Ulisses Correia e Silva está pronto para
ser primeiro-ministro, mas parece que não está virado para ser deputado, no
caso do MpD perder as eleições. Na reunião da direcção nacional do MpD, sábado
passado, deixou a promessa da sua renúncia ao cargo de deputado se não obtiver
vitória nas eleições de 20 de Março. O problema é que o eleitorado não elege
primeiros-ministros, mas sim deputados para a Assembleia Nacional. Quem tiver
maioria, pode constituir governo e não é obrigatório que o primeiro-ministro
nomeado pelo Presidente da República seja deputado. Supõe-se que quem se
candidata para o cargo de deputado é para servir como tal, ou como parte da
maioria governativa ou na oposição. Mostrar desdém pelo cargo de deputado é um
fenómeno em crescendo em Cabo Verde. Passa a ideia do quanto tem sido bem-sucedido
o ataque feito ao parlamento nestes últimos anos, com o disseminar da mensagem
do governo que “dá e faz” e do parlamento que só “fala e critica”. Nos próprios
políticos nota-se uma ambiguidade. Os que têm posições executivas sentem-se
superiores e alguns até dão-se ao luxo de se juntar aos críticos que não
escondem os seus sentimentos anti-partido e anti-pluralismo. Outros, acabam por
alimentar esses mesmo sentimentos, diferenciando-se ostensivamente de
colegas que supostamente não teriam outro meio de vida, não saberiam fazer
outra coisa ou simplesmente se acomodam à caricatura do deputado “que
só bebe água e levanta o braço para votar”. A questão que se põe é se
depois do exercício anti-parlamento e do desdenhar do papel dos deputados irá
manter-se a possibilidade de convencer as pessoas, e em particular os jovens,
da importância central de se recensearem para votar e eleger uma assembleia
nacional de onde saíra um novo governo para os próximos cinco anos.
Para muitos agitar a bandeira da regionalização tem sido uma forma de evitar criticar as políticas do governo do PAICV. Atira-se a culpa indistintamente para os “políticos” e o resultado é que não se penaliza suficientemente o partido do governo nas legislativas. Põe-se ênfase na parte redistributiva do bolo nacional, em que supostamente uns ficam com mais do que outros, quando na realidade o problema está com a gestão asfixiante da economia nacional, que não favorece a iniciativa individual, não melhora a competitividade e o ambiente de negócios e não explora devidamente as oportunidades de aumentar a procura externa de bens e serviços cabo-verdianos. Causa alguma perplexidade que precisamente em S. Vicente se tenha feito da regionalização a panaceia para todos os males. Toda a gente sabe que só há prosperidade na ilha quando o dinheiro circula, porque há mais consumo de emigrantes, turistas e visitantes, mais gente empregada por causa de investimento externo, mais movimento no porto e mais empresas a florescerem, porque directa ou indirectamente estão a fazer negócios com o mundo. O centralismo que afecta negativamente as ilhas é alimentado pelo modelo económico de gestão de fluxos da ajuda externa, que o governo do PAICV já levou ao limite, deixando o país a arrastar-se a taxas de crescimento de 1% do PIB. Não se devia confundir causa e efeito e o prioritário deveria ser a mudança de políticas nacionais. Mas, mais forte é a tentação de recorrer à vitimização para fazer política, aproveitando o ambiente de insegurança e de frustrações acumuladas. Seguindo esse caminho, os políticos locais, por algum tempo, até podem ser bem-sucedidos, mas a situação das pessoas não muda, a frustração aumenta e o conformismo crescente, paradoxalmente, acaba por ajudar quem está no poder a manter-se lá.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 737 de 12 de Janeiro de 2015.