Durante toda esta semana o PAICV, no Governo e no grupo parlamentar, tem feito campanha permanente de desinformação acerca do Debate sobre a Situação da Justiça. O sr Primeiro-Ministro e o Líder do Grupo Parlamentar em especial têm sido os protagonistas nessa campanha. Campanha essa que não visa só descredibilizar a oposição. É também para lançar o descrédito sobre o parlamento e a democracia parlamentar. O Debate sobre a Situação da Justiça é consagrada pela constituição no art 181 alínea d) como primeiro acto do parlamento no início de cada sessão legislativa que começa a 1 de Outubro. Para isso, o Conselho Superior de Magistratura Judicial (CSMJ) deve apresentar o seu relatório até 31 de Julho, diz o regimento da Assembleia Nacional. Com o relatório do CSMJ entre mãos, e após a revisão constitucional de 2010 também com o relatório do Conselho Superior do Ministério público (CSMP), a a Comissão Especializada dos Assuntos Jurídicos e Constitucionais, deve proceder a audições extensivas de entidades envolvidas no sistema de justiça. O objectivo dessas audições é propiciar ao Plenário da A N informações sobre todos os aspectos que dizem respeito à justiça de forma a que o debate seja mais rico e profícuo. São feitas audições ao Presidente do CSMJ, que também é presidente do Supremo Tribunal, ao Procurador Geral da República, ao Ministro da Justiça, ao Bastonário da Ordem dos Advogados. Já aconteceu que audições de entidades abrangeram directores da Polícia Judiciária, da Polícia Nacional e do Presidente do Sindicato dos Juízes. Neste ano, o último da legislatura, a maioria na Comissão Especializada não quis fazer as audições e decidiu, “à pressa”, fazer um resumo e apresentá-lo ao Plenário. Tão á pressa que não viu que o suposto relatório do Conselho Superior do Ministério Público era afinal o relatório do Procurador Geral da República, como o próprio confirmou no programa Discurso Directo da RCV de segunda-feira, dia 25. Também não verificou que a data de despacho do Presidente da A N era de 20 de Outubro quando o relatório só foi entregue ao presidente no dia 21, quinta-feira. Os atrasos na aprovação da Ordem do Dia têm origem nas irregularidades referidas e no facto do parlamento ter recebido o relatório que não era o mandatado pela Constituição. O aproveitamento político pela maioria das consequências de falhas cometidas pelos seus representantes nos órgãos da Assembleia Nacional permitem legitimamente perguntar se não foram deliberadas. O mesmo padrão de comportamento verificou-se depois quando, no decorrer do debate, o 1º Vice-Presidente, que então presidia a Mesa, interrompeu os trabalhos, dizendo que se continuaria no dia seguinte , em claro atropelo do nº 4 do artigo 238º do Regimento: "O debate sobre a situação da justiça não pode, em caso algum, exceder uma reunião plenária". O MpD reagiu reafirmando a importância de se cumprir o Regimento. O PAICV não só não viu qualquer problema em passar por cima da norma regimental como aproveitou para mais uma vez recitar o refrão de que a oposição não quer debater. O Primeiro-Ministro disse mesmo que o MpD, refugia-se em "questiúnculas políticas para fugir ao debate e ao confronto de ideias sobre a situação do país". Declarações falsas, como facilmente pode-se se verificar. Nas quase três horas de debate na segunda feira, não obstante o pouco tempo da bancada do MpD, intervieram quatro deputados. Do outro lado, com quase o dobro do tempo, participaram no debate três deputados do PAICV e dois membros do Governo, o PM e a Ministra de Justiça. A falsidade, dita tão frontalmente, revela muito de como o PACV vem lidando com a sociedade caboverdiana. Falta a verdade na cara das pessoas e desafia-as a dizer que está a mentir.
sábado, outubro 30, 2010
quinta-feira, outubro 28, 2010
PGR ressalta tensões entre MP e polícia criminal
O relatório do Ministério Público, apresentado ao parlamento no âmbito do debate sobre a situação da justiça, revelou situações de tensão e mesmo de hostilidade de sectores da polícia criminal (Polícia Nacional e Polícia Judiciária) para com o Ministério Público e o próprio Procurador-Geral da República. Segundo o relatório, ao Ministério Público são dados pela Constituição e pela Lei poderes para “avaliar se a denúncia constitui ou não uma notícia de crime e decidir em função disso se é de abrir, ou não, instrução” e também para exercer fiscalização “externa” da actividade policial. O problema é que alguns órgãos de polícia fazem “crítica aberta à acção de fiscalização cometida às autoridades judiciárias, em afirmações que se traduzem numa espécie de desjudicialização ou policialização do processo penal. O ambiente entre o MP e a polícia criminal atingiu o ponto mais baixo no cerco feito ao Tribunal da Praia no dia 12 de Março de 2008 “por um grupo de elementos da Polícia Nacional – de que faziam parte agentes, subchefes e oficiais superiores - …, sequestrando magistrados e funcionários”. A razão era a prisão preventiva de um agente policial que depois de julgado no Tribunal de Instância e no Supremo Tribunal de Justiça foi sentenciado a 16 anos de cadeia por homicídio agravado por motivo fútil. A partir daí, segundo o relatório do MP, o Procurador-Geral da República tem sido sujeito “a sucessivas investidas, ilegais e desproporcionais de elementos da Polícia criminal”. As tensões entre esses órgãos de luta contra o crime têm outras razões designadamente o facto de a "polícia não compreender que quando desempenha a função de coadjuvar as autoridades judiciárias não está, e não pode estar, na dependência do componente membro do Governo". Confrontado como essa questão no Parlamento, a Ministra não se dignou pronunciar. Por aí, logo se percebeu por quê os equívocos persistem. Uma outra razão para as tensões é a falta de formação dos agentes policiais que se manifestam nas deficiências em matéria de direito probatório material e das técnicas de recolha e produção de provas lícitas em processo penal. O resultado é que “as investigações levadas a cabo pela Polícia Nacional traduzem-se numa percentagem preocupante, em provas nulas”. Com tamanho desperdício de recursos e com eficácia das acções anti-crime comprometida por causa de hostilidade aberta entre agentes do Estado não estranha a insegurança e a sensação de muitos que Justiça é-lhes denegada. A passividade do Governo, que tem a tutela das polícias, perante o que configura ataques contra o PGR não tem qualificação. O mesmo se poderá dizer da indiferença dos outros órgãos de soberania. Não é aceitável que não se tomem medidas rápidas e decisivas para pôr cobro esta situação e criar um ambiente de cooperação entre instituições-chave do Estado na luta contra o crime e em defesa da legalidade.
quarta-feira, outubro 27, 2010
Prosperidade enganosa?
Inaugurado o Centro de Inspecção e Conservação de Produtos Agrícolas, o Governo anunciou logo um futuro de prosperidade para a ilha de Santo Antão. Segundo o Primeiro-Ministro, Santo Antão já pode contar com os mercados do Sal e da Boavista que já “recebem mais de 350 mil pessoas e em 2013 prevê-se mais de um milhão”. Na ânsia de mostrar resultados, pretendeu esquecer os enormes obstáculos que ainda subsistem. O Centro parece que ainda não dá garantia completa quanto aos mil-pés. Só assim se pode explicar que pelo Decreto-lei 41/2010 de 27 de Setembro se continue a impedir os produtos de Santo Antão de serem enviados para a cidade da Praia, o maior mercado do país. Também não se equaciona o problema de S.Vicente cujos produtos também constam do embargo. Anos atrás, gorou-se um negócio de exportação de flores a partir dessa ilha por causa disso. Resulta daí que produtos vindos do Porto Novo e que se dirigem para outras ilhas, via S.Vicente, podem correr o risco de contaminação. Um outro aspecto é a questão de saber quem vai pagar o condicionamento dos produtos. Os custos acrescidos poderão tornar ainda menos competitivos os produtos de Santo Antão nas ilhas do Sal e Boa Vista onde têm de enfrentar produtos importados directamente do exterior. O turismo nessas ilhas depende muito do sistema all incluse que, por definição, é altamente integrado, abarcando todos os aspectos da operação. Com os turistas chegam produtos já com qualidade e aparência a satisfazer standards elevados de qualidade e apresentação. Competir, nessas condições, não é nada fácil. A penetração dos produtos de Santo Antão vai exigir uma estratégia de comercialização que passe provavelmente pela identificação de nichos de mercado vantajosos. Com ainda muito por fazer, o entusiasmo do Governo mais parece outro exercício do ilusionismo que vem procurando gerir as expectativas da população em período pré eleitoral.
terça-feira, outubro 26, 2010
Justiça: ao sabor das conveniências
segunda-feira, outubro 25, 2010
MCA. Possível ultrapassar espírito de ajuda?
Com grande pompa e circunstância fez-se a inauguração do que se está a chamar de primeira fase das obras do porto da Praia. Inicialmente, fundos do MCA no valor de 53 milhões de dólares foram destinados a colocar o porto numa posição em que poderia manejar com maior eficiência não só os navios que o escalam como os contentores descarregados. Também estaria em melhor posição de servir os seus muitos utentes, porque as operações portuárias seriam garantidas por operadores privados. Bom, chegado ao fim do projecto MCA, a eficiência do porto no manejo de navios não se alterou porque não se construiu o quebra-mar previsto para conter os efeitos da calema e não se aumentou o cais nº1 como tinha ficado assente no acordo assinado com o MCC em Junho de 2005 (pgs. 70-71). Também a privatização nos últimos cinco anos não deu um passo significativo. Para o MCC essa era a condição sine qua non para o sucesso do projecto. Até estipulavam no acordo que não haveria desembolso sem passos visíveis nesse domínio. Inaugurou-se sem o quebra-mar e sem o cais estendido e com a velha ENAPOR na gestão do espaço. Não é à toa que muitos se mostram cépticos quanto aos ganhos reais de tudo isso. O próprio Daniel Yohannes teve que reafirmar no seu discurso que coloca a iniciativa privada no centro de uma estratégia de crescimento. Teve necessidade de fazer isso talvez porque é notório como o programa do MCA acabou por não diferenciar muito dos muitos programas de ajuda com que o Governo já lidou. Inicialmente, o acordo previa gastos directos no valor de 7 milhões de dólares para imprimir uma nova dinâmica ao sector privado nacional. A maior parte foi desviada para as estradas do Governo. Dos 7 milhões só 1,9 milhões foram colados no sector privado. Isto é, nas micro-finanças onde o Governo já sabe como fazer para desenvolver os seus projectos de estimação. Não é à toa também que a questão da privatização das operações portuárias tenha sido adiada sine die. O Governo sabe como contornar pretensões dos estrangeiros em tentar ir além da ajuda tradicional. Eles, por outro lado, contentam-se com algum sucesso em mudar atitudes. As suas expectativas são baixas mesmo nos países que reconhecem ter good governance, mas em África. Uns e outros ajustam-se nos respectivos propósitos. O país é que fica preso na ratoeira do espírito de ajuda e não desenvolve a atitude certa para pensar que pode ser próspero com dignidade e sem pedinchar ninguém.
sábado, outubro 23, 2010
Criminalizando a Oposição
Continua a ofensiva do PAICV em desqualificar, à partida, o MpD como candidato nas eleições de 2011 e a governo nos próximos cinco anos. Em conferência de imprensa ontem dia 22, o Secretário-geral desse partido denunciou nestes termos o que chamou gastos exagerados na pré-campanha:
“O MpD gasta rios de dinheiros e faz ostentações exageradas em tempo anterior à pré-campanha eleitoral”. São absurdos os “sinais exteriores” de um financiamento que não se explica, nem se compreende, em se tratando de um partido “com dívidas malparadas e crédito bancário condicionado”.
A imagem dos irmãos Metralha, que acompanha o texto no site do PAICV, mostra que esse partido não está a interrogar-se sobre nada. Está a acusar. Mas, como é da sua natureza, depois de acusar, esconde-se. Diz que a sua reacção deve-se ao facto de ser um “assunto que tem melindrado a opinião pública e tem dado azo a questionamentos na imprensa”. Quanto à imprensa, ninguém tem dúvidas sobre quem anda, há algumas semanas, a falar de dinheiros, de narcotráfico, de vendas de terrenos e até de sabotagem na Electra, sempre procurando envolver figuras e partidos da Oposição. Até parece que a conferência de imprensa do PAICV de sexta-feira foi planeada para coincidir com manchetes de jornal repisando isso tudo. Não interessam as negas da Administração da Electra quanto à sabotagem e as declarações do Procurador-Geral dizendo que “não recebeu qualquer pedido formal” do Governo ou da Electra para investigar. Interessa, sim, criminalizar a Oposição aos olhos da comunidade internacional e dos caboverdianos. É a democracia à moda do PAICV. À moda da uma cultura política que teima em não diferir muito das que ou internam em hospital psiquiátrico os críticos, dissidentes e adversários políticos ou os põe na cadeia por actividades criminosas.
quinta-feira, outubro 21, 2010
Dose reforçada de hipocrisia
O PAICV, no noticiário 13-14 da RCV de hoje, veio com uma dose mais reforçada da hipocrisia que costuma lidar com os caboverdianos. Estava a responder à critica de muitos, designadamente deste blogue, pela forma como o Governo se cola na cooperação internacional e nos seus representantes para efeitos eleitorais e extrair dividendos na luta política. Algo que é feito aos olhos de todos e passado todos os dias na televisão pública. Muita hipocrisia permite ao PAICV vir, na cara de todos, dizer que não é assim. E é com cinismo que recua nas suas responsabilidades quando sabe que é o Governo quem, muitas vezes, coloca representantes diplomáticos em situações embaraçosas. Mas a intervenção é também toda ela parte da guerra sem quartel que move contra os adversários políticos. A acusação de serem contra as parcerias é para demonstrar à comunidade internacional que a Oposição não é credível e não merece governar. Conseguida a simpatia dos membros dessa comunidade, é usá-la para provar ao povo de Cabo Verde que só eles são aceites pelos países e instituições estrangeiras. O problema é que todos vêem o que se passa. E tudo não pode ser reduzido a tricas políticas. Há questões de decência, de verdade e de honestidade nas relações políticas que não devem ser ultrapassadas. Um testemunho insuspeito do que se passa nesta matéria é dado pela jornalista Margarida Fontes no seu blog, num “post” de 19 de Outubro de 2010:
Perdas de representatividade e diversidade
Com a publicação, no dia 13 de Outubro, dos dados definitivos do recenseamento eleitoral ficou oficial: S. Antão e Fogo perderam dois e um deputado respectivamente. Sal e Santiago-Sul ganharam respectivamente 1 e dois deputados. A perda de representividade de algumas ilhas a favor de regiões e outras ilhas têm subjacente uma realidade mais dura de perda de população que não se confina ao caso citado. S. Nicolau é o caso mais flagrante de migrações que já ameaçam colocar a ilha num espiral acelerado descendente. Por falta de massa crítica, os transportes começam a rarear-se, lojas fecham-se, jovens saem à procura de oportunidades, a agricultura estrangula-se com falta de mão-de-obra, a população envelhece, etc. No sentido oposto a cidade da Praia denota um crescimento exponencial que atrai cada vez mais pessoas, negócios e aventureiros. Um crescimento que põe pressão excessiva sobre os recursos da Ilha e sobrecarrega sistemas como o eléctrico, água e saneamento. Para não falar na situação habitacional crónica que cria nas cintura urbana bairros degradados onde a pobreza coexiste com o crime, a insegurança, a insalubridade e o desemprego. Tudo isto vem passando há vários anos sem que o Governo arrede um passo na sua política centralizadora. Uma política que despovoa ilhas, rouba o país a sua diversidade e nega às ilhas a energia dinamizadora e criativa da parte da sua juventude forçada a deixar a sua ilha e a relocalizar-se na Praia por falta de oportunidades. A crise veio mostrar o quanto é que se falhou em garantir ao país harmonia e equilíbrio. A máquina centralizadora do espaço e o espírito controlador do Governo bloqueou projectos noutras ilhas que podiam ter reequilibrado o país. Quando as oportunidades esfumaram-se o único ponto do território nacional que ficou com alguma dinâmica foi a cidade da Praia. A presença do Estado, com toda a grande fatia de consumo que comanda e arrasta, garante dinâmica em vários sectores. Só que os custos são terríveis mas muito desadequadamente assumidos pelo Governo. A primeira tentação é passar a culpa aos outros. Depois, faz investimentos futuristas como a circular da Praia para contornar os problemas criados. Não funcionam mas mesmo assim insiste em localizar tudo na capital, acelerando ainda mais o seu crescimento. É um círculo vicioso alimentado pela ausência de estratégia de desenvolvimento, mas que responde às necessidades de uma cultura política controleira e centralizadora que cada vez mais vem retirando ao país a vitalidade e a criatividade que advém da diversidade. Diversidade que só é possível com economias funcionais e prósperas em todas as ilhas.
terça-feira, outubro 19, 2010
Going native
A visibilidade dos membros do corpo diplomático em Cabo Verde parece às vezes excessiva. Atinge o limiar do aceitável no caso da intromissão da embaixadora de Portugal na política local, da forma como foi apresentada por um semanário da praça. Segundo o jornal, a embaixadora entende que o seu país e governo estão a ser vítimas de uma campanha despropositada e insidiosa. Por quem? Segundo ainda o mesmo jornal, por sectores políticos e empresariais próximos da oposição. O confronto aí esboçado é no mínimo insólito. A oposição nas democracias não culpa países estrangeiros pelos acordos assinados pelo governo. Podem criticar o timing das decisões, questionar estratégias negociais e discordar dos termos do acordo. As autoridades estrangeiras não reagem à crítica porque sabem que negoceiam com o governo legítimo da república. A chamada à responsabilidade feita pela oposição é uma questão interna. Não há crise aí. Por isso é estranho que representantes diplomáticos deixem-se envolver, desafiando “quem quer que seja a desmenti-la”. Os excessos de visibilidade e protagonismo a raiar o exagero eram acidentes à espera de acontecer, como está-se a verificar neste caso. E as razões são claras. A importância que a rádio e, particularmente, a televisão dão à entrega de doações e aos actos de colagem do Governo à cooperação internacional acabam por imprimir forte protagonismo aos embaixadores. A dependência da ajuda externa faz da interacção estreita com os sectores diplomáticos de países doadores um aspecto central da governação. A proximidade não tem só aspectos positivos de facilitar relações. Pode e dá azo a vícios diversos. Aliás a regra na generalidade das chancelarias é que o diplomata só se mantém no posto por dois ou três anos. Isso para se evitar que o diplomata se torne nativo, ou seja, se confunda de tal forma com os locais que deixe de ser um observador e analista com algum distanciamento das políticas nacionais. Esse perigo revela-se maior em Cabo Verde talvez porque o meio é pequeno e acolhedor. Diplomatas mais facilmente ficam enredadas na malha de relações pessoais e sociais e susceptíveis a lobbies político-partidários. A insistência do governo em se reclamar como único credível para dirigir o país tem consequências perversas: por um lado esforça-se por demonstrar que é o preferido doutros países e dos organismos internacionais. Daí a forte colagem aos seus representantes. Por outro, não se inibe de desacreditar os adversários políticos e de fazer crer à população de que a cooperação internacional não os vê com bom olhos. Em todo este processo lisonjeia, dá protagonismo e cria oportunidades de grande visibilidade aos representantes diplomáticos. Um dia havia que surgir alguém que, em plena campanha pré-eleitoral, tomasse partido no confronto entre a oposição e o Governo sobre questões centrais da vida nacional: a dívida pública, o défice orçamental, a política empresarial, as prioridades na infra-estruturação do país, etc. E aconteceu.
sexta-feira, outubro 15, 2010
Gaffes de fim de percurso
Quem simula não muda
Comités contra Ministro
quinta-feira, outubro 14, 2010
Transparência não rima com propaganda
terça-feira, outubro 12, 2010
Tácticas obscuras
sábado, outubro 09, 2010
Estória, estória
sexta-feira, outubro 08, 2010
Banco para créditos subprime?
quinta-feira, outubro 07, 2010
FMI:World Economic Outlook. Projecção para Cabo Verde
quarta-feira, outubro 06, 2010
Não há pudor?
terça-feira, outubro 05, 2010
Falhar na escola, penhorar o futuro
Quanto à qualidade de ensino, Cabo Verde, no relatório de competitividade do Fórum económico Mundial Cabo Verde, aparece atrás de 10 países da África subsaariana: Quénia, Gâmbia, Benin, Zimbabwe, Botswana, Malawi, Maurícias, Zâmbia, Ruanda, e Nigéria. Na matemática e nas ciências o atraso de Cabo Verde é mais evidente. Tem á sua frente o Benin, Quénia, Ruanda, Maurícias, Senegal, Zimbabwe, Zâmbia, Botswana, Costa de Marfim, Camarões, Madagáscar, Gâmbia, Burkina Faso, Suazilândia e Etiópia. É evidente que o país não está a fazer o suficiente em matéria de qualificação dos seus recursos humanos. Esta constatação, que é de todos, parece não ter sido absorvida pelo Governo. Como é seu hábito, quando se torna impossível esconder uma falha da governação, reage em dois registos: insiste em contrariar os factos com declarações extravagantes como “as nossas universidades, mesmo com menos de cinco anos de existência, comparam-se em qualidade com as universidades lá fora”. Num outro registo coloca-se na posição de defender a classe profissional envolvida na actividade. Como se a exigência de qualidade pelos utentes do serviço público significasse pôr em causa a dignidade dos funcionários que o devem prestar. É o clássico reflexo de quem procura se desresponsabilizar das suas acções, não aceita críticas e faz política explorando sentimentos de vitimização e de exclusão. Em S.Vicente, no discurso do início do ano lectivo, o Primeiro Ministro reafirmou confiança na qualidade de ensino em cabo verde, quando todos vêem por que caminhos ela anda, e defendeu a qualidade dos professores como se alguém os estivesse a atacar ou a culpar pela má qualidade de ensino no país. No discurso, para se justificar, o PM falou em tudo, kits escolares, cantinas, alfabetização, objectivos de milénio, reforma de currículo a realizar-se no fim do último ano do seu mandato. Peneira para tentar esconder o Sol da realidade de que se falhou em qualificar os jovens para responder às necessidades do mercado. De que não se conseguiu fazer do capital humano do país um factor de atracção do investimento privado nacional e estrangeiro. E de que não se soube criar bases de conhecimento potenciadores da produtividade nacional e da inovação. O grande nível de desemprego dos jovens com 12º ano é prova disso como também o é o crescente desemprego entre jovens com licenciaturas. Cabo Verde não tem recursos naturais. Mesmo se os tivesse todos sabem os limites do crescimento baseado na venda de minérios e petróleo. Mais de qualquer outro país, o desenvolvimento dos seus recursos humanos tem que ser visto como crucial. Os dados de comparação com outros países demonstram que é inquestionável que Governo fracassou em propiciar ao País os instrumentos fundamentais da sua prosperidade presente e futura. Isso é indisculpável. Não é responsabilidade repassável para os outros nem objecto de artes ilusionistas que só escondem os problemas e adiam soluções.
sábado, outubro 02, 2010
Provocações
Várias foram as provocações feitas no colóquio do PAICV pelo Dr José Maria Neves: “Cabo Verde teve um percurso constitucional notável desde 1975”. “MpD expulsou a oposição do processo de revisão constitucional”. “Há uma nova Constituição em 2010”. Com a primeira afirmação, o Primeiro Ministro varre ganhos de civilização condensados no art. 16º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (DDHC) de há 300 anos: “A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição”. E para quê? Para justificar um regime do passado que se situou nos antípodas da democracia e do Estado de Direito. O artigo 16º da DDHC deixa claro que a a LOPE, a Constituição de 1980 e mesmo a constituição revista de 1990 não preenchiam os requisitos básicos de uma Constituição. Mas o PM não ficou por aí. Relembrou ainda a “generosidade” do partido único que impôs a ditadura, como “forma a congregar todas as vontades e as competências nacionais, visando a salvação nacional de Cabo Verde enquanto Nação”. Na segunda afirmação, acusa o o MpD de não ter transformado o parlamento eleito numa assembleia constituinte. Quer que se esqueça que o PAICV, durantre o processo de transição, rejeitou sempre a ideia de eleição de uma Assembleia Constituinte. O PAICV justificou-se, então, com a revisão da Constituição que unilateralmente fez a 29 de Setembro de 1990. Disse que era o suficiente. Os caboverdianos, porém, não concordaram e no dia 13 de Janeiro deram ao MpD dois terços dos votos para completar a mudança do regime com uma nova Constituição. Agarrado à ideia de legitimar o seu passado, o Paicv não podia concordar com uma nova Constituição. Queria continuidade e não ruptura. Por isso, não precisava que ninguém o expulsasse do processo. Ele próprio se excluiria, assim como fez, abandonando a sessão plenária da Assembleia Nacional. Na terceira afirmação vê-se como o PAICV não acredita no constitucionalismo e arranja formas de sempre o pôr em causa. Houve uma revisão da Constituição mas quer falar de uma nova constituição. Provavelmente até advoga uma nova república. Para que, parodiando a célebre frase de Lavoisier, se veja que "nada se consolida, nada é certo e nada se institucionaliza. Tudo se transforma em matéria de arremesso político-partidário". Portugal já vai na sétima revisão constitucional desde 1976. Será que se devia falar na décima república portuguesa? O ridículo que com essas tiradas se atrai para o processo democrático é deliberado. Assim como é deliberado o acto de impedir o Estado de se juntar à comunidade nacional na celebração das datas que, invocando liberdade e pluralismo, renovam a unidade de todos num objectivo comum. Garante-se com isso que os caboverdianos ficarão divididos e à mercê dos que já demonstraram saber como jogar na divisão para manter o Poder.