Todas as oportunidades parecem boas para confundir a memória colectiva e reescrever a história. O PAICV e os seus dirigentes não perdem "uma" na sua incessante defesa do passado do regime de partido único e de justificação dos actos da governação actual. O Presidente da Assembleia Nacional, na Mesa Redonda sob o tema “Os factores de sucesso da Administração Autárquica”, realizada no dia 10 de Setembro, disse a dado passo da sua intervenção: “Cabo Verde tem feito um grande percurso de descentralização do poder notável. No tempo colonial havia um grande distanciamento entre o poder local e os cidadãos e estes realmente não podiam escolher universalmente a sua câmara municipal devido ao sufrágio restrito e não livre. Com a Independência houve um processo em que o povo aproximou-se mais do poder não obstante, não se terem durante quinze anos realizados eleições competitivas mas apenas consultas populares prévias às nomeações posteriores pelo governo dos principais órgãos autárquicos”. Sobressai imediatamente dessas palavras a perspectiva linear da história que o PAICV acarinha. “No início eram as trevas, a época colonial, mas depois surgiu o Partido que pôs a nação num movimento. O regime de partido único foi uma etapa necessária e incontornável para se chegar ao ponto onde o Pais se encontra hoje”. O Dr. Aristides Lima escolhe reduzir a história autárquica de séculos em Cabo Verde, registada em vários documentos e fonte bibliográfica valiosa de estudos, ensaios e livros, à questão da representação popular nas câmaras municipais, nos quarenta anos do regime de Salazar/Caetano. Não se refere à cultura cívica e institucional desenvolvida durante os séculos de experiência autárquica e esquece-se de realçar que, apesar de tudo, ninguém chegou ao ponto de suprimir as câmaras municipais. Isso só viria acontecer precisamente nos 15 anos de regime de partido único que ele chama de “aproximação de poder pelo povo”. As câmaras só viriam a reaparecer em Cabo Verde em 92. E, a partir daí, procuraram reconstruir o que em termos de civismo e de cultura institucional foi destruído, ao mesmo tempo que geriam no dia a dia a situação urbana caótica que lhes foi deixada pelos “secretariados administrativos” e delegados do governo do regime de partido único. Em simultâneo com o pesado lastro que herdaram as câmaras tiveram que confrontar os efeitos da cultura centralizadora, predominante no país. Cultura essa que sobrevivieu aos primeiros anos de democracia e de instalação dos municípios e ganhou um novo ímpeto com o actual governo. Os dez anos de mandato têm sido de hostilidade geral ao Poder local. Na sua intervenção o Dr Aristides Lima uma vez mais não tem razão quando coloca a questão das tensões entre o Poder Central e Local da seguinte forma: “o poder local deve conquistar o seu espaço, que não deve passar pela confrontação com o poder central”. Pois, “o poder local como instrumento para fazer oposição ao poder central é uma ideia perversa e não favorecerá a descentralização, nem a boa gestão”. De facto, considerando que reina uma cultura centralizadora no país é mais lógico que, em existindo tensão, ela resulte da pressão do Governo e da administração central no sentido de diminuição das atribuições e competências das autarquias, e não o contrário. Aliás as câmaras não têm como fazer oposição ao governo. A desproporção de meios é demasiado grande. Mas já o contrário é perfeitamente verosímil como vários factos podem testemunhar.
segunda-feira, setembro 27, 2010
sábado, setembro 25, 2010
Ênfase em Novos produtos e no acesso a mercado
O MpD organizou sábado dia 18 de Setembro, na cidade da Assomada, Santa Catarina, um encontro de reflexão sobre a agricultura caboverdiana. Pelos temas desenvolvidos, designadamente no do “Agricultura no Cluster do Turismo” vê-se que o principal objectivo do evento foi encontrar vias para fazer da agricultura uma actividade de peso na economia caboverdiana. E isso por uma razão simples: uma percentagem significativa da população vive da agricultura e a maioria dos pobres do país está nas zonas rurais. Conseguir rendimentos que retirem da pobreza milhares pessoas, fazer da agricultura um sector atractivo para investimentos privados e mobilizar recursos para que o campo seja requalificado e sirva o eco turismo e o turismo rural são metas atingir. Implicam uma orientação determinada e consequente para o mercado e uma especialização em produtos de grande valor acrescentado, considerando a escassez de terra arável e de água. O passado dá pistas quando assinala que se alguma prosperidade na agricultura houve outrora foi quando pontualmente se beneficiou de exportações como o de café e da banana. A agricultura de subsistência complementada por produtos de baixo valor acrescentado mantém as pessoas numa vida precária, dependente das chuvas, dependente de familiares e cada vez mais dependente do Estado. Sempre os agricultores procuraram fugir ao círculo vicioso e inevitavelmente empobrecedor, refugiando-se em produtos que pela sua natureza, eram considerados menos arriscados. O Grogue foi a solução encontrada particularmente em ilhas como S.Antão. Tinha mercado certo e não se deteriorava em caso de dificuldades de acesso. A desregulamentação completa do sector de produção da aguardente levou à situação em que efectivamente “o mau grogue deslocou o bom grogue”, com todas as consequências que se conhecem no plano económico, mas também no aspecto social como o alcoolismo e a violência juvenil. É evidente que haverá ganhos a todos os níveis se houver visão e vontade política para se regular o sector e dirigir o grogue de base na cana sacarina, produzida com controle de qualidade, para o mercado com potencial de expansão como é mercado étnico. Também o turismo poderá vir a revelar-se um mercado de expansão para agricultura caboverdiana. O que pressupõe equacionar e resolver o problema do acesso a esses mercados, estruturar a oferta para, de forma fiável e sustentável e ao nível dos padrões europeus alimentá-los e ainda identificar nichos em que produtos caboverdianos teriam vantagens comparativas sobre produtos importados. Problemas nada fáceis de resolver. Cabo Verde é um arquipélago, as facilidades criadas de acesso directo dos turistas ás ilhas também beneficiam importações directas. Por outro lado desenvolver nichos de mercado competitivos vão obrigar a uma estruturação rigorosa da oferta nacional em termos de processos e à diminuição drástica de custos de transacção e de contexto actualmente existentes. Encontrar produtos de grande valor acrescentado que garantam retornos de capital atractivos e níveis de rendimento adequados e sustentáveis deve ser o principal foco das acções no sector. A possibilidade de usar o óleo da purgueira como biodiesel deve ser energicamente investigada. O mercado nacional do diesel está acima dos 90 mil toneladas desse combustível. Substituir 10, 20, 30 ou mais % por óleo produzido localmente teria consequentes extraordinárias no rendimentos das pessoas, efeitos macroeconómicos favoráveis para além do impacto ambiental derivado do aproveitamento dos terrenos das zonas semi-áridas do país. Outros países, grandes e pequenos, criaram através de legislação o seu mercado de biocombustíveis. E agora colhem os benefícios disso. Cabo Verde também deve ser ousado e não deixar de explorar o que pode vir a revelar-se um mercado anual de milhões de dólares com directo impacto no mundo rural.
A II República atinge a maioridade
sexta-feira, setembro 24, 2010
Mudar o registo para brilhar
O único comentário que se ouviu do Sr. Primeiro Ministro sobre a triste posição de Cabo Verde atrás de mais de 16 países africanos no índice de Competitividade e no 117º lugar mundial que “o facto de termos entrado no Indice é uma grande vitória para o país”. Claro que não se entra para o Índice porque se é competitivo. Existindo dados fiáveis e instituições credíveis para os coligir e os certificar está-se no índice. Mas é a manobra habitual quando este Governo é confrontado pelos factos: Muda o registo para menor denominador comum e proclama-se o melhor de entre os piores. Assim quando hoje se fala de competividade, o Governo muda discurso para Desafios do Milénio e para luta contra pobreza porque ali o País consegue competir com os mais pobres. Fica por responder como manter baixos os níveis de pobreza de forma sustentável com baixa competitividade, crescimento abaixo do potencial e desemprego de dois dígitos. Só sendo competitivo é que se pode criar riqueza. Caridade e subsídios não resolvem permanentemente o problema da pobreza, mesmo quando os recursos são bem geridos. Para o Governo, porém, tudo parece reduzir-se a um problema de imagem: As pessoas, os seus problemas e as suas expectativas são simples figurantes nesse filme.
quinta-feira, setembro 23, 2010
Respeito pela Propriedade Intelectual e fim à Pirataria
segunda-feira, setembro 20, 2010
Quando o Poder não vê limites
sábado, setembro 18, 2010
Quando a Propaganda entorpece o espírito
quinta-feira, setembro 16, 2010
Década perdida para a competitividade
A competitividade de Cabo Verde foi pela primeira vez avaliada pelo World Economic Fórum. Ficou em 117º lugar num total de 139 países. No continente africano ficou atrás de 16 países: Tunísia, África do Sul , Maurícias, Namíbia, Botswana, Ruanda, Argélia, Gâmbia, Líbia, Benim, Senegal, Quénia, Camarões, Tanzânia, Gana e Zâmbia. Claramente está-se perante um fiasco de todo o tamanho. Fiasco tornado maior pelo facto do Governo do PAICV, há sete anos atrás, ter criado um ministério para o crescimento e a competitividade. No domínio económico não atingiu as metas prometidas porque o crescimento situou-se sempre abaixo do potencial do país, tirando o ano de excepção que foi 2006 com os exercícios da NATO e os anos, 2007 e parte de 2008, de grande entrada de capitais estrangeiros, no pico do “boom” mundial. Confirma-se agora que a outra promessa de maior competitividade externa também não foi cumprida. O estudo governamental “Análise dos Constrangimentos” já tinha revelado os escolhos, designadamente nos domínios financeiro, de educação e formação e de transportes e comunicações, onde a agenda de transformação do governo deixara-se encalhar. O relatório do Fórum Económico Mundial vem reforçar as conclusões desse estudo com a má avaliação de Cabo Verde nos factores que mais contribuem para a competitividade no seu grupo de países. Mesmo no que respeita à estabilidade macroeconómica Cabo Verde não está bem classificada. Inflação é o único factor que dá alguma vantagem comparativa, mas aí sabe-se que as razões não são primariamente da governação mas decorrem essencialmente da disciplina imposta pelo Acordo Cambial com Portugal e a União Europeia. O relatório define a competitividade como o conjunto de instituições, políticas e factores que determinam o nível de produtividade de um país. Como se pode ver pelo gráfico só em meados de 1994 é que Cabo Verde conseguiu crescer acima da média dos países africanos. São os anos em que com a Constituição de 1992 e a passagem da economia estatizada para uma economia de base privada, novas instituições elevaram o potencial de crescimento do país para um patamar mais elevado. Depois de 2000, para se manter o nível de crescimento era necessário o uso de factores indutores de eficiência na economia: uma maior aposta na qualidade do ensino particularmente no secundário; o aumento da eficiência dos mercados com a diminuição do informal e aumento da concorrência; suficiente vontade política para firmar um pacto que viabilizasse a flexibilidade do mercado de trabalho; supressão de constrangimentos ao desenvolvimento do mercado financeiro e uma atitude proactiva de procura de mercados passando pela unificação do mercado interno e pelo promoção de exportações. Mas aí é o fracasso que o relatório põe a nu. Conclusão: uma década perdida. As consequências vêem-se no nível fraco de investimentos privados internos e externos e na incapacidade de criar um número de postos de trabalho que diminua significativamente o desemprego.
quarta-feira, setembro 15, 2010
Carpir o Tribunal Constitucional
O presidente da Assembleia Nacional numa conferência do PTS, em S.Vicente, lamentou que, dez anos após a criação do Tribunal Constitucional em 1999, esse tribunal ainda não esteja instalado. E, por essa razão, os direitos de oposição estejam ainda limitados no que concerne a formulação de pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade. Esqueceu-se o presidente da A N de se referir que os direitos das minorias são, de facto, mais prejudicados quando o parlamento se deixa levar indevidamente pelos interesses da maioria. Em Novembro de 2008, já com o processo de revisão constitucional aberto e com o mandato dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça a poucos meses do seu término, o Governo iniciou uma manobra para manter o sistema de nomeação de juízes por órgãos de poder político e impedir mais uma vez a instalação do Tribunal Constitucional. A iniciativa do Governo passou apesar do aparente absurdo de se alterar a organização e a composição de um órgão de soberania, o Supremo Tribunal de Justiça, por uma resolução aprovada por maioria simples. O Governo posteriormente conseguiu convencer os partidos da oposição que o Tribunal Constitucional seria instalado ainda no ano de 2009 e que o mandato dos novos juízes seria de meses. Como era facilmente previsível, e alguns o disseram, todas as promessas não passavam de um embuste. O Tribunal Constitucional não foi instalado e disposições transitórias, aprovadas na revisão da constituição, asseguram o cumprimento completo do mandato dos juízes nomeados para o supremo tribunal de justiça. A manobra feita em 2008/2009 foi uma repetição mais trabalhada do que já acontecera em 2003. Nesse ano, o MpD, em antecipação do fim de mandato dos juízes do STJ e em cumprimento da Constituição, apresentou um projecto de lei de instalação do tribunal constitucional. A lei foi simplesmente rejeitada pelo PAICV. Com a aproximação do fim do mandato dos juízes, o Presidente da República, num gesto inédito, avança em primeiro lugar e nomeia um juiz e o presidente do STJ sem esperar que o novo colégio de juízes tivesse sido nomeado. Um nível similar de colaboração do PR também serviu em 2009 para se ter o actual figurino de adiamento da instalação do Tribunal Constitucional. Por isso tudo, só podem ser lágrimas de crocodilo as que são derramadas pelo Tribunal Constitucional.
terça-feira, setembro 14, 2010
Abusos minam autoridade e eficácia
Pequenas coisas
domingo, setembro 12, 2010
Revista COMUNICAR. Onde está a ética?
sábado, setembro 11, 2010
O Cabo Verde a "branco e preto" do PAICV
O presidente do PAICV, José Maria Neves, no lançamento, em S.Vicente, da plataforma eucontribuo.cv para doações, mais uma vez caracterizou o seu partido como positivo e classificou de negativo a minoria. Não é um discurso inocente. Deliberadamente, recorria à dicotomia que historicamente o seu partido sempre se serviu para excluir os outros, não aceitar opiniões e interesses diversos e estigmatizar os que não se revêem nele. Positivos versus negativos é a nova versão da célebre diferença entre “povo” e “população”. Dizia-se que “povo é todo aquele que está com o partido. A população é o resto”. E na população encontram-se os “assimilados, os colaboracionistas e os agentes do colonialismo e do imperialismo”. Conforme os tempos essa perspectiva dicotómica, antagonística e de exclusão tomou outras roupagens: de “povo versus população”, passou para “patriotas versus anti-patriotas” e, depois, de “amantes da terra versus vendedores da terra”. Renova-se agora em fim de mandato para instilar nos militantes o zelo, a determinação e o “não olhar a meios” no combate eleitoral que se avizinha. Também para avisar aos que queiram ficar em cima do muro que, no mundo a branco e preto, “ou se está connosco ou se é contra nós”. Serve, ainda, para dar um novo ímpeto à cultura política que combina o atiçar da crispação com apelos cínicos ao consenso. Uma cultura que se suporta no não reconhecimento que os caboverdianos podem ser uno e, ao mesmo tempo, terem opiniões diferentes e perseguirem interesses de acordo com a sua individualidade, motivação, saber e criatividade, sem questionarem o direito dos outros fazerem o mesmo.