A campanha das eleições legislativas de 2016 vai iniciar-se no próximo dia 3 de Março. Será a sexta vez que num ambiente livre e plural os cabo-verdianos irão ao voto para decidir quem deve governar o país nos próximos cinco anos. Em antecipação ao acto eleitoral de 20 de Março teremos praticamente duas semanas em que a atenção geral estará virada para as propostas de governação dos partidos políticos e para o perfil dos seus candidatos a primeiro- ministro. Esta eleição, depois de quinzes anos sem alternância de governo, reveste-se de uma importância muito especial até porque acontece num momento já caracterizado por vários observadores e também pelo próprio Presidente da República como sendo de encruzilhada para o país.
Todas as forças políticas parecem concordar com essa asserção. Nas suas comunicações deixam transparecer uma necessidade de mudança e a urgência em se passar de uma situação de estagnação económica para uma outra realidade de maior dinamismo com criação rápida de empregos. As promessas eleitorais vão nesse sentido e as propostas em termos de políticas e de medidas dão conta do caminho a percorrer para se chegar até lá. Não se mostram tão claros porém os obstáculos no caminho para se atingir os objectivos e metas pretendidos, nem como vencê-los. E esse é o aspecto fulcral: há que ter consciência que eles existem para que se crie vontade, se desenvolvam estratégias e se mobilizem energias para os ultrapassar. Sem os identificar e os contornar, os resultados acabam por ficar sempre aquém do previsto. A experiência de vários países, entre os quais Portugal, é elucidativa. Apesar dos enormes sacrifícios consentidos, as reformas não foram suficientemente profundas e os resultados em crescimento e competitividade continuam modestos. Aparentemente algo ficou por fazer.
Nos últimos anos o governo nos orçamentos do Estado vem anualmente projectando crescimento económico de 3,5, 4 e até 5% do PIB. Na realidade, o país ficou por uma média nos últimos 5 anos de 1,4%. Os investimentos de mais de 600 milhões de contos não conseguiram dinamizar a economia nacional nem torná-la competitiva nem fazer dela uma criadora de emprego. O rendimento per capita vem diminuindo desde 2012. O desemprego mantém-se elevado, particularmente entre os jovens, e os classificados nas estatísticas oficiais como inactivos, aumentam. As razões por que os resultados estão a ficar sistematicamente abaixo das previsões não são devidamente inventariadas e muito menos reconhecidas. Pelo contrário, sai-se à procura de justificações em factores externos como a crise financeira internacional ou em agentes nacionais, que supostamente não estariam a fazer a sua parte, designadamente, os bancos, empresários, e os próprios trabalhadores. Mesmo quando o banco central alerta que constrangimentos internos diversos não permitem que o país aproveite em maior grau da recuperação das economias europeias, o governo continua a cantar loas à sua agenda de transformação, a considerar a dívida contraída como “virtuosa“ e a congratular-se com rankings internacionais que põem as ilhas de Cabo Verde em melhor posição do que a generalidade dos países do continente africano.
Sobressaltos repetidos, porém, têm chamado a atenção para falhas graves em sectores-chave para a vida do país. O último foi o arresto na Holanda do Boeing da TACV. Outros sobressaltos como a erupção na ilha do Fogo, o afundamento de navio Vicente e atentados homicidas dirigidas directa ou indirectamente contra entidades públicas deram conta de fragilidades e mesmo de incompetência que se deixa perpetuar em várias áreas sob tutela de entidades públicas. O caso da TACV é paradigmático. A empresa há meses que está a viver dificuldades visíveis de gestão e o governo dá a impressão que se bloqueou e não age: não substitui a direcção, não reorienta estrategicamente a empresa e passa a imagem de que salta de um plano de privatização para outro, sendo provavelmente o mais recente aquele em que o Sr. Primeiro-ministro terá trazido da Guiné Equatorial onde esteve em visita com a privatização da TACV na agenda.
Cabo Verde deve saber por que está na actual situação de baixo crescimento, de fraca criação de empregos e de aumento da pobreza. Já há documentos do Banco Mundial a questionar se não se trata de mais um exemplo de um país apanhado na armadilha dos países de rendimento médio. A contraposição de visões dos diferentes partidos durante a campanha eleitoral que começa no dia 3 de Março deverá servir para elucidar os cabo-verdianos país sobre o que lhes impede a caminhada e o que terão que fazer para garantir um futuro de dignidade, de liberdade e de prosperidade para si e para os seus.
Editorial do Jornal Expresso das Ilhas de 2 de Março de 2016
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