quinta-feira, março 24, 2016
Salários dos políticos
Em tempos eleitorais um ingrediente que não falta é a pulsão populista e demagógica. A exemplo do que se passa em muitos outras democracias também em Cabo Verde os alvos preferidos são os partidos e os políticos. Só que aqui a tradição de alguns se posicionarem contra os partidos e acima dos políticos vem de muito longe. Já no regime de Salazar/Caetano era assim e foi aprofundado no regime do PAIGC/PAICV. Partidos únicos não vêem utilidade na existência de outros partidos e os seus dirigentes consideram-se parte de uma “pequena burguesia que se suicidou como classe”. Tomam os outros políticos como gente interesseira e eles próprios como impoluta. A revisão do estatuto dos políticos, em especial do estatuto remuneratório que data de 1997, foi uma oportunidade a não desperdiçar. E pelo que se ouviu no debate entre os líderes do MpD e do PAICV há ainda quem pense que o assunto possa mobilizar mais paixões e exaltar ainda mais a figura do político “com uma missão”. Para esses, a questão fundamental da coerência do sistema remuneratório do Estado passa completamente ao lado e não se confronta com a realidade de que há dirigentes da administração pública do grupo VI com vencimento inferior em menos de mil escudos ao vencimento do Primeiro-ministro e do presidente da Assembleia Nacional. Outros dirigentes do grupo V têm vencimentos superiores a ministros, deputados e presidentes das câmaras municipais. Com o passar dos anos o problema tende a agravar-se à medida que se fazem actualizações. Em 2006 o governo do PAICV propôs um ajuste de 20% sobre as remunerações dos políticos para o ultrapassar mas o MpD votou contra. O impasse actual do bloqueio dos estatutos em 2015 não pode, porém, continuar. Quem não quiser fazer os ajustamentos que se impõem, deve pelo menos procurar ser coerente e arcar com as consequências políticas de cumprir o que JMN prometeu: ninguém na administração pública deve ter salários superiores ao primeiro-ministro. Em 1975 o governo de então decretou um vencimento máximo de quinze mil escudos para o presidente da república. Todos os outros salários foram reajustados por essa bitola. Coerência e coragem política precisam-se.
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