em Pardos, Tuaregs, Mercedes, BMW, todos diesel, e quem passa nos starlets a gasolina a caminho do trabalho. Políticas públicas devem suportar-se em algo mais sólido do que preconceitos datados, tentações de brincar a Robin dos Bosques e demagogia pura. Que aprendamos todos com os erros.
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