segunda-feira, agosto 30, 2010
Excesso nas razões. Cortina de fumo?
O Primeiro-Ministro, José Maria Neves foi a Angola por 24 horas. A justificar essa visita relâmpago, a comunicação social foi inundada de razões: situação politico-militar na Guiné Bissau, alargamento da cooperação, identificação de novas parcerias empresariais nos domínios financeiro, da hotelaria e do turismo. À chegada a Luanda, o PM acrescentou ainda à Lusa que o sector dos combustíveis será um dos outros assuntos a tratar com o presidente angolano, assim como ouvir e acompanhar a dinâmica de desenvolvimento de Angola e as suas perspectivas de liderança da CPLP e na região africana vizinha. Entretanto, sabe-se pelo portal governo.cv que o único acto oficial será o encontro com Eduardo dos Santos, seguido de almoço de Estado. A visita do Primeiro-Ministro ainda inclui um encontro com a comunidade caboverdiana. O PM está acompanhado de dois membros de Governo, mas não os que, à partida se esperaria, considerando a natureza da vasta agenda anunciada. Por outro lado, não houve qualquer informação da presença de empresários na comitiva numa visita que, ostensivamente, se chamou de reforço das parcerias empresarias. Perante o que mais parece ser uma cortina de fumo, é de perguntar qual é realmente a missão do Sr. Primeiro-Ministro? Vê-se que as eleições são uma prioridade pela preocupação, mesmo numa viagem de 24 horas, de se encontrar com a comunidade emigrada. E naturalmente que tal preocupação irá afectar outros pontos da agenda, até porque o PAICV e MPLA apresentam-se como partidos irmãos. Espera-se que o Secretário de Estado Adjunto do PM não seja convidado, como foi em S.Vicente, a fazer a apresentação da plataforma de doações electrónicas “eucontribuo”.
Viagens de Ministros e o Recenseamento
O Ministro da Administração Interna vai a Guiné-Bissau e ao Senegal. Tratar do Recenseamento, diz a nota noticiosa no portal do Governo. O Ministro já tinha ido aos Estados Unidos no início do ano e, posteriormente, a vários países da Europa. O objectivo dessas viagens dispendiosas é, segundo a nota referida, atrás, “promover a campanha de informação e sensibilização” e encontrar-se “com a comunidade cabo-verdiana residente nesses países, os representantes dos partidos políticos e as Comissões de Recenseamento Eleitoral”. Considerando o actual atraso do recenseamento - ainda está por arrancar completamente, é de supor que as primeiras viagens ou foram inúteis, ou foram prematuras. Por outro lado, é de notar que os membros do governo nada têm a ver directamente com o processo. As comissões de recenseamento, segundo o art. 44º do Código Eleitoral “só devem obediência à lei e às instruções de carácter genérico, emitidas pela Comissão Nacional de Eleições”. Nessas comissões o princípio da igualdade é afirmada com a presença de um delegado de cada partido. A lei, especificamente em vários artigos (50º e 51º), atribui um papel aos partidos políticos na mobilização dos cidadãos para o recenseamento. O mesmo já não acontece em relação ao Governo. E compreende-se que assim seja. Para evitar que, com os recursos do Estado á disposição dos membros do Governo, a “balança” penda para um lado. O recenseamento é uma operação vital para a cidadania e para legitimação do Poder e por isso exige-se especial isenção e imparcialidade das autoridades públicas. Insistir nas viagens dos membros do governo nestas circunstâncias pode ser vista como provocação, campanha e tentativa de condicionamento das pessoas. E, naturalmente, induzem respostas que aumentam a crispação política, alimentam trocas de acusações e partidarizam o recenseamento. Como bastas vezes já se constatou. O resultado vê-se nos cidadãos que não se inscrevem por causa das dificuldades, artificialmente criadas no fogo cruzado, e nos que decidem não votar porque ficam desgostosos com o ambiente que se instala antes, durante e depois do processo, particularmente nas comunidades emigradas.
quinta-feira, agosto 26, 2010
"Ossos" para a ELECTRA?
O governou já concretizou a entrega da produção e distribuição de energia e água da Boavista a uma empresa privada até 2035. As razões para isso não são claras. O acordo com a empresa Águas e Energia da Boavista SA é de 2008, quando estava em vias de entrar em funcionamento o hotel Riu Karamboa, um grande consumidor de energia e um pagador certo Dá-se mais um passo no acordo, no momento em que já se iniciou a construção de um hotel com mais de 2000 camas na zona de Santa Mónica, que também vai ser um grande cliente de energia e água. A questão que deixa a todos intrigados é porque é o Governo impede a Electra de aproveitar o mercado de electricidade e água da Boavista, em franca expansão, a favor de uma outra empresa. Qual a lógica do governo em sobrecarregar a Electra com a electrificação rural, politicamente motivada e que pouco consumo e retorno gera, e não permite à empresa aproveitar-se de um “bife de lombo” quando tal se proporciona? Como é que a Electra poderá manter uma tarifa nacional de energia e água se é retirada dos mercados de forte expansão do consumo, ao mesmo tempo que é obrigada a suportar as zonas de baixo consumo?
quarta-feira, agosto 25, 2010
Por onde anda o Árbitro do sistema?
O Sr. Presidente da República parece que não teve nenhum problema em promulgar as leis de comunicação social que reforçam a auto-censura em Cabo Verde. Aliás, quase nunca põe reticências às leis do Governo e às aprovadas pela maioria parlamentar, não obstante dúvidas óbvias quanto à conformidade constitucional de algumas delas. Vários acórdãos do Tribunal Constitucional mostram precisamente isso. Nesta legislatura, salvo erro, só em duas situações pediu o parecer do tribunal constitucional. Nos primeiros cinco anos nunca usou desse Poder. Promulgação das leis pelo Presidente da república não é um simples assinar por baixo, um cerimonial. Dizem os constitucionalistas que o PR, eleito por sufrágio directo, tem um poder autónomo de controlo que deve ser utilizado para a defesa da Constituição e para a conformação política no sentido de equilíbrio do sistema político. Não se descortinou o exercício desse poder de controlo do PR na Lei da Descentralização Administrativa, publicada no mesmo BO de 16 de Agosto. O Governo, em pleno frenesim eleitoral, achou que, assim como criou 17 cidades em Cabo Verde de uma única assentada, podia servir-se de uma lei de descentralização administrativa para estabelecer novas categorias de autarquias, as regiões administrativas e as freguesias, e definir o seu regime de criação. Resultado: a lei que define o regime de criação de autarquias foi aprovada por maioria absoluta. A lei de execução a ela subordinada de criação das autarquias locais exige maioria qualificada (art. 176 alinea j), conjugado com o nº 4 do art. 160). Um contra-senso mas que satisfaz o ego exacerbado do partido no Poder. A promulgação da lei pelo Presidente da Republica deixa entender que não tem nada a opor.
terça-feira, agosto 24, 2010
Auto-Censura Reforçada
Auto-censura reforçada
O pacote de leis da comunicação social já entrou em vigor (B.O. do dia 16 de Agosto). Inclui a lei da imprensa escrita, as leis da rádio e da televisão e o estatuto dos jornalistas. Muita reveladora das intenções do Governo foi a forma como fez aprovar no parlamento essas leis e a urgência como conduziu o processo. Na revisão da Constituição de Fevereiro último, o Parlamento votou por unanimidade a criação de uma Autoridade Independente para a Comunicação Social, livre da interferência do Governo e com a missão de garantir a liberdade de imprensa e o controlo do serviço público da rádio e televisão. O normal seria que se aprovasse o seu estatuto como órgão regulador e só depois proceder à revisão das leis de comunicação social. O Governo, jogando na antecipação, forçou a aprovação do pacote (Março e Abril), antes da entrada em vigor do novo texto constitucional, em Maio. Quis deixar claro que nada tinha mudado. E que continuava o ambiente de auto-censura, repetidamente denunciado pela Freedom House e os Repórteres Sem Fronteira. O silêncio quase total dos jornalistas durante o processo mostra como essas tácticas são bem sucedidas. A jornalista Margarida Fontes foi dos poucos a reagir. No seu blog odiaquepassa.blogspot.com escreveu: “A 3 de Maio celebrou-se o dia da Liberdade de Imprensa: daquilo que pude ler e ouvir, deu para perceber que não se fez, em momento algum, a ligação necessária entre o pacote legislativo da comunicação social aprovado no parlamento e a Liberdade de Imprensa nas Ilhas. Não se disse que a liberdade de imprensa em Cabo Verde sofreu, recentemente, em toda a linha, um atentado legal: agora temos uma imprensa parceira do desenvolvimento. É obra! (11/5/2010)”
domingo, agosto 22, 2010
Quem está a ser “negativo”?
Partidos têm convicções politico-filosóficas distintas, muitas vezes irreconciliáveis. Por isso, têm pontos de vista diferentes sobre a situação do país. E as soluções que apresentam raramente convergem. O País e a democracia ganham com esse esgrimir de ideias, com a multiplicidade de propostas e com insatisfação permanente com o que está a ser feito. São as vantagens do pluralismo. Ninguém espera dos dirigentes de um partido que ponha o selo de válido nas propostas de outros partidos. Muito menos se espera que o partido no Poder diga: “sim senhor! A oposição á realmente uma alternativa à minha governação”. Por isso é normal que, no jornal Asemana de 20 de Agosto, o deputado Mário Matos, enquanto dirigente do PAICV, diga: As propostas da oposição são “uma estratégia de cosmética, pelo refogado de soluções em curso ou anunciadas, com outras designações ou pequenas nuances aqui e acolá que não alteram em nada o essencial”. Não é, porém, normal que, parágrafos à frente, procure colocar-se na posição de um “observador”, pretensamente isento, a lamentar que falta à democracia caboverdiana e ao País alternativas de governação. Cai precisamente no que está a acusar os outros de ser, no negativismo, visto como atitude de não aprovação e aceitação do adversário, do diferente, do não assimilável. Nega a existência de qualquer alternativa ao PAICV. E a justificação não é, certamente, por não existir outras ideias, outros interesses e outros partidos na sociedade caboverdiana. É por não os reconhecer como válidos, em absoluto. Em vez de os encarar simplesmente como contrários aos que perfilha, e contendo, pelo menos, o valor da diferença, proclama que não estão à altura de serem considerados. Seguindo esse caminho, fica-se a um passo de questionar a própria existência da oposição e a necessidade da diferença e do pluralismo. De facto, o chamado negativismo não vem de quem constata que o Governo não cumpriu promessas feitas. E critica políticas, exaspera-se com falta de acção para aproveitar oportunidades e denuncia bloqueios a uma maior dinâmica do país. Nem vem de quem alerta para os perigos potenciais do défice orçamental e da dívida pública no curto e médio prazo. Negativismo são as tentativas de criminalização da Oposição, é afirmar que o País não precisa de alternativa porque já é uma nação vencedora e é acusar de antipatriota e de estar a mover “guerra de usura e desgaste” a todo aquele que chame o Governo à responsabilidade pelas promessas não cumpridas.
sábado, agosto 21, 2010
Debate furado. Contas não prestadas
O Debate sobre o Estado da Nação, o último antes das eleições legislativas de 2011, aconteceu no dia 31 de Julho. Seguido com grande interesse e curiosidade, ficou-se à espera que o Governo desse conta das promessas feitas e de como as suas políticas ao longo do mandato contribuem para a prosperidade actual e futura.
O Governo, em antecipação do debate, submeteu o País, semanas a fio, a uma ofensiva propagandística. Na televisão pública, além dos costumeiros grandes espaços dedicados às actividades do Governo, fez uso intensivo de publi-reportagens no horário nobre. Na ofensiva saíram prejudicados o pluralismo e o direito dos caboverdianos em ter informação equilibrada, com expressão e confrontos das diversas correntes de opinião.
No debate sobre o Estado da Nação ficou claro que o Governo prefere falar sozinho. No Parlamento, onde tem o dever de se explicar perante a Nação, sob questionamento dos outros partidos, bateu com o pé e escusou-se. Preferiu lançar um ataque, completamente a despropósito, contra os anos de governo do MpD. Com alusões directas e violentas contra o líder do MpD, o Dr Carlos Veiga, quis forçar a Oposição a entrar no seu jogo.
Não foi muito bem sucedido. Mas prejudicou o debate, a Nação não ficou elucidada e a instituição do Parlamento foi diminuída no processo.
O Governo não assumiu responsabilidades por falta de cumprimento de promessas feitas: crescimento a mais 10% ao ano e desemprego a menos de 9%. Pôs ênfase na sua capacidade de captar ajuda e, ultimamente, de endividar-se no estrangeiro. Não mostrou reconhecer a importância crucial que o aumento do rendimento das famílias, sustentado pela dinâmica económica do país, tem para a luta contra pobreza, a melhoria da qualidade de vida das pessoas e a preservação da coesão social.
O Governo, em nenhum momento, demonstrou que, na esteira das opções feitas de investimento público, está-se a verificar investimento privado. Observadores, a começar pelo FMI, ainda estão à espreita de sinais de “crowding in” de capitais privados para justificar cenários optimistas da evolução da economia.
Noutros países, devido ao que aconteceu antes e depois da crise, governos arrepiam caminho e exploram outras vias. Em Cabo Verde insiste-se no “mais do mesmo”. O Primeiro-Ministro prometeu 13º mês aos funcionários públicos sem dizer como o Estado vai suportar mais essa despesa permanente.
Governo contra-ataca com funcionários
Directores-Gerais da Administração Pública vêm rotineiramente assumindo posições políticas de defesa do Governo. Dias atrás foi o Director Geral de Energia a responder à conferência de imprensa do MpD sobre a actual política energética que tem resultado em sistemáticos apagões e deficiente fornecimento de água em várias ilhas. Ontem, sexta feira, foi a vez do Director-Geral da Descentralização a lançar-se na crítica às declarações do Presidente da Câmara e da Assembleia Municipal de Santa Catarina sobre as relações entre o Governo e as autarquias. Os altos funcionários do Estado têm obrigação de saber que estão sujeitos a especiais deveres de isenção e imparcialidade enquanto agentes públicos. E que não é da competência dos funcionários dar respostas políticas a questionamentos, críticas e propostas alternativas de titulares de órgãos de poder político e dos partidos. Muito menos entrar em jogos politiqueiros de comparar década de noventa com os tempos actuais, como faz o Director-Geral da Descentralização. A Constituição consagra princípio éticos muito claros no relacionamento entre, por um lado, o Governo e a Administração Pública e, por outro lado, entre a Administração Pública e os utentes, sejam eles indivíduos ou entidades colectivas. O Governo dirige a Administração Pública, de acordo com o seu programa sufragado nas urnas. Mas, a Administração Pública serve o interesse público e os seus agentes são obrigados a agir, a todo o momento, com sentido de justiça, com isenção e imparcialidade e sem discriminação de qualquer tipo. A partidarização crescente da Função Pública, visível a olhos de todos, é o exemplo claro de como o Governo se tem desviado da ética do serviço público, na sua ânsia de se manter no Poder. Agora, até usa funcionários do Estado para fazer o contra-ataque às críticas da Oposição.
sexta-feira, agosto 20, 2010
A reaparição do Ministro das Pescas
Quando não se cumpre a Lei
"Expresso das ilhas" foi notícia
Ano internacional da Juventude
quinta-feira, 12 de Agosto
quarta-feira, agosto 11, 2010
AGOA. Fazer o quê?
terça-feira, agosto 10, 2010
Política Industrial
segunda-feira, agosto 09, 2010
Tutela de mérito
domingo, agosto 08, 2010
Pontas de lança do Governo?
sábado, agosto 07, 2010
Unidades Móveis
quinta-feira, agosto 05, 2010
Problema de água chegou ao Sal e S. Vicente
quarta-feira, agosto 04, 2010
Nomeação do Secretário Geral do Governo
terça-feira, agosto 03, 2010
Década Perdida
Milhões e milhões de contos de poupanças dos caboverdianos, de donativos de outros países e de empréstimos feitos no estrangeiro foram gastos nos últimos dez anos. Para o governo do PAICV os resultados vêem-se nas obras inauguradas, nas estatísticas favoráveis, quando comparadas com certos países africanos, e nas declarações simpáticas de países estrangeiros.
Mas os caboverdianos sabem que nem tudo o que brilha é ouro. Que nem todos os gastos trazem benefícios que os justificam. E muito menos preparam o futuro. Sabem que, para além de todas as aparências, vive-se em Cabo Verde com crescimento económico anémico, com desemprego generalizado, com ilhas estagnadas e desesperançadas, com bolsas persistentes de pobreza e com crescente desigualdade.
As pessoas também sabem que no futuro próximo vão confrontar-se com níveis de dívida pública e défices orçamentais perigosamente altos. E será em ambiente de crise internacional e a partir de uma economia pouco diversificada e pouco virada para exportação de bens e serviços.
O documento Análise de Constrangimentos dá conta da armadilha em que este governo meteu o País. Deixa claro que a propagandeada agenda de transformação está encalhada em constrangimentos designadamente no domínio do financiamento, da educação e formação e dos transportes e comunicações que já deviam ter sido corrigidos e ultrapassados.
Por essa, e outras razões, a década de governação do PAICV é, a todos os títulos, uma década perdida.
É uma década perdida quanto à atracção do investimento externo. Nos primeiros anos o Governo perdeu-se a desmantelar o PROMEX e a enviar sinais complicados aos investidores. Está a terminar o mandato sem uma estratégia de promoção do país em tempos de crise. A meio da década ficou eufórico com as possibilidades de entrada de capitais. Em 2007, chegou a anunciar investimentos de 4 mil milhões de euro em S.Vicente, a um ritmo de 600 milhões por ano. Mas logo depois queimou a galinha dos ovos de ouro. Não cuidou da Segurança e não tomou as medidas urgentes que se impunham. E minou a confiança de todos com insegurança jurídica no registo dos terrenos. A crise começou na ilha do Sal e alastrou-se pelas outras ilhas.
É uma década perdida no domínio da educação e da formação profissional. Não obstante os liceus construídos, os milhares de alunos nas escolas, as universidades criadas e o esforço na formação profissional. O excessivo desemprego entre os jovens é prova cabal disso. A falta de qualidade no ensino da matemática e das ciências e a não aposta em competências linguísticas estratégicas não faz do capital humano em Cabo Verde um factor de atracção de capitais. O desajuste entre a formação profissional e as necessidades do mercado não favorece a produtividade das empresas e prejudica a inovação em produtos e processos.
A década de governação do PAICV é uma década perdida no domínio dos transportes e das comunicações. Apesar das infraestruturas feitas o mercado nacional está ainda por ser unificado, com prejuízo, em particular, para as ilhas agrícolas. Ilhas como, a Brava, S Nicolau e Maio, estagnaram com o isolamento. E os TACV continuam a fazer os emigrantes, os nacionais e os ocasionais turistas e visitantes pagar as suas ineficiências, com custos para economia nacional e acréscimos na dívida pública. Apesar dos avanços nas comunicações electrónicas, Cabo Verde não soube desenvolver empresas exportadoras de serviços baseados nas TIC capazes de empregar milhares de jovens. Faltou visão. Seis anos depois do MpD ter proposto neste plenário da A N uma estratégia para a banda larga, o Governo, finalmente, ontem, criou uma comissão para isso.
É uma década perdida no domínio de energia. Cortes sucessivos de energia causaram transtornos às pessoas e prejuízos avultados à economia nacional em perdas de produtividade e em custos acrescidos na aquisição de geradores. A culpa disso tudo está na forma irresponsável e politiqueira com que o Governo tratou a questão da Electra. O país perdeu o parceiro estratégico e vem tropeçando no sector com medidas avulsas sem um plano definido. Hoje injecta dinheiro do INPS para resolver problemas de tesouraria, amanhã contrai empréstimos vultuosos com clausulas complicadas e depois de amanhã vê-se membros do Governo a distribuir lâmpadas em nome da eficiência energética. A questão séria da factura energética, da dependência de combustíveis fosseis e das ineficiências na produção e distribuição de energia ficam por ser abordadas de forma compreensiva.
É ainda uma década perdida no domínio da agricultura. Apesar da construção de barragens ainda não se encontrou uma via para debelar a pobreza no mundo rural. A agricultura não foi direccionada para produtos de grande valor acrescentado e o mercado agrícola não se expandiu por falta de transportes inter-ilhas fiáveis. O Governo deixou que o grogue continuasse a ser adulterado, arruinando os proprietários de cana, prejudicando exportações e devastando a saúde de muitos jovens.
Nas Pescas viu-se com o caso da Frescomar como a década foi perdida. Mesmo com a possibilidade de vender dezenas de toneladas de peixe por dia à fabrica não passou pela cabeça dos governantes investir agressivamente na frota para aumentar a captura nacional e aproveitar os acordos de pesca com países da costa africana.
Na Saúde, nesta década perdida, não se fez o suficiente para evitar que o país perdesse a vantagem comparativa de ser um destino turístico sem doenças endémicas. Permitiu-se que o paludismo, paulatinamente, assentasse arraiais em algumas ilhas e que Cabo Verde virasse notícia internacional com a epidemia da dengue. Por outro lado, não se imprimiu um impulso estratégico ao sector que capacitasse o país para responder às doenças de uma população com maior esperança de vida e, ao mesmo tempo, se posicionasse para responder as demandas do turismo residencial, virado para população envelhecida da Europa.
Na Justiça, o agendamento da discussão dos Estatutos dos Magistrados, para Outubro de 2010, mostra como a década foi perdida. A insistência do PAICV em manter juízes de nomeação política no Supremo Tribunal de Justiça, à revelia da Constituição da República, efectivamente bloqueou a instalação do Tribunal Constitucional e impediu que se desse passos seguros para uma verdadeira independência do poder judicial.
Um olhar pela comunicação social de Cabo Verde deixa claro que aí também foi uma década perdida. A autocensura reina. Ao longo dos anos o Governo moveu-se para cercear manifestações de pluralismo. Preparava o palco para a enxurrada de propaganda que está sufocar o país, com os recursos do Estado, na campanha eleitoral que há muito iniciou. Vê-se isso todos os dias na televisão pública.
Há dias Hillary Clinton avisava em Cracóvia, na Polónia contra a tentação de certos líderes das novas democracias de pôr a sociedade civil numa espécie de torno de aço, sufocando o espírito humano e esvaziando o pluralismo. E sem sociedade civil, disse ela, não há democracia.
Na ocasião, Hillary Clinton denunciou a tentativa de certos governos em fazer as pessoas subservientes ao Estado em vez de ser o Estado a servir o povo. Precisamente o que vem acontecendo nesta década. O Governo esforçou-se por convencer os caboverdianos que se pode viver da ajuda internacional com dignidade, sem preocupação real com a criação de uma estrutura produtiva própria. E que, por isso, os governos devem ser avaliados pelo que conseguem captar da generosidade dos outros. Mesmo que, ficando por esse modelo de gestão de fluxos externos, uns acabem por ficar com mais, aumentando as desigualdades sociais e condenando o país a um desemprego permanente de mais de 20%.
Resumindo, nesta década de governação o PAICV faltou no seu dever ao povo de Cabo Verde. Esforçou-se por diminuir a Liberdade, fustigou de todos os lados o Estado de Direito e não contribuiu para a prosperidade desejada. Falhou completamente nas metas de crescimento e emprego que se impôs e desperdiçou oportunidades que podiam ter permitido aos caboverdianos, em todas as ilhas, perspectivar hoje o futuro com uma outra certeza.