O Governo anunciou na sexta-feira que vai vender 21% das acções do Estado na ENACOL. Dias atrás, notícias vieram ao público da venda de 51% das acções na Sociedade de Tabacos por 900 mil contos. O anúncio público de vendas não foi acompanhado das razões de política que justificariam o fim das participações do Estado nessas empresas. De facto privatizações não se prestam simplesmente a realizar um encaixe financeiro para o Estado. Privatizar significa, antes de mais, iniciar ou aprofundar um processo de descentralização das decisões económicas. Decisões, até o momento tomadas por órgãos centrais de planeamento, passam a ser actos de vontade de miríades de operadores, reagindo a uma realidade económica imediata, fluídica e complexa. De facto a economia moderna e globalizada, voltada para a satisfação de necessidades específicas de indivíduos e em que se exige bens e serviços de toda a espécie à medida do consumidor, customization, pressupõe um nível de descentralização e uma reorganização em redes funcionais, impensável poucos anos atrás. Privatizações também significam a possibilidade de direccionar a captação de poupanças nacionais e estrangeiras para o investimento no País ao mesmo tempo que diminui consideravelmente o risco orçamental, ou seja, o risco do Estado vir a acumular défices no futuro por ser, na prática, o avalista das dívidas de todas empresas públicas ou de capitais públicos. Um outro papel importante das privatizações é abrir o País para parcerias estratégicas, tanto no sentido da empresa nacional se associar para competir no mercado global como, no caso de pequenos países como o nosso, de não se ficar de fora da onda de modernização tecnológica, organizacional e de gestão, essencial a uma inserção dinâmica e frutuosa no mercado internacional. Uma coisa porém é certa. Ninguém privatiza para conseguir verbas para emprego público. O aditamento nesse sentido feito à lei das privatizações na lei do Orçamento de 2006 foi de facto uma aberração sem precedentes. Convém, porém, dar um propósito justo ao encaixe financeiro das privatizações. No passado, o resultado das vendas foi juntar-se a doações para perfazer os cem milhões de dólares do trust fund. Um fundo cujo proprietário é a República de Cabo Verde e que é gerido pelo Banco de Portugal e tem como beneficiário das aplicações financeiras o Estado caboverdiano. Hoje não se sabe onde são aplicadas essas verbas. Da mesma forma que “não se sabe” para onde vão as receitas de vendas de terrenos. Onde deviam estar, que é no investimento nas ilhas que vão receber a carga resultante do fluxo turístico, primam pela a ausência. O Governo deve ter em conta que os resultados dessas vendas constituem receitas extraordinárias e são, portanto, irrepetíveis. Ou são aplicadas em investimentos para o futuro ou são colocadas em trust funds para o benefício das actuais e futuras gerações. Nunca para enterrar no orçamento de funcionamento e tornar o Estado cada vez mais obeso, ineficiente e autista perante os desafios que o país enfrenta no momento.
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